Série “A Revolução Francesa”: do Diretório ao golpe do 18 Brumário, o fim da revolução

Bem-vindos ao último texto de nossa série “A Revolução Francesa”! Hoje falaremos dos capítulos finais que levaram a revolução que mudou o rumo do Ocidente ao fim, deixando a França mais uma vez à mercê de um governo autoritário e concentrado na figura de apenas uma pessoa. Nesse caso, o governante era ninguém menos que Napoleão Bonaparte, o grande general francês.

Pintura "A liberdade guiando o povo" do Eugène Delacroix
Pintura “A liberdade guiando o povo” do Eugène Delacroix

Para aqueles que ainda não acompanham nossa série, recomendamos que, antes de prosseguir nesta leitura, leiam nossos textos anteriores, principalmente nosso texto de introdução, pois nele abordamos as principais questões da Revolução Francesa e como o seu legado ainda repercute no mundo atual.

Vamos, portanto, embarcar nos anos finais do século XVIII e entender como a Primeira República da França agonizou e teve seu fim sob as mãos de Napoleão. 

O governo do diretório: uma solução ao Terror de Robespierre

Como vimos no texto anterior, a fase mais sangrenta da Revolução Francesa ocorreu quando Maximilien Robespierre, um jacobino radical, assumiu o  governo da França através do comitê de salvação e expurgou seus rivais políticos. A perseguição aos girondinos e os próprios aliados revelava a verdadeira face de Robespierre, que tiranizou a França por um ano.

Em resposta ao autoritarismo sanguinário dele, diferentes grupos sociais deram-lhe um golpe de estado, retirando-o do poder e o condenado à guilhotina. A experiência traumática do governo de Robespierre fez com que o governo francês pensasse em uma nova forma de administração. Assim surgia o Diretório, um grupo de cinco governantes que tinha como objetivo direcionar o Estado Francês junto com a assembleia nacional. O modelo de governo que chamamos de Diretório foi a fase mais longeva de toda revolução, de 1795 até sua dissolução em 1799.

Feedobem A Morte de Maximilien Robespierre
Execução de Robespierre

Apesar de sua duração, ainda assim o Diretório não foi um modelo de governo eficiente. Marcado por uma intensa corrupção, os diretores já não alimentavam um espírito revolucionário, e a Primeira República da França se via agonizando na burocracia e no roubo. De fato, a pressão política e econômica e a guerra que ainda acontecia no território francês tornavam a vida dos que estavam à frente do governo um verdadeiro barril de pólvora prestes a explodir. 

O Diretório, marcado por ser um governo moderado e aberto ao diálogo, rapidamente se transformou em um verdadeiro balcão de negócios. Assim, o furor e a urgência do início da Revolução Francesa se perderam em questões meramente formalistas. Frente a essa postura, os mais exaltados jacobinos, ainda desejando uma mudança real na vida da população francesa, pressionavam o Diretório, mas com pouca eficiência. A mesma coisa ocorria pelo lado dos monarquistas, que em menor número, ainda defendiam o retorno de um monarca para governar de modo mais “democrático”, o que mais tarde seria conhecido como despotismo esclarecido.

Napoleão Bonaparte: o “salvador” da República

Ao mesmo tempo em que a reputação dos governantes do Diretório desmancha-se sob as acusações de corrupção e ineficiência no processo revolucionário, no front da guerra destacava-se um importante general francês: Napoleão Bonaparte. Militar de carreira, Napoleão é uma peça fundamental na Revolução Francesa, mas não apenas pelos seus anos finais. A bem da verdade, em diferentes ocasiões, o general ficou conhecido como um grande defensor da causa revolucionária e da própria república, atuando diretamente na contenção de insurreições monarquistas e até mesmo acabando com uma revolta em Toulon.

Napoleão cruzando os Alpes. Pintura de Jacques-Louis David, 1805.
Napoleão cruzando os Alpes. Pintura de Jacques-Louis David, 1805.

Tais realizações militares lhe concederam um grande prestígio na sociedade francesa. Napoleão era tido como um herói de guerra, um verdadeiro combatente da causa republicana. Sua fama aumentou ainda mais nos sucessos militares que teve na Itália, combatendo o avanço da Áustria. Sua fama ganhou multidões, e ele começou a ser visto, entre 1797 e 1798, como alguém que poderia assumir o poder na França.

Entretanto, nesse período o general estava envolvido nas suas obrigações militares, defendendo com unhas e dentes a França e evitando a invasão de outras potências. Entretanto, o fato de ter um amplo apoio social e uma credibilidade perante os franceses chamou atenção de diferentes grupos que já não apoiavam o governo do Diretório. Assim se plantava a semente que daria fim a Revolução Francesa através do golpe do 18 Brumário.

Golpe do 18 Brumário: Napoleão chega ao governo francês

No dia 09 de novembro de 1799, Napoleão executava, com apoio da burguesia francesa e dos militares, o famoso golpe do 18 Brumário. Em grande parte, a decisão pelo golpe de estado se deu pela ineficiência do Diretório em suas políticas para estabilizar a nação. Em um momento de desânimo social e caos político, era importante que uma figura com credibilidade e autoridade assumisse o governo e reanimasse as esperanças do povo.

