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A história se repete?

Uma antiga frase diz que “a história é como um tolo: vive a se repetir”. O senso de humor da sentença, entretanto, nos leva a refletir sobre esse antigo debate que envolve a arte de conhecer o passado. Afinal, será que a história, de fato, se repete ou, pelo contrário, tudo que vivemos, em nossas vidas pessoais e enquanto humanidade, é sempre novo? Certamente essa não é uma pergunta simples de encontrarmos respostas e, portanto, cabe investigarmos com cuidado acerca dessas ideias.

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Antes de mais nada, é preciso deixar claro que este é um assunto extenso e que não há consenso entre os historiadores acerca disso. Porém, a posição mais aceita nos dias atuais é a ideia de “processo histórico”, ou seja, de que, à medida que o tempo corre, as transformações e continuidades das civilizações seguem. Assim, nenhum fato histórico acontece “do nada”  e tudo é fruto de um processo que pode ter consequências a curto, médio e longo prazo.

De maneira clara, pensemos na nossa própria vida: tudo que fazemos leva um tempo até ser realizado. Quando bebês, passamos meses engatinhando até que um dia consigamos dar nossos primeiros passos, ainda muito desajeitados. Do mesmo modo, até conseguirmos os nossos empregos, passamos por diversos momentos, desde se capacitar para atuarmos no ofício que escolhemos, até uma série de etapas em uma entrevista de emprego. Desse modo, a ideia de que a História ocorre a partir de uma série de processos e que estes são afetados por uma série de fatores leva a maioria dos pesquisadores, atualmente, a concluir que a História se repete de forma exata e precisa.

Se assim o fosse, bastaria adequar as condições que desejássemos para reproduzir um momento histórico, porém, o fator humano, o principal agente nessa delicada equação, não pode ser controlado e muito menos previsível para essa experiência. Assim, por mais que queiramos recriar um cenário que já existiu, sempre haverá mudança devido aos seres humanos que estão inseridos nesses contextos. 

De igual modo, mais uma vez refletindo sobre a nossa vida cotidiana, jamais conseguimos fazer com que os dias sejam exatamente iguais. Podemos nos esforçar com a nossa rotina, tendo horários muito bem estabelecidos, porém uma infinidade de fatores físicos e psicológicos vão, inevitavelmente, afetar e mudar os dias.

Considerando apenas esse ponto de vista, parece-nos que a história não se repete. Porém, como avisamos no começo do texto, essa é uma discussão que está longe de ser concluída. Isso porque, por mais que não consigamos fazer com que os eventos do passado ocorram no presente – ou em outro momento da história – tal como eles foram, ainda há uma grande parcela de fatos, ações e consequências que se assemelham quando enxergamos esse processo histórico. 

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Um exemplo clássico disso se dá quando comparamos diversas civilizações e as razões que as levaram ao seu auge e ao seu declínio. Apesar de cada uma ter vivido seus processos históricos particulares, é inegável que existem uma série de fatores que convergiram para aquele resultado como, por exemplo, crises políticas, escassez de recursos e revoltas. Esses elementos são, geralmente, utilizados como base para análises históricas e, de certo modo, a entendermos sobre o nosso próprio momento enquanto sociedade.

Além disso, há uma questão ainda mais profunda que devemos refletir ao nos perguntarmos sobre a história que se repete: o tempo. O modo como enxergamos e contamos o tempo é, em grande parte, linear. Ou seja: o tempo seria uma dimensão em que só podemos andar para a frente, sendo uma série de momentos que ocorrem em sequência. Partindo disso, temos a sensação de que os fatos da nossa vida são sempre novos, originais e irrepetíveis. Porém, essa percepção linear do tempo cai por terra quando buscamos compreender como essa ideia se apresenta na natureza. 

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Se observarmos, por exemplo, a vida de uma planta, facilmente notamos que ela se expressa a partir de ciclos: a semente brota, a planta desenvolve-se, dá-se os frutos e novas sementes são geradas. No inverno, suas folhas caem, seus frutos apodrecem e a planta “morre”, até que vem uma nova primavera e faz com que ela renasça. Assim é o ciclo das plantas, com diversos auges e declínios dentro da sua história. O mesmo ocorre conosco em relação ao tempo, porém nossas diferenças são sutis e não tão previsíveis quanto as estações do ano. Assim, o tempo da natureza, na qual os seres humanos fazem parte, não se apresenta como uma linha que apenas avança, mas se desenvolve a partir de ciclos com suas características próprias.

Observando dessa perspectiva, a História também participa dessa lei natural. Não por acaso, nossas formas mais objetivas de contagem do tempo envolvem fases: dias, anos e calendários mostram como os ciclos estão presentes em nossa vida e com eles a repetição. Desse modo, devemos compreender que a repetição não se trata, necessariamente, de viver exatamente algo que ocorreu no passado, seja em nossas vidas ou na história da humanidade. A repetibilidade da história está, necessariamente, no fato dos eventos ocorrerem de maneira similar, mas não exatamente iguais. Assim, por exemplo, podemos dizer que ao longo da história humana diversas vezes estivemos mergulhados em um caos, tal qual na Idade Média, assim como tivemos grandes auges, notadamente representada por diversas civilizações no Oriente ou no Ocidente.

Partindo desses aspectos, é possível, analisando detalhadamente, fazermos uma leitura do presente e perceber quais elementos dos dias atuais assemelham-se aos momentos vividos pelo Ser Humano e, quem sabe, inferir se estamos progredindo ou regredindo enquanto sociedade. Assim, ao enxergarmos esses padrões, poderemos usá-los como base para analisar qualquer tempo histórico, salvaguardando, claro, as especificidades de cada cultura e seu contexto.

Dito isso, pensemos em nosso momento atual: apesar da alta tecnologia que desenvolvemos, cada vez mais impera em nossa sociedade o egoísmo e a busca pela individualidade, ou seja, cada vez mais desejamos apenas o nosso sucesso e competimos para isso. A frase “cada um por si” nunca fez tanto sentido como no momento em que vivemos, pois basta uma rápida observação no comportamento das pessoas para notarmos que poucos são os que buscam viver ideias de fraternidade e cooperação. 

Além disso, uma característica crescente no mundo atual é a ignorância, o que nos parece ser um absurdo, uma vez que nunca tivemos um acesso tão fácil à informação de qualidade. Infelizmente a desinformação cresceu na mesma medida e hoje, ao que se faz notar, ganha espaço entre as conversas e opiniões das pessoas. 

Que momento da História se assemelha a essas características? Se nos recordarmos das nossas aulas de história na escola logo notamos que a Idade Média Europeia teve aspectos similares a esses. Isso significa dizer que estamos vivendo tal qual os homens e mulheres do medievo? Não, mas que provavelmente estamos passando por uma nova Idade Média, ou seja, um novo momento de obscuridade e declínio de nossa civilização, afinal, quanto mais separada, ignorante e sem princípios é uma sociedade, mais próxima do abismo ela chega. Assim, podemos ler o momento presente e com ele perceber que, de fato, a história repete-se a partir de um novo cenário, que jamais será exatamente igual, mas que nele contém as mesmas ideias de outrora.

Sendo assim, podemos entender que a questão da repetibilidade da história está em percebermos para onde estamos caminhando, seja como indivíduos ou como sociedade. Em nossa vida pessoal, ao notarmos padrões de comportamento e situações, nossa tendência natural deveria ser a de evitar repetir aquilo que nos leva a tristezas e decepções, correto? Do mesmo modo, se admitimos que a história repete-se, ela passa a ter um valor fundamental dentro da nossa sociedade, pois, a partir dela, poderemos analisar e compreender para onde o nosso estilo de vida atual e valores que cultivamos estão levando a nossa civilização. 

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A história, por fim, deixaria de ser apenas mais uma disciplina, mas se transformaria num confiável mapa que nos guiaria até o futuro. De igual modo, se conseguirmos olhar de maneira objetiva para a nossa própria história, seremos capazes de ressignificar atitudes e tomar posições distintas em nosso presente, modificando o nosso próprio futuro. Isso não significa, claro, que os ciclos, pessoais e coletivos, não vão ocorrer, porém passaremos conscientemente por eles e absorveremos a síntese das experiências vividas. Assim, conhecendo o nosso passado, poderemos sonhar com o melhor dos futuros. Já que a ciclicidade é uma lei e a história há de repetir-se, que ela seja repetida a partir dos auges e não dos declínios.

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