Aristóteles, um dos maiores filósofos da Grécia, explicou certa vez que o Ser Humano está destinado ao saber. De acordo com esse pensador, podemos aprender de diversas maneiras: pelas sensações, pela experiência, pela técnica e pela sabedoria. De fato, quando pensamos nas possibilidades com as quais compreendemos – e, até certo ponto, a partir das quais entendemos – a vida ao nosso redor, não há como negar que ele esteja ao lado da razão.
Diversas correntes da pedagogia também apontam que do mesmo modo que há vários caminhos para se aprender, também existem diversas formas de ensinar. Para tirarmos a prova disto, basta lembrarmos do tempo que frequentávamos a escola. Quantos professores passaram por nossa vida escolar? Incontáveis. Mas certamente houve alguns que se tornaram marcantes por conseguirmos aprender bastante em suas aulas e outros que, infelizmente, ficaram marcados em nossa memória como um exemplo negativo e até mesmo traumático dentro de sala de aula.
Nos dois cenários, as causas para o sucesso e o fracasso são as mesmas: a forma de ensinar ser compatível com a maneira do aluno aprender. Sim, é isso mesmo, todos nós temos uma forma de aprender e é por isso que a maneira de ensinar nos atrai ou repele nossa atenção.
Já perceberam, por exemplo, que há pessoas extremamente habilidosas em disciplinas de “exatas”, como matemática e física? O pensamento lógico, as fórmulas e a sequência exaustiva de exercícios para essas pessoas é como um delicioso passatempo que quanto mais se pratica, mais alegre se torna a atividade. Outras pessoas, porém, são verdadeiros devoradores de livros. Sua concentração não está na repetição, mas na construção de uma narrativa que as envolve de tal maneira que se torna impossível não gostar do que está aprendendo. Essas duas formas, geralmente opostas, são tendências naturais da nossa personalidade.
É evidente que existem outras tantas formas de aprendizado nas quais podemos nos encaixar. No entanto, não nos cabe entrar em detalhes nesse texto, pois em verdade a forma de aprender é apenas um aspecto de algo ainda mais amplo dentro da mente humana: as múltiplas inteligências.
Antes de entrarmos nesse assunto, é preciso explicar uma diferença fundamental entre “inteligência” e “agudeza mental”, pois hoje é extremamente comum confundi-las. O que estamos chamando de “agudeza mental” nada mais é do que a capacidade de analisar, fazer relações, elaborar métodos e teorias acerca de um determinado objeto de estudo. Geralmente quando encontramos alguém com essas características, falamos que essa é uma pessoa “inteligente”, não é mesmo? O famoso teste de Quociente de Inteligência – o QI – ainda hoje carrega esse nome para medir a capacidade individual de observar padrões, fazer relações e elaborar lógicas, das mais simples até as mais complexas.
Entretanto, em seu sentido primeiro, inteligência tem um outro aspecto. A origem dessa palavra vem do latim intellegere que nada mais é do que “discernir entre”. Sendo assim, podemos traduzir inteligência como a capacidade de discernimento de uma pessoa. Percebe como essa ideia é distinta da “agudeza mental”? Uma pessoa extremamente eficaz no pensamento lógico é capaz de não saber discernir a forma correta de tratar outras pessoas, por exemplo. É possível ainda que essa mesma pessoa, tão genial com análises e métodos, não consiga falar em público, ou ter habilidades sociais que sejam necessárias para o discernimento.
Sendo assim, deixemos claro que inteligência é discernimento e que é possível que tenhamos múltiplas formas de exercê-la. Nos dias atuais, por exemplo, existem outros quocientes de inteligência que não dizem respeito apenas a capacidade de análise e raciocínio lógico como o QIE, também conhecido como Quociente de Inteligência Emocional. Os testes realizados para determinar o QIE de uma pessoa focam também em sua capacidade de reconhecer e controlar suas emoções, desde as mais comuns até níveis em que podemos nos descontrolar.
Visto isso, o cientista Howard Gardner desenvolveu a teoria das múltiplas inteligências, elencando-as em: inteligência linguística, lógico-matemática, espacial, musical, corporal, intrapessoal, interpessoal e naturalista. Ao todo Gardner considera essas 8 áreas como essenciais para o desenvolvimento humano e, em algum grau, todos nós as possuímos em diferentes medidas. Você já conseguiu identificar qual a sua inteligência mais desenvolvida? Não? Vamos explicar um pouco mais sobre elas então.
Começando pela inteligência linguística, ela diz respeito à capacidade de empregar palavras de maneira correta, na elaboração de textos e discursos de forma eficiente. Esse tipo de inteligência é desenvolvida, em geral, por algumas profissões e conta com outras habilidades como a oratória, a retórica e a escrita. Jornalistas, escritores e políticos são pessoas que a todo momento estão colocando em prática esse tipo de inteligência e por isso a desenvolvem mais rapidamente, afinal, tudo que fazemos de forma repetida nos torna um especialista.
