Todo Ser Humano tem uma inclinação natural para o saber. Isso ocorre porque faz parte da natureza humana, dotada da razão, achar explicações para tudo à nossa volta. Não por acaso, criamos hipóteses e teorias sobre tudo na vida, desde a formação do Universo até o motivo que leva uma pessoa a querer vencer um reality show.
Essa busca por respostas ficou marcada em diversas civilizações que, em sua maioria, representavam a Sabedoria como um Deus. Na Índia, por exemplo, temos Ganesha; na cultura grega temos Atena; na romana Minerva, e assim por diante. Esse fato demonstra o quanto esses homens e mulheres do passado valorizavam o saber. E para refletirmos mais profundamente acerca disso, apresentamos o Deus egípcio da Sabedoria: Toth.
Para os antigos egípcios, o Deus Thoth era representado com o corpo humano e a cabeça de Íbis. Além disso, a divindade seria a responsável pela lua, a magia e a escrita. Vamos analisar cada um desses elementos e os seus mitos para compreendermos melhor seus símbolos.
Conta o mito que, Toth foi o Deus responsável por criar a escrita e ensiná-la aos Seres Humanos. Essa escrita seria, no caso, os famosos hieróglifos. Por esse mito os antigos egípcios relacionavam o Deus com qualquer tipo de conhecimento, inclusive, ele teria sido a divindade responsável por introduzir a magia no mundo, o que o tornou bastante popular entre sacerdotes e nos cultos herméticos. A magia, que em geral é relacionada com a ideia de ser um conhecimento oculto e mistérico, também guarda relação com o fato de Toth ser o Deus da lua, pois em geral os egípcios associavam esses dois elementos, lua e mistério. Não por acaso, até os dias atuais ainda há fortemente essa relação entre as fases da lua e um tipo de mágica, advindos também de outras culturas ao longo da História.
Outro papel importante do Deus da Sabedoria egípcio era o de mensageiro dos Deuses. Por dominar a escrita e entregá-la aos Seres Humanos Toth fazia assim uma ponte entre as divindades e os mortais. Essa relação de ser uma ponte entre o Divino e o Ser Humano é, em última análise, um modo de entendermos o papel da Sabedoria na nossa vida: através da Sabedoria, ou seja, da percepção natural da Vida e das suas Leis, é que podemos nos conduzir para chegar até o maior dos Mistérios, que seriam os Deuses.
Essa característica de ser um mensageiro foi compreendida também pelos gregos, que o associaram ao Deus Hermes. Com o passar do tempo, principalmente após a dominação macedônica sobre o Egito, a relação entre as duas divindades se aproximou ainda mais, o que explica, por exemplo, o nome de “Hermes trimegisto”, o sábio egípcio que escreveu o Caibalion. A referência de “Hermes” é, na verdade, uma associação com o Deus Toth.
Outro ponto importante para nossa reflexão está na característica física do Deus Toth. É interessante notar que a Íbis, para os egípcios, têm dois aspectos interessantes que podemos relacionar com a Sabedoria. O primeiro refere-se à caça da íbis, que alimenta-se dos ovos de crocodilos. Os crocodilos, por sua vez, são os predadores dessa ave. Essa informação, que à primeira vista parece não nos acrescentar nada, em verdade nos ajuda a entender o papel da Sabedoria em nossa vida. O sábio é aquele que busca a causa dos problemas e busca resolver as situações partindo de suas raízes. Portanto, o fato da Íbis alimentar-se de ovos de crocodilo é, a nível biológico, uma maneira de atuar na causa de um problema que, se deixar crescer, poderá significar a morte da espécie.
Esse é um aspecto interessante porque, no geral, não atuamos desse modo. Geralmente nos perdemos nas consequências ou fatos objetivos da nossa vida, e não percebemos que há uma razão por trás dos acontecimentos. Se não buscarmos resolver as causas estaremos sempre mergulhados nos mesmos conflitos e dilemas. Seria como, fazendo um paralelo, ter uma goteira em casa e apenas enxugar o chão molhado, sem nunca buscar olhar para o teto e tampar a goteira.
O segundo motivo pelo qual os egípcios atribuíram a Toth uma cabeça de Íbis foi o fato de que, em um dos seus mitos de criação, o mundo teria se originado a partir de um ovo dessa ave. Logo, para os egípcios, Toth teria a chave da causa e existência do Universo. A Sabedoria, a partir desse ponto de vista, é um caminho para compreendermos o mundo, uma vez que nela está contido os segredos do Universo.
Essa é uma chave profunda, mas ao buscarmos relacionar com nossa vida cotidiana podemos perceber que na natureza existem Leis, ou seja, Princípios que regem todos os seres. Todos nós, por exemplo, estamos submetidos à Lei da Gravidade e por conhecê-la tão bem podemos viver de acordo com o que ela nos dita. Entendemos seus Princípios e a seguimos de maneira natural, logo, nesse aspecto da vida obtemos Sabedoria.
Um outro momento, para os egípcios, em que Toth participava da jornada humana seria na morte. Segundo a tradição do Egito, ao morrer, a Alma da pessoa participaria de um julgamento para saber se iria desfrutar do outro mundo ou se deveria retornar para a terra e viver uma nova experiência humana. Para isso, pesava-se o coração do morto em uma balança e comparava seu peso ao de uma pena, a pena da Deusa Maat, conhecida por ser a Deusa da Justiça. Se o coração do morto fosse mais pesado ou mais leve que a pena, a sua Alma seria devorada por um monstro e nasceria de novo no mundo. Caso o coração tivesse a mesma medida que a pena, a pessoa passaria e faria uma confissão negativa perante 42 juízes, ou seja, o morto diria todos os crimes que não cometeu em vida para poder ser julgado.
Frente a esse tribunal espiritual, o papel de Toth seria o de registrar a confissão e apresentá-la a Osíris, o senhor do mundo dos mortos, que decidiria o destino dessa Alma. Toth é, portanto, aquele que valida as ações e isso é um símbolo poderoso, pois como este é o Deus da Sabedoria podemos perceber a intrínseca relação, mais uma vez, entre o acesso ao desconhecido, misterioso (nesse caso, o mundo dos mortos) com um modo de viver e de compreender a Vida.
A Sabedoria, portanto, não é apenas uma busca do Ser Humano, uma mera curiosidade. Ela pertence à nossa evolução, é, de fato, um caminho para alcançarmos novos patamares e observar a Vida de um ponto acima, enxergando suas Leis e se movimentando a partir delas. No fim, a Sabedoria nos ensina como “jogar o jogo da vida” e Toth, por meio dos seus símbolos, é responsável por nos transmitir essas ideias. Seja ensinando a Humanidade a arte da escrita, seja sendo mensageiro dos Deuses ou guiando nossa conduta para que possamos adentrar ao reino de Osíris, o certo é que a Sabedoria está presente em toda a nossa Vida, como um fio condutor que nos leva até a nossa íntima natureza. Então, que possamos ser conduzidos e aprender, cada dia mais, a enxergar a Vida sob essa perspectiva. Quem sabe, quando chegarmos a esse local mais alto, não possamos entender um pouco mais sobre essa sutil Arte de Viver.