Já precisou negar algo para alguém e percebeu o quão difícil e constrangedora pode ser essa atitude? Já percebeu como é doloroso receber um “não”? Independentemente se é você quem dá ou quem recebe, a verdade é que, definitivamente, não sabemos dizer “não”.
Seja por falta de uma Educação ou por causa dos valores e crenças que compartilhamos, somos uma Sociedade do “sim”. Uma Sociedade da Liberdade a qualquer custo, ou que busca facilidades. E qualquer opção que não remeta ao ideário de Liberdade sem limites, nos deixa ressentidos, com raiva e muito chateados. A questão é: que preço pagamos em troca disso? Talvez aí esteja a origem de nossa dificuldade para dizer “não”, pois, como vivemos em um pólo onde tudo pode e é permitido, o “não”, ou tudo o que o expresse é uma opção estranha ao nosso ninho. Por isso o uso indiscriminado do “talvez”, do “não sei” e do “quem sabe”, quando realmente queríamos dizer “não”.
Pesquisas e estudos comportamentais realizados já apontam que a origem de nossa dificuldade em “dizer não” está diretamente relacionada com uma vontade íntima de querermos ser sempre agradáveis com tudo e com todos com quem nos relacionamos. Em artigo recente, publicado no site da BBC WorkLife, no final de 2021, encontramos reflexões bem interessantes sobre esse tema. Para a pesquisadora americana Vanessa Bohns, nem sempre dizemos um “sim” para atender alguém ou porque somos Bondosos e Generosos, mas, na verdade, não queremos desagradar. Segundo Bohns, somos seres sociais e tendemos a evitar conflitos em nossas relações. Assim, na maioria das vezes, a nossa resposta diante de um pedido ou solicitação a alguém, tem mais a ver com um sentimento de constrangimento do que com um ato altruísta. Tais percepções abrem um precedente que reforça a ideia de que não gostamos de desagradar aos demais e por isso temos dificuldade em falar “não”, mesmo que queiramos.
É importante lembrar que dizer sempre “sim” não é questão de virtude, mas falta de discernimento. Tal postura pode trazer consigo sérios problemas para si e para os demais, tendo em vista que, quando não sabemos dizer “não”, o mais provável é que passemos a Vida inteira assumindo compromissos além do nosso alcance e a tendência é que, a médio e longo prazo, possamos desenvolver estresse, desgaste, exaustão física, emocional e mental. Tal situação apresenta como pano de fundo a falta de clareza para estabelecer limites e fronteiras.
Para aqueles que acreditam que a Vida é pedagógica e nos ensina o tempo todo, em geral, observamos que os “não” e as adversidades nos fazem crescer e nos possibilitam avançar para a experiência seguinte. Certamente, toda caminhada de sucesso tem sua base fincada em pilares alicerçados por vários “nãos”. Todos nós já ouvimos ou falamos para alguém – “Não, você não é capaz”; “Você não suportará essa situação”; “Você não alcançou o desempenho esperado”; “Você não passou na prova” etc. Em geral, foram essas experiências que mais nos impulsionaram a caminhar, a lutar e a nunca desistir dos nossos Sonhos. Foram as negativas que a Vida nos trouxe, usadas de forma Inteligente, juntamente com as suas dificuldades, que nos ensinaram a vencer a nós mesmos, que nos ensinaram a voar além das circunstâncias e nos fizeram conquistar coisas inimagináveis. Foram os “nãos” que nos formaram e nos fortaleceram para que fôssemos quem somos hoje. Então, por que temos tantas dificuldades em lidar, aceitar, acolher, ou até mesmo, dizer “não” para alguém?
Diz uma máxima que vale mais um único “não” pedagógico do que vários “sim” superficiais. Sofremos, erramos e insistimos em alguns erros porque ignoramos o valor de um “não” para a nossa formação de caráter. Imagina como seria o processo de educação infantil sem um único “não”? Quando entendemos a importância dele, passamos a nos comprometer não só conosco, mas também com o outro, passamos a reconhecer a força e a honra em empregar a nossa palavra no que realmente é necessário e no que temos certeza de que vamos cumprir. Isso significa discernimento, significa encontrar um ponto Justo entre ser Gentil e Cortês com o outro sem renunciar aos nossos princípios. Quando não formamos nosso caráter Humano, facilmente nos diluímos nos caprichos dos esquemas sociais ou nos perdemos em nosso próprio caos interior que clama por ordem.
Nesse contexto, é urgente e vital aprendermos a educar a nossa psique, não para fazer o que se gosta, mas para fazer o que é necessário, pois ainda enfrentaremos vários obstáculos para lidar com limites e possibilidades. Assim, precisamos repensar essa busca desesperada pela ausência de limites, que nos dá uma sensação de que tudo o que pensamos, sentimos ou fazemos deve ser legitimado independente do que isso possa nos custar ou custar ao outro. O lema “É proibido, proibir.” pode até ser poético, mas carrega consigo um veneno mortal enquanto essência. Pois, sem limites internos, descemos aos nossos mais puros instintos e nos animalizamos, impossibilitando qualquer tipo de potencialidade Humana. E também, não conseguimos ter referenciais para delimitar externamente o nosso e o espaço do outro. E, se tem uma regra social válida para vivermos harmonicamente em uma Sociedade, essa regra é a do respeito aos limites do indivíduo e do social. Por isso a Educação é extremamente vital para um indivíduo e para a formação de um Estado, quiçá de uma nação.
Quando nos formamos enquanto Humanos, percebemos que a maturidade é fruto de um despertar interno e não biológico, tendo assim como consequência, o velho e bom hábito do conhecer e dominar a si mesmo. Quem tem a posse de si mesmo vive de acordo com a sua Natureza Humana. Não a Natureza instintiva, mas a verdadeira. E por isso sabe da importância que é ter limites. Sabe também que o Universo tem uma lógica Justa e que todas as adversidades e impossibilidades são apenas oportunidades de impulso para o passo seguinte, a Evolução. Quem sabe um dia possamos reconhecer conscientes que a Vida é um espelho e a sua pedagogia nos ensina que tudo no universo está em Evolução, inclusive o ser Humano.