Você provavelmente já se perguntou sobre o que seria a alma humana, correto? Seja por meio da religião ou da filosofia, o conceito de “alma” sempre permeou a vida humana desde os primórdios, mas, ao mesmo tempo, nem sempre nos foi bem explicada. Ela é material? Está dentro de nós? E qual a diferença entre alma e espírito? Todas essas perguntas nascem quando começamos a pensar sobre o que seria, de fato, a alma.
De antemão, deixamos claro que não pretendemos encerrar o assunto, visto que essa é uma discussão milenar e que transpassa a história da humanidade. O que faremos no seguinte texto nada mais é do que apresentar algumas reflexões com base na filosofia de diferentes doutrinas para que possamos expandir nosso conhecimento acerca do tema.
O que é “Alma”?
Dito isso, precisamos saber: o que estamos chamando de Alma? Na cultura popular, associamos alma à nossa parte interna, que não morre após a destruição do nosso corpo, e, por vezes, a associamos aos “fantasmas”, que nada mais seriam do que as almas que vagam pelo mundo buscando conforto. É fato que essa visão popular é, no fundo, uma mistura de crenças e sincretismos que, ao longo dos séculos, fez com que o assunto se tornasse mais complexo do que necessariamente é.
Sendo assim, devemos retornar ao conceito original da palavra para que assim possamos entendê-la com perfeição. A palavra “alma” vem do grego “anima”, que nada mais é do que a qualidade daquilo que está em movimento. Não por acaso, falamos que uma pessoa que está agitada está “animada”, assim como alguém que nos parece cansada e com tédio a qualificamos como “desanimada”, não é verdade?
Considerando essa perspectiva inicial, os gregos apontaram que o ser humano pode ser animado por duas “forças”, chamemos assim. Uma delas é a do instinto, que nos obriga a movimentar em direção a perpetuação da espécie, a conservação da vida e preservação de nossa energia e segurança. Não precisamos ir longe para entender esse conceito: quando sentimos fome, não precisamos de um comando racional para nos lembrar de comer, simplesmente sentimos a necessidade e atuamos para saciá-la. Com o medo ocorre a mesma coisa, quando detectamos um perigo, nosso corpo entra em estado de alerta e pronto para agir.
Tais formas de ação são fruto do instinto e, portanto, são semelhantes aos dos animais, uma vez que estes possuem essas mesmas faculdades. Por isso, os gregos classificaram esse tipo de “anima”, como uma “alma animal”, uma parte do ser humano que tem como objetivo movimentar-se pelos instintos e a saciação dos seus desejos.
Por outro lado, os seres humanos são atraídos por outras formas que não estão ligadas ao instinto. Nos interessamos em ciência, ficamos parados apenas apreciando um pôr do sol, podemos contemplar a arte, seja na natureza ou na humanidade, e também podemos agir por valores que vão de encontro ao comando do instinto. Em uma ação heroica, por exemplo, podemos nos colocar frente ao perigo para proteger outras pessoas; podemos ajudar uns aos outros sem pensar em benefícios. Tudo isso, de modo geral, é um tipo de ação que não está animada pelos nossos instintos, mas sim por algo maior, por algo que parte da razão e que somente o ser humano é capaz de fazer.
Como os demais seres da natureza não se movimentam desse modo, ou seja, não usam a razão para superar o instinto, denominou-se esse tipo de conduta como advinda da “Alma humana”. Essa seria nossa verdadeira alma, nossa verdadeira natureza, que é única e que deveríamos expressá-la a todo tempo.
O ser humano, portanto, estaria numa encruzilhada: de um lado sua alma animal, puxando-o para o mundo dos instintos e desejos; do outro, a alma humana, querendo elevá-lo ao mundo das virtudes e das ideias. Qual escolher? Frente a esse dilema, é importante pensarmos, portanto, que a Alma – agora em um conceito mais geral – se trata daquilo que internamente nos faz movimentar. Há quem seja dominado pelos instintos e pense apenas de forma egoísta, enquanto há aqueles que conseguem fazer grandes sacrifícios pela humanidade. Todos nós somos iguais, a diferença está pelo que nos movimentamos.
Visto isso, podemos pensar que os gregos não acreditavam, portanto, em um conceito de “alma” similar ao que vemos hoje em dia, ou seja, a ideia de algo eterno em nós e que se desprende do corpo ao morrer. Esse pensamento, porém, é equivocado. Sim, os gregos entendiam que uma parte nossa não morre, mas que segue em sua jornada para unir-se ao divino. Essa parte seria a nossa essência, nossa verdadeira natureza, que, em resumo, seria o que eles chamam de alma humana.
