No antigo livro de sabedoria egípcia chamado “Caibalion” estão escritas as sete leis da natureza. Uma delas versa sobre a polaridade, ou seja, o Universo se expressa através de pólos ou dualidades. De fato, nossa percepção do mundo se dá sempre pelo contraste, o que, inevitavelmente, acaba por formar dicotomias. Sendo assim, compreendemos o que é o frio a partir do calor, o alto com referência do baixo e o bem do mal. Nada disso, porém, é absoluto e tudo depende sempre do referencial que utilizamos. Em geral, usamos como parâmetro o próprio Ser Humano, pois, como diria o filósofo grego Protágoras: “o homem é a medida de todas as coisas”.
Desse modo, tomamos sempre como parâmetros as nossas percepções do mundo e a julgamos a partir das nossas convicções e ideias. Acima disso, a lei da polaridade é a maneira que encontramos de nos relacionar com o Universo e que, gostemos ou não, no fundo essa dualidade é inexistente. Assim, a rigor, frio ou calor só passam a existir quando determinamos até que ponto uma temperatura ou objeto está frio ou quente. De igual modo, levando esse pensamento para todos os aspectos da nossa vida, bem e mal fariam parte da mesma realidade, sendo o Ser Humano o ponto central que determina quais atitudes seriam classificadas como boas ou más.
Inicialmente, podemos achar que essa é uma postura relativista, na qual tudo “depende”. Porém, toda a natureza é regida por leis, às quais podemos estar alinhados ou não. Se agimos conforme as regras, estamos dentro da ordem da Vida Natural, porém, quando isso não ocorre, a vida deixa de fluir e nos sentimos fora do tempo, deslocados. Foi dentro dessa lógica que a religião hindu desenvolveu as ideias de Dharma e Karma, na qual o Dharma corresponde a estar alinhado com a natureza e, consequentemente, realizar-se e o Karma seria uma força que faria com que voltássemos para esse caminho natural da Vida.
Partindo dessas percepções, hoje falaremos de um assunto um tanto “polêmico” e que ao longo da história foi facilmente deturpado, portanto, se faz necessário entendermos os conceitos abordados acima. Falamos do “caminho da mão direita e da mão esquerda”, uma denominação que foi criada a partir do século XIX para explicar as duas linhas de estudo esotéricas e que causam espanto para o grande público.
Hoje diversos grupos se denominam “esotéricos”, ou seja, estudiosos de um conhecimento natural e que busca compreender o significado profundo da vida. A palavra “esotérico” denomina um ensinamento destinado a poucas pessoas, de conhecimento interno e “escondido”. Infelizmente essa palavra no senso comum significa coisas negativas, muitas vezes relacionada com algo maligno. Entretanto, isso não passa de uma percepção superficial das práticas e ensinamentos desses grupos.
Visto isso, durante o século XIX diversas pessoas do Ocidente debruçaram-se sobre os antigos conhecimentos das escolas esotéricