Série “Os diferentes tipos de Arte”: O Teatro

Hoje, propomos a você, caro leitor, um exercício de imaginação: pensemos, por um momento, que você é outra pessoa, com outra história de vida, outras experiências, convicções e sentimentos. Pense que você, por um instante, é um personagem que representa uma ideia, um arquétipo, seja ele qual for. No fim desse momento, tal qual em uma peça teatral, você poderá retirar seu figurino, desfazer-se desse personagem e voltar a ser quem você realmente é. 

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Por esses momentos, você conseguiu deixar as características que o compõem, ou seja, o seu “jeito” para se tornar um símbolo, ou melhor, a representação de um personagem que transmite um pensamento ou emoção. Assim é a vida do ator que sobe no palco e busca apresentar ao seu público não somente uma história, com suas nuances e emoções, mas uma ideia a ser deixada. Esse tipo de Arte, apesar de hoje existir em diferentes formatos como filmes e séries, tem uma origem mais antiga e que ainda hoje pulsa em nossa sociedade. Estamos falando do Teatro, uma das mais clássicas expressões artísticas da humanidade.

Apesar de alguns especialistas remontarem sua origem na Pré-história, a partir da imitação de animais, o mais aceito é que o Teatro, enquanto manifestação da Arte, tenha surgido na Grécia Antiga. No início, seu caráter era puramente religioso, sendo peças realizadas para adoração aos Deuses, em especial o Deus Dionísio. Porém, a partir do século V a.C. o Teatro ganha novas formas na Hélade e passa a ter uma função de entretenimento e de reflexão sobre a vida. Dividido em duas categorias, a tragédia e a comédia, o teatro tinha duas Divindades que a representavam: Melpômene e Talia. 

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Assim como outras formas de Arte, para os Gregos, o Teatro tinha um componente sagrado, pois permitia que os atores plasmassem ideias, mitos e histórias a partir de sua atuação. O público, por sua vez, encarava o Teatro não somente como forma de entretenimento, mas também como um meio de educação através da cultura Grega. A tragédia, por exemplo, que geralmente associamos a um final desastroso, na verdade era um gênero que remonta aos dilemas humanos, mitos e acontecimentos “sobrenaturais”. Assim, para os Gregos, esse gênero teatral estava muito mais ligado a uma profunda reflexão sobre a condição humana e aos Deuses do que necessariamente uma série de emoções exacerbadas. Já a comédia, por sua vez, tinha, de fato, um caráter muito mais lúdico e satírico, representando histórias comuns e com o sentido de diversão. Pela sua falta de profundidade, inclusive, era vista como um gênero menor, talvez por isso conhecemos tão pouco de suas obras.

Considerando essas ideias, é importante pensarmos nos métodos que o Teatro emprega para conectar-se com o seu público, utilizando-se de ideias tão profundas. Para isso, uma peça fundamental, como sempre, é o artista. Ele é, e sempre será, esse canal pelo qual conecta os dois mundos. Cabe, portanto, ao ator ser um intérprete da vida, que consiga canalizar as ideias que deseja e vivenciá-la dentro e fora do palco. Se pensarmos no Teatro moderno, por exemplo, perceberemos que a rotina de um ator não é nada fácil. Além dos exaustivos ensaios, que por si só demandam centenas de horas e refinamento, é necessário uma meditação profunda para “encarnar” o papel, seja ele qual for. 

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O Teatro, ao longo da história humana, foi se desenvolvendo e quebrando paradigmas. Um exemplo disso é a famosa “quarta parede”, a linha imaginária que separa o público da peça em si. Se hoje é comum a interação e por vezes a participação do público em espetáculos, por muitos séculos este foi um tabu. Ainda assim, na humanidade, temos verdadeiros gênios nessa Arte que inovaram em diálogos, na construção de ideias e na preparação dos atores. É impossível, porém, falar de Teatro sem lembrarmos de William Shakespeare, talvez o maior dramaturgo que tenha vivido neste planeta.

Nascido na Inglaterra do século XVI, as peças de Shakespeare são verdadeiras obras de Arte. Nelas fica intrínseco o valor humano perante nossas debilidades, defeitos e vícios. Em geral, sua peça mais conhecida é o romance proibido de Romeu e Julieta, o casal que não pode ficar junto devido a uma rixa familiar. A peça representa o Amor que não pode ser concretizado em vida e, assim, busca a morte, pois nela podem se unir sem se preocupar com os dilemas da vida humana. Neste sentido, Romeu e Julieta e seus sacrifícios representam o Amor de almas que seguem juntas na dimensão atemporal. 

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Outras peças geniais escritas por Shakespeare são o Rei Lear, Macbeth e Otelo. Nelas, os temas da velhice, do poder e do ciúme são colocados de maneira cristalina aos olhos do público, levando-nos a refletir sobre esses temas, seus perigos e elementos que devemos ficar atentos para não cometermos os mesmos erros de tais personagens. Partindo disso, Shakespeare é um excelente exemplo de como o Teatro é uma ferramenta útil para a reflexão sobre a humanidade e seus dilemas. 

Diferentemente de outras Artes, como a Pintura e Escultura, por exemplo, nas quais o artista trabalha só, o Teatro envolve uma série de artistas que, dentro ou fora do palco, fazem o espetáculo ocorrer. O caráter de grupo, portanto, é fundamental para que a “magia” do palco seja plasmada com perfeição. Visto isso, o esforço do Teatro exige uma dedicação coletiva, o que por vezes, a torna mais difícil de ser vivida, uma vez que depende de todos os participantes.

Apesar disso, qualquer um que tenha experienciado esse tipo de Arte, seja como ator ou plateia, compreende como é possível ser mágico o momento vivido no Teatro. Visto isso, podemos pensar sobre como essa dinâmica se reflete na vida. Se o artista é aquele que consegue viver vários papéis, interpretar diferentes personagens e ainda assim ser ele mesmo, será que na vida também não fazemos um pouco disso? Há momentos em que somos pais, filhos, amigos, esposos, funcionários e assim por diante. Em cada uma dessas áreas, atuamos de um determinado jeito, seguindo as regras próprias de cada ambiente, não é verdade? Mas, no fim, quando todas as luzes se apagam e descemos desse palco da vida, quem somos?

A palavra “personalidade”, ao qual atribuímos parte de nossa identidade, é fruto do Teatro Grego, da palavra “Persona”, que significa “máscara”. As máscaras, tão usadas nas tragédias e comédias da Grécia Antiga, eram um símbolo para demarcar a diferença entre ator e personagem. De igual modo, por vezes, nos escondemos em nossa personalidade e deixamos nossa verdadeira identidade atrás dessa máscara, como se fosse um escudo. Porém, acabamos confundindo a máscara com nosso próprio rosto e nos enamoramos desse personagem que criamos para nós mesmos.

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A vida, tal qual um Teatro, está sempre nos fazendo entrar em cena. Podemos atuar em diversos papéis, mas nunca podemos deixar de saber quem verdadeiramente somos. A diferença do grande artista para os comuns é que este não perde jamais a noção de quem ele é, a sua identidade. Jamais se confunde com seus personagens que são necessários somente em cima do palco, mas jamais fora dele. Todos nós, como “artistas da vida”, chamemos assim, deveríamos também compreender essa ideia. Por mais que interpretemos bem cada uma dessas funções, é preciso saber que em essência não somos nenhuma delas.

Não somos o nosso cargo, pois ele pode nos ser tirado. Não somos nossa família, pois um dia os filhos crescem e saem de casa e os pais descansam. Também não somos nossas relações, pois elas estão sujeitas a mudanças. No fim, o Teatro é o palco das ilusões no qual tem a função de transmitir ideias, mas que não são reais, pois uma hora, o espetáculo chega ao fim. Nós, de igual modo, também chegaremos ao final desta existência, porém o nosso verdadeiro Eu que está por trás de todos os nossos personagens, seguirá nos bastidores da vida, esperando mais uma oportunidade de entrar em cena.

Portanto, lembremos disto: a maior peça teatral que vivemos é a nossa vida. Diante disso, que sejamos artistas da vida e que possamos interpretar todos os nossos personagens, com os dramas, conflitos e resoluções necessários à vida. Porém, por trás de tudo isso, lembremos de quem somos. Essa é, por fim, a verdadeira lição que podemos extrair dessa tão antiga forma de Arte.

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