Para os moradores da Hélade, a alma desce ao mundo e está presa ao corpo, que tem suas limitações dentro do mundo material. Querendo libertar-se, essa alma guia o corpo para prazeres mais elevados, aquilo que é próprio de sua natureza, porém encontra resistência com o instinto. Ao morrer, essa alma estaria finalmente liberta e voltaria para sua origem, recolhendo graus de experiência e aprendizados. Assim, nessa percepção, a alma retornaria a um local em que juntaria-se ao divino, até ter uma nova oportunidade de retornar ao mudo da matéria em um outro corpo. Essa é a ideia socrática de transmigração da alma, que se aproxima a ideia comum, nos dias atuais, de reencarnação.
Qual a diferença entre Alma e Espírito?
Devido a essa “dupla função” da alma – a de ser uma parte atemporal do ser humano e, ao mesmo tempo, ser aquilo que anima o corpo –, com o tempo foi sendo natural confundir os termos “alma” e “espírito”. Muitas vezes entendemos como “espírito” essa parte atemporal que há em nós e que está ligada ao mais sagrado. Muitas religiões e culturas humanas, entretanto, tratam o espírito como uma parte ainda superior a alma, no qual somos incapazes de alcançar diretamente. Nesse ponto, a alma humana seria uma ponte para alcançar esse espírito, que objetivamente não está plasmado na matéria.
O termo “espírito”, assim como a alma, também ganhou conotações negativas na cultura popular e se tornou sinônimo de assombração ou fantasmas. Porém, de forma mais objetiva, o espírito pode ser traduzido como a essência última, o mais sagrado e mais profundo que há em nós, por isso é intangível.
Do mesmo modo, usamos essa palavra para falar do “espírito do tempo”, ou seja, a essência de um momento histórico, ou mesmo “Espírito Santo”, que seria essa essência que em tudo penetra e torna todo o cosmos como uma evidência do divino. Sendo assim, enquanto a ideia de “alma” tem um caráter individual, em que cada um de nós pode se conectar e perceber – entenda “perceber” como criar uma relação acerca do que nos “anima” –, o espírito estaria em uma esfera completamente diferente, associada diretamente ao plano do Todo.
Aprendendo a alimentar nossa Alma
Agora que já entendemos um pouco sobre a alma, é importante refletirmos sobre como podemos deixá-la saudável, afinal, uma vez que ela participa da nossa realidade e, de acordo com as tradições humanas, é nela que se guarda toda a memória de nossa existência, devemos conduzi-la da melhor forma.
Do mesmo modo que nosso corpo precisa de nutrientes para se manter saudável, nossa alma também precisa de alimento para representar aquilo que está de acordo com sua natureza. Daí a preocupação, desde as primeiras culturas humanas, de buscar uma vida equilibrada, virtuosa, sem vícios, para que o ser humano seja um ser completamente são, tanto em seu corpo, como na sua mente e na sua alma.
Mas como alimentamos nossa alma? Como falamos anteriormente, somos movidos por duas forças. Logo, qual alma vencerá a disputa de comandar nossas ações? Naturalmente, aquela em que colocamos mais energia. Se nos movermos apenas pelos nossos instintos e satisfação dos nossos desejos, o que restará da bondade, da justiça, da ordem? É provável que nada. Basta observarmos uma pessoa entregue aos desejos e vícios, ela se torna alguém livre ou um escravo de suas vontades?
Nesse sentido, alimentar a alma humana está necessariamente ligado ao exercício de virtudes. Em linhas gerais, a nossa natureza humana se exprime quando nos colocamos a serviço do outro, seja do modo que for. Ficamos felizes quando realizamos um ato que não foi pensado apenas em nossos prazeres e desejos, mas sim na contribuição para com o Todo. Essa natureza cooperativa faz parte da nossa espécie, mas perpassa por algo transcendente, como se nosso verdadeiro papel fosse agir de modo consciente, contribuindo assim para a manutenção desse sistema cósmico.
É evidente que a luta interna do ser humano continua. Nem sempre somos virtuosos e os nossos vícios estão a todo tempo nos rondando. Devemos aprender, nesse primeiro momento, a equilibrar essa balança e perceber que dentro de cada um de nós há duas forças. Cabe a nós decidir quem vencerá.