Bem-vindos a mais um texto da nossa série “A Revolução Francesa”! Estamos desbravando os eventos que marcaram um dos principais movimentos sociais do Ocidente, que demarca a mudança radical de nossa civilização. Sem sombra de dúvida os dez anos revolucionários na França moldaram, em maior ou menor grau, a civilização ocidental.

Por seu grande impacto na vida de bilhões de pessoas, é fundamental conhecer mais profundamente suas causas, suas fases e como acabou essa convulsão social do final do século XVIII. Para alcançar nosso objetivo, dividimos o tema nessa série de textos e recomendamos fortemente aos leitores que se debrucem sobre cada um deles de forma encadeada, afinal, se assim não o fizer, é provável que fique um tanto quanto perdido na linha do tempo dos fatos.
Dito isso, para aqueles que ainda não conhecem a série, recomendamos a leitura do nosso texto de introdução para entender as ideias que norteiam nossos textos da série, além dos objetivos e da relevância da Revolução Francesa para o mundo. A partir do texto de introdução, é possível acompanhar de forma cronológica os demais textos da série!
É chegada a hora de mergulhar no coração da Revolução Francesa! Eis o momento de maior tensão social, de guerras internas e externas vividas na revolução. Vamos conhecer o período mais famoso e, infelizmente, mais sangrento de toda revolução. Vamos entrar na fase do Terror!
Após a queda da bastilha: A formação de um novo governo
Como vimos no texto anterior, a queda da Bastilha, a prisão do Estado que foi tomada pelos revolucionários, marcou a tomada de poder dos revoltosos perante o governo. Com posse de armas de fogo e pólvora, novas regras e ditames sociais estavam surgindo.
Um dos grandes avanços nesse período foi a elaboração da Declaração de Direito do Homem e do Cidadão, em agosto de 1789. Nela se estabeleceram os princípios que entraram para a História e que se tornaram o grande lema da revolução Francesa: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Esses três princípios, belos em suas definições teóricas, pouco foram vividos de fato durante a revolução. A bem da verdade, a igualdade não existiu de fato, a liberdade foi cerceada com leis rígidas e estados de sítios e, definitivamente, não houve fraternidade entre os diferentes grupos sociais que formavam o corpo do Estado e da nação francesa.

Frente a isso, uma primeira reflexão que podemos fazer é justamente o quanto a teoria se afasta da prática em uma revolução, afinal, como pode existir uma fraternidade que acaba por separar os homens em classes, hierarquias e que os torna inimigos? Aonde está a igualdade quando a guilhotina pesa sua lâmina na cabeça dos seus adversários políticos de forma arbitrária?
Quando paramos para pensar sobre tais questões, percebemos que tais lemas foram pouco compreendidos e, de forma objetiva, distorcidos ao longo da Revolução Francesa, e se tornaram, de fato, apenas palavras escritas em um documento vazio. Ainda assim, é importante ressaltar que a escalada da violência e do radicalismo na revolução não ocorreu espontaneamente, mas sim como resultado de uma série de processos que veremos agora.
Uma vez estabelecida uma nova forma de governar, optou-se inicialmente por uma monarquia constitucional. Esse fato nos revela um ponto interessante sobre a revolução: apesar do péssimo governo de Luís XVI, a intenção inicial dos revolucionários não era destituí-lo totalmente do poder. A figura do monarca ainda era fundamental para um certo controle social, uma vez que no imaginário popular sua figura de autoridade poderia impor respeito, mesmo em um cenário tão adverso quanto o da revolução. Além disso, existia uma parcela relativamente grande de apoiadores da monarquia, o que fez com que inicialmente o governo fosse ainda regido por Luís XVI, mesmo que limitado a obedecer e definir as diretrizes do governo por meio do congresso.
Entretanto, em poucos meses, percebeu-se que esse modelo estava fadado ao fracasso. A monarquia constitucional durou, efetivamente, de 1791 até 1792, quando foi destituída. Além da tensão natural entre monarquistas e revolucionários, o cenário vivido externamente não foi favorável à França. Ao perceberem a revolta das classes populares, outras monarquias europeias decidiram invadir o território francês para defender o trono de Luís XVI. Desse modo, além das tensões internas, também se estabeleceu uma crise diplomática, e a guerra contra outras potências europeias foi inevitável.
Vale lembrar que em junho de 1791 Luís XVI e sua família foram capturados ao tentarem fugir da França. Observando a tensão social, o objetivo do monarca era de buscar refúgio na Áustria e juntar um exército leal para retomar o poder absoluto em seu país. Isto não ocorreu e Luís XVI foi condenado à morte em 1792.