Napoleão Bonaparte recebe o juramento das autoridades como Primeiro-Cônsul. Autor: Auguste Couder
Napoleão Bonaparte recebe o juramento das autoridades como Primeiro-Cônsul. Autor: Auguste Couder

Não havia outra pessoa com tais características na França, senão Napoleão. O general foi convencido a chegar ao poder, pois não era sua intenção se tornar um político. Sabemos que Napoleão era um amante da arte da guerra, que suas estratégias militares eram eficientes e que não havia aspirações políticas. Ao participar do 18 Brumário, o líder do exército francês atendia muito mais aos desejos de outras classes dirigentes do país do que ao seu próprio.

Não por acaso, o grande articulador do 18 Brumário não foi Napoleão, mas sim Abade Sieyès, um dos líderes do Diretório. Ao promover um golpe contra sua própria instituição, Sieyès eliminava do jogo político seus outros concorrentes e sua pretensão era governar junto com Napoleão, formando um grupo seleto de dirigentes.

Inicialmente, foi exatamente isso que ocorreu. Junto com Roger Ducos, formava-se uma cúpula com os três governantes, e a missão deles era formar um consulado capaz de reerguer a França. Unia-se assim o poder militar de Napoleão com as influências políticas de Sieyès e Ducos para apaziguar a tensão social. Junto a isso, a fase do consulado foi fundamental para a consolidação dos direitos adquiridos junto à Revolução Francesa, como o critério de igualdade jurídica entre os cidadãos e a separação definitiva da Igreja e o Estado. Já não era um direito divino governar, mas sim um direito dos seres humanos.

Apesar do sucesso do plano de Sieyès, sua felicidade durou pouco. Em poucos anos, Napoleão percebeu que o seu prestígio militar poderia suplantar a repartição do poder e, gradualmente, foi ganhando mais notoriedade frente à política francesa. Assim, em 1804, Napoleão se consagra o Imperador da França, assumindo o título de Napoleão I. 

Napoleão autocoroando-se como imperador da França, em um emblemático ato da Era Napoleônica.
Napoleão autocoroando-se como imperador da França, em um emblemático ato da Era Napoleônica.

É nesse momento que a Primeira República da França é morta, substituída mais uma vez por uma monarquia. Dessa vez, porém, o rei não era um absolutista mandado pelo divino para governar, mas sim alguém amado pelo povo, que aplaudia suas atitudes e iria para a guerra por ele. A França renascia na figura de Napoleão, mas os ideais que moveram a Revolução em 1789 agora já não existiam mais.

O legado da Revolução Francesa ao mundo

É fundamental entendermos que termos como “liberdade, igualdade e fraternidade” são mais do que meras palavras. Esse lema revolucionário mostrou ao mundo uma nova forma de reger a sociedade, a política, a ciência, a arte e a religião. Não por acaso, ainda hoje buscamos viver todos esses princípios em nossas vidas, apesar de muitas vezes não refletirmos sobre eles.

o dilema entre liberdade, igualdade e paternidade. Diferentemente do lema da Revolução Francesa – “Liberté, Igualité, Fraternité”
o dilema entre liberdade, igualdade e paternidade. Diferentemente do lema da Revolução Francesa – “Liberté, Igualité, Fraternité”

O grande legado da Revolução Francesa não está nas novidades técnicas das formas modernas de governo. A democracia construída a partir da Primeira República tem inovações, mas, enquanto conceito, os gregos antigos já a praticavam. Muito menos o terror estabelecido por Robespierre pode ser visto como um trauma, pois antes deles a humanidade já havia sentido o peso da espada de outras centenas de tiranos.

O grande legado que nos deixa a Revolução Francesa é a capacidade de transformação da sociedade. O ser humano é submetido a um sistema social pelo simples fato de ser um ser social, que não pode sobreviver sozinho. Entretanto, há em si a escolha de concordar com as regras do sistema que vive ou não e, caso não as aceite, é possível mudar. Somos capazes de transformar nossa realidade a partir de ações individuais que inspirem os demais.

Devemos, acima de tudo, transformar para melhor nossa realidade. As lições que tiramos da Revolução Francesa são nítidas quanto a isso: nada pode mudar se não mudarmos também. Enquanto vivermos com o desejo de sermos mais poderosos que os demais, de nos colocar em uma posição hierárquica devido aos seus privilégios e não para ajudar o próximo, então essa revolução que pretendemos fazer está fadada ao fracasso, pois nada muda se internamente não formos diferentes.

Eis a nossa reflexão final sobre a Revolução Francesa. A todos que nos acompanharam até aqui, desejamos fortemente que saiamos dessa série mais despertos, capazes de perceber um pouco mais, a partir das experiências do passado, e de perceber como podemos causar transformações internas e externas de maneira positiva ao mundo. Esse é o nosso grande sonho.

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