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O Mito de Jasão: o Valor de enfrentar as provas – Parte I

A Mitologia Grega sempre nos encanta. Basta vermos que seus mitos, de uma maneira ou de outra, estão sempre sendo recontados através do Cinema, da Música e demais formas de Arte. Entretanto, dentro do vasto mundo das histórias mitológicas dos Antigos Gregos, há algumas que são quase desconhecidas por nós. Uma delas é o Mito de Jasão e os argonautas, que, apesar de terem versões modernas no cinema, ainda assim não são tão lembradas em nosso senso comum. 

É provável que Você, meu caro leitor, nunca tenha ouvido este nome antes. Mas não se preocupe, pois hoje conheceremos essa épica história que nos foi deixada por Apolônio de Rhodes, um dos maiores poetas da Grécia, do século III a.C. Antes de iniciarmos nossa jornada, porém, devemos lembrar que os mitos Gregos nos revelam, acima de tudo, ideias e buscam transmitir uma mensagem sobre a própria natureza Humana. Por isso, os heróis, que em geral são filhos de deuses com mortais, representam as várias maneiras de se portar e lidar com os problemas da vida, e cada um, à sua maneira, nos apresenta uma faceta desse misterioso enigma ao qual chamamos de Humanidade.

Essa e outras ideias acerca do poder dos mitos e sua linguagem simbólica podem ser encontradas em nossos Textos sobre Mitologia, no portal Feedobem. Partindo então dessas concepção iniciais, poderemos olhar para a jornada de Jasão e seus argonautas com maior discernimento, procurando compreender seus pensamentos principais e símbolos sobre esse épico que inspirou tantas gerações, ao longo dos últimos dois mil anos.

Dito isso, a jornada do nosso herói começa muito cedo, ainda criança. Jasão era filho de Easão, o primogênito do rei da cidade de Lolco, Creteu. Pela lógica monárquica, Easão estava destinado a chegar ao trono e, um dia, tornar-se rei e, de igual modo, esse deveria ser o destino de Jasão algum dia. Entretanto, após a morte do rei de Lolco, Pélias, irmão de Easão e tio de Jasão, usurpou o trono e tornou-se o rei. 

Easão, percebendo a má intenção do seu irmão, conseguiu afastar Jasão do perigoso jogo de poder que ocorria na cidade e mandou-o para longe, até o Monte Pelião para ser instruído pelo centauro Quíron. Por muitos anos, o nosso herói foi discípulo do sábio centauro, que o ensinou sobre a arte da guerra, da estratégia e de todo conhecimento necessário para sua jornada.

Aqui encontramos um primeiro simbolismo muito importante para refletirmos. Em vários mitos, os heróis passam por um momento de instrução e de aprendizado, antes de se lançarem ao seu verdadeiro desafio. Quíron, neste sentido, representa esse primeiro mestre, o que dá as primeiras lições e as primeiras provas. Ele representa essa Sabedoria que habita fora do herói, que ainda não consegue enxergar dentro de si toda sua capacidade e por isso precisa ser guiado. Quíron então será o primeiro a despertar nesses aprendizes a chama pela busca do seu dever, além disso, é ele que reconhece, desde cedo, a natureza de cada um dos jovens que lhe chegam. Um exemplo claro disso está na relação do centauro com Ajax e Aquiles, os dois heróis da guerra de Troia que também foram treinados por ele. Enquanto em Ajax, Quíron via um grande guerreiro, capaz das maiores façanhas físicas, mas com pouco discernimento, em Aquiles o sábio observava o perfeito equilíbrio entre a capacidade física e mental, tornando-o assim, um melhor guerreiro.

Desse modo, Quíron aceita treinar Jasão, pois enxerga o jovem como um herói de muito potencial. E assim o faz por anos, até que, após completar seu treinamento e chegar à fase adulta, instrui que o príncipe de Lolco retorne até à sua cidade. Jasão obedece o seu mestre e parte de volta até a pólis da Tessália, e, ao chegar na cidade, as pessoas ficam impactadas com a sua imagem. Isso porque Jasão, após anos vivendo em um local remoto, tem poucas vestes, tendo parte do seu corpo coberto por uma pele de pantera e somente um dos pés calçados. Aos olhos dos cidadãos, o príncipe não passaria de um mendigo, mas a postura que Jasão revelava a sua origem nobre. 