Ainda em 1792, a França mergulhou numa guerra terrível contra o reino da Áustria e a Prússia (atual Alemanha). As tensões aumentavam à medida que a França era vencida em combate, uma vez que a Primeira Coalizão (nome dado à aliança entre Áustria e Prússia contra França) se mostrava eficiente no campo de batalha. Pressionados pelo inimigo e sem uma direção coesa de como seguir, o fim da monarquia se deu em setembro de 1792, dando início a uma nova fase da Revolução Francesa: era o começo da Primeira República.
A Primeira República e o terror de Robespierre
Sabemos que tempos difíceis levam pessoas ao extremo e a tomarem decisões igualmente difíceis. Não estamos aqui para sermos juízes acerca dos fatos, mas precisamos refletir sobre como somos capazes de responder de maneira tão violenta quanto qualquer besta feroz quando somos levados ao extremo.

Os primeiros anos da Primeira República e o terror que Robespierre levou para toda a França é um lembrete de como o poder e sua sede podem nos transformar em tiranos. Mas estamos nos adiantando aos fatos.
Antes disso, precisamos falar sobre o fim de Luís XVI. Após sua captura, o monarca ficou preso no castelo de Tulherias. Sua reclusão, até então protegida pelo Estado, foi abalada quando revolucionários invadiram o castelo, mataram os guardas e exigiram que a família do rei e o próprio Luís XVI fossem transferidos para uma prisão comum, afinal, a igualdade como princípio deveria ser vivida. Essa exigência foi atendida, e a família real viveu seus últimos dias em uma prisão simples até janeiro de 1793, quando foram julgados por traição. A pena para esse crime foi a de morte por decapitação.
A Primeira República inaugurou uma sentença que seria a sua marca pelo resto da História: a morte por guilhotinamento. Esse capítulo sombrio da Revolução Francesa não pode ser esquecido, pois a perseguição feita aos desafetos e rivais políticos mostrou que por trás do caráter revolucionário escondia-se, na verdade, um tirano. Esse era Robespierre, o líder dos jacobinos.

Para entender sua história, é preciso compreender os diversos grupos que compunham os revolucionários e que formaram a grande liderança da Primeira República. De forma geral, dividem-se os revolucionários em dois grandes grupos: os girondinos, favoráveis às mudanças moderadas, e os jacobinos, em geral mais radicais e que propunham mudanças profundas e rápidas. Do ponto de vista social, os girondinos eram, em sua maioria, uma elite econômica formada pela burguesia francesa, enquanto os jacobinos eram formados por camadas mais populares, o que também era um fato de distinção a partir da sua capacidade econômica.
Frente a isso, após a abolição da monarquia e o estabelecimento da república, esses dois grupos passaram a ter embates constantes. Em um cenário adverso como a guerra, uma das primeiras medidas do governo foi criar um comitê de salvação, ou seja, uma cúpula capaz de tomar decisões e ajudar a França a se reerguer. Robespierre, como principal líder dos jacobinos, foi um dos principais nomes do comitê, ganhando assim uma posição privilegiada e detendo muitos poderes.
É justamente nesse cargo de comando que a Revolução Francesa passa a conhecer o Terror de Robespierre. O jacobino passou a eliminar sumariamente seus rivais políticos a partir da justificativa de que eram traidores da revolução. Eliminando os rivais, ninguém poderia se opor ao revolucionário, que, ao longo do tempo, passou a condenar, tanto aliados como inimigos, à guilhotina, não distinguindo aqueles que lhe defendiam ou atacavam.
O poder nos torna cegos. O único objetivo de Robespierre era o de continuar sendo o líder da França, e ele já não mais pensava no bem comum. Seu amor pela revolução foi, na verdade, destruído ao chegar no centro de comando e apaixonar-se pelo poder. Para manter-se no seu posto, milhares de pessoas foram condenadas à morte, e outras milhares perderam suas vidas no campo de batalha.
Em pouco tempo – de 1793 até junho de 1794 –, Robespierre estabeleceu o Terror como forma de controle, tentando estabilizar a França internamente para poder concentrar-se na guerra. Consequentemente, sua postura autoritária o isolou politicamente, e mesmo eliminando seus rivais, outros insurgiram para lhe derrubar. Por fim, após um ano repleto de derramamento de sangue, Robespierre foi traído e retirado do poder. Sua pena foi, ironicamente, a de ser morto na guilhotina, o instrumento que lhe permitiu ficar no poder. Com a morte de Robespierre se inaugurou uma nova fase da revolução: a do Diretório.

Assim encerramos mais um texto da série “Revolução Francesa”! Aguardamos todos na sequência de nossa série!