Já a inteligência lógico-matemática é aquela que usualmente já conhecemos. Diz respeito à capacidade de resolver problemas, enxergar padrões e construir raciocínio lógico. Essa é, sem dúvida, a inteligência mais “valorizada” na nossa sociedade atual e é utilizada, como já explicamos, como um balizador para medir as pessoas e seu nível de agudeza mental. Mais uma vez, reforçamos que ela é apenas uma das inteligências e que não deve ser considerada como a melhor, pois não há, de fato, uma hierarquia nessas habilidades. O que há, de fato, é uma preferência da nossa civilização atual nesse tipo de inteligência.
Dando continuidade, a inteligência espacial está voltada para a capacidade de enxergar detalhes, de visualizar imagens na mente e, a partir desse modelo mental, de imaginá-lo no mundo. Esse tipo de inteligência é praticada principalmente por engenheiros e arquitetos, mas também por pintores e artistas plásticos. É impressionante nos depararmos com pessoas que têm um alto grau de inteligência espacial; pois enquanto enxergamos, por exemplo, apenas um bloco de mármore comum, essas pessoas conseguem visualizar uma estátua perfeita e, a partir desse modelo, são capazes de fabricá-la. Um exemplo clássico desse tipo de inteligência é Michelangelo, o grande artista do Renascimento e que foi autor de grandes obras como A Pietà e David.
A inteligência musical, como o nome já pressupõe, está diretamente ligada com a capacidade de reconhecer e combinar sons. Pessoas com “ouvido absoluto”, por exemplo, demonstram uma grande capacidade nesse tipo de inteligência. Reconhecer as notas, as melodias e arranjos são habilidades que podem ser treinadas – e todas essas inteligências podem ser desenvolvidas –, mas também despertadas por conta de um grau de “intuição” latente em pessoas que desde pequena já demonstram capacidades fora do comum. Podemos citar como exemplo Amadeus Mozart, que aos 8 anos de idade já era capaz de tocar uma centena de músicas e já havia criado suas próprias peças.
A inteligência corporal, por sua vez, refere-se à capacidade e controle dos próprios movimentos. Aprender movimentos e posições novas geralmente é um desafio para a maioria das pessoas, pois nosso corpo se acostuma a se movimentar sempre do mesmo modo. Essas pessoas conseguem, porém, desenvolver novos passos, adaptar o corpo para diferentes situações e desenvolver seus músculos de forma mais rápida que o comum. Apesar de parecer apenas características fisiológicas, o corpo também guarda uma inteligência própria e, quando bem utilizado, é capaz de formar grandes atletas, cirurgiões e dançarinos.
Já as inteligências intrapessoais e interpessoais estão intimamente ligadas. Elas dizem respeito à capacidade de saber lidar consigo mesmo (a intrapessoal) e com os demais (a interpessoal). Pessoas que possuem alguma dessas duas inteligências, em geral, conseguem lidar com dilemas de convivência de modo mais natural, não se deixando levar por fortes emoções. Além disso, mesmo diante de grandes conflitos são capazes de estabelecer uma excelente comunicação com outras pessoas. Como podemos perceber, cada vez menos esse tipo de inteligência vem sendo exercitado em nosso dia a dia, uma vez que a intolerância, o desrespeito e a falta de empatia ganham mais terreno a cada dia que passa. Essa, talvez, seja a principal inteligência que deveríamos desenvolver para que possamos mudar a nós mesmos e ao mundo.
Por último, temos a inteligência naturalista, característica de pessoas com grande capacidade de observar e classificar objetos da natureza como plantas, animais e minerais. Além de conhecer propriedades, a capacidade de observar detalhes faz com que tais pessoas sejam especialistas em distinguir uma planta de outra ou distinguir detalhes de uma espécie animal. As profissões que mais lidam com esse tipo de inteligência são, naturalmente, os biólogos e botânicos.
Como podemos observar, cada uma dessas inteligências podem ser definidas como uma “especialidade”, e todos nós, em diferentes níveis, temos condição de desenvolvê-las. O grande problema, porém, está na maneira pela qual lidamos com essas distintas capacidades. Em geral, condicionamos as pessoas a classificar e hierarquizar esses conhecimentos, logo, focamos o desenvolvimento das crianças apenas em alguns desses tipos e ignoramos completamente os demais.
Achamos, por exemplo, que uma pessoa comunicativa e que é capaz de organizar grupos, juntar pessoas e gerenciar conflitos, mas que não desenvolveu bem a inteligência lógico-matemática, é um indivíduo que apenas “gosta de conversar”. Em uma sala de aula, inclusive, pode ser um dos alunos “problemáticos”, mas que apenas precisaria de outros estímulos para direcionar seu desenvolvimento. De modo similar, as disciplinas escolares estão voltadas, em geral, para um grande desenvolvimento do pensamento lógico e pouco – para não dizer nada – para a parte corporal, musical e espacial. Tais habilidades são oferecidas em outros espaços, e talvez por isso não sejamos tão habilidosos com essas inteligências.
Por fim, é fundamental entendermos que cada pessoa tem suas próprias características e modo de aprender. Cabe-nos conhecer a nós mesmos para saber quais são nossas inteligências mais desenvolvidas e quais ainda precisamos trabalhar para conseguir um maior desempenho. No final das contas, Aristóteles, de fato, tinha toda a razão: somos seres fadados ao conhecimento, e por diferentes caminhos chegaremos à sabedoria. Basta agora identificar qual trilha queremos percorrer nessa longa jornada até o verdadeiro saber.