O príncipe então foi levado até Pélias para exigir o trono que era seu por direito. Pélias, porém, ao ver seu sobrinho, lembra-se de uma antiga profecia que lhe fora feita, na qual dizia que um homem calçando apenas uma sandália o mataria. Com medo da profecia ser realizada, o tio de Jasão pensa em uma maneira de afastá-lo da cidade. Assim, pensando em seu próprio bem, Pélias faz um terrível acordo com Jasão: o trono lhe seria entregue, se ele fosse capaz de trazer até Lolco o velocino de ouro, uma rara pele dourada de carneiro que estava em uma terra distante, a Cólquida.

Mais uma vez, antes de prosseguirmos, é importante entender o que essa passagem do mito nos mostra. Iniciaremos por entender o que significa o medo de Pélias frente a Jasão. Quando pensamos racionalmente sobre essa passagem, o que nos vem logo à mente? A primeira pergunta, talvez, seja “por que ele não mandou simplesmente matar Jasão?” A resposta, provavelmente, é mais simples do que imaginamos. É porque não era possível vencer Jasão através da força. Lembremos que ele é um herói, um semideus. Neste caso, Pélias o coloca para enfrentar desafios que nenhum ser humano seria capaz de superar, desse modo, o rei de Lolco tenta vencê-lo por outros meios, já que provavelmente seria morto se tentasse simplesmente matá-lo naquele momento.

Entretanto, em um aspecto mais profundo do mito, percebemos que Pélias representa a força que coloca os heróis à prova, ou seja, ele é um agente da natureza para formar Jasão. Pensando nisso, muitas vezes, ao lermos tais mitos pensamos que os personagens que impõem tais desafios são os vilões. No entanto, para além disso, pensemos que eles são igualmente necessários para o desenvolvimento dos heróis, pois tal qual uma espada precisa do fogo para ser forjada, os heróis precisam dos testes para se tornarem quem são.

Outro ponto importante que precisamos compreender é o significado do velocino de ouro. De acordo com a Mitologia Grega, o velo de ouro era o pelo de um carneiro que podia voar, sendo assim Divino. Ele foi utilizado como montaria pelos irmãos Frixo e Hele para fugir da Grécia até à Ásia. Porém, na travessia pelos continentes, Hele caiu no mar e, segundo o mito, assim nasceu o Helesponto, a passagem que divide a Europa da Ásia. Frixo, ao chegar até a Cólquida, recebeu instruções para sacrificar o carneiro e tirar sua pele. A mesma foi oferecida ao rei Eetes e, desde então, foi o mais estimado prêmio de toda a região. Estrangeiros vinham de todo o mundo para obtê-lo, mas nenhum tinha sucesso pela crueldade e proteção que Eetes dava ao seu velocino. Sendo assim, era o dever de Jasão conseguir o que nenhum outro herói foi capaz de conquistar.

Seguindo com a nossa jornada, Jasão aceita o desafio, mas sabe que, para ter o velocino de ouro, precisará de muita ajuda. Isso porque esse mítico objeto, além de estar muito distante, era guardado na corte do rei Eetes, que tinha criado uma série de desafios para evitar a captura do velocino. Diante disso, Jasão ordena a construção de um navio capaz de atravessar os mares até o seu destino e reúne cinquenta dos maiores heróis da Grécia para essa missão.

A tripulação de Argo (o nome do navio e daí o nome argonautas) era composta por nomes famosos em toda a Hélade, como Hércules, Teseu, Orfeu, Castor e Pólux e tantos outros grandes guerreiros. Ainda tinha a presença de estrangeiros como Heitor, o príncipe troiano, e Peleu e Ileu, os pais de Aquiles e Ajax. Nota-se, portanto, que Jasão reuniu os melhores em sua viagem, um sinal de que a busca pelo velocino não seria nada simples. 

Aqui, encontra-se uma importante diferença entre o mito de Jasão, quando comparado com a de os outros heróis. Em geral, o herói parte só em sua jornada e, em grande parte, realiza suas façanhas de modo solitário. É o caso de Hércules e seus doze trabalhos, por exemplo, e Teseu com seu desafio contra o minotauro. Jasão, porém, utiliza das habilidades de cada herói para passar pelas provas que encontra ao longo do caminho. Esse é, de modo geral, um símbolo importante sobre o Discernimento, ou seja, a capacidade de saber diferenciar as situações e optar sempre pela melhor solução. No caso do mito, à medida que as provas vão ocorrendo, Jasão decide qual dos heróis seria o mais capacitado a resolvê-la. Esse é, em última instância, o grande poder de Jasão: ser capaz de discernir e comandar tantos heróis.

E as provas são inúmeras até a Cólquida. O trajeto de Jasão os leva a diversas ilhas, na qual, em cada uma delas, alguns dos seus companheiros vão ficando pelo caminho. É o caso de Hércules e Polifemo, por exemplo, que não voltam a embarcar na Argo, ficando na ilha de Mísia. Uma outra ilha em que os heróis precisam provar sua capacidade é a de Lemnos, no qual se encontram apenas mulheres guerreiras, similares às amazonas. Amaldiçoadas por Afrodite, os maridos dessas mulheres preferiam as escravas do que a elas, motivo pelo qual foram mortos por suas esposas. Após isso, porém, elas não tinham como gerar novos descendentes e a prova dos argonautas para poder seguir em sua jornada era, então, dar novos filhos a essas mulheres e garantir que a população da ilha não morresse. 

Não iremos abordar todas as passagens do épico pois certamente esse se tornaria um texto tão longo quanto a própria jornada de Jasão, então iremos focar apenas em algumas das principais provas. Uma delas se encontra na Trácia, local governado pelo adivinho Fineu. Para revelar aos argonautas como passar pelo caminho das rochas flutuantes, que eram duas grandes pedras no mar que se fechavam quando alguém tentava passar. Naturalmente, os barcos eram esmagados e sua tripulação morta. Fineu pede que os argonautas vençam as harpias, os terríveis monstros alados que atacavam seu reino constantemente. Jasão então escolhe Calais e Zetes, ambos filhos do vento Bóreas, para combater as monstruosidades. Os dois irmãos derrotam os monstros no ar com suas espadas e assim aprendem como passar pelas rochas sem serem esmagadas.

Fineu conta que, entre o movimento de as rochas se abrirem e se fecharem novamente, há um certo tempo. Assim, deveria lançar uma ave em direção às rochas para fazê-las fechar e, à medida que ela retorna a abrir, seria o momento da passagem do navio. É exatamente desse modo que Jasão o faz, posicionando seu Argo em frente às rochas e soltando uma ave na direção delas. Seus companheiros passam a remar com ímpeto para acelerar a embarcação e conseguir passar, e, mesmo com a força de todos os heróis empenhados nessa missão, ao passar pelas rochas, elas se fecham e uma parte do navio é esmagada, causando danos a Argo, mas que não foram fatais. O navio, mesmo avariado, segue seu caminho rumo à Cólquida.

Essa passagem é interessante pois nos mostra uma valiosa lição: aprender sobre a oportunidade. A oportunidade é o momento perfeito em que agimos e conseguimos obter grandes resultados. É preciso, antes de tudo, estar atento para quando ela aparecer, preparado para dar tudo de si até chegar ao nosso objetivo, pois caso não estejamos atentos, ela passará, ou melhor, se fechará diante de nós. No caso de Jasão e sua tripulação, as rochas ainda os atingem, tomando uma pequena parte do navio, o que também é um importante símbolo, pois tudo nos custará um preço. A oportunidade, nas suas mais diferentes formas, também nos cobra algo. Seja uma dedicação a mais no trabalho, ou um movimento em direção a algo, e isso nos custará tempo, energia e o que mais for necessário. Por isso, jamais passamos “inteiros” por elas, pois somos obrigados a fazer todos esses movimentos. O Argo deixa um pedaço de si nas rochas, mas é graças ao esforço dos seus heróis que ele segue sua jornada.

Após passarem pelo caminho das rochas flutuantes, finalmente, os argonautas vislumbram a Cólquida, mas as provas estavam apenas começando. Por isso que, para contar o restante do mito, convidamos a todos para a segunda parte desse texto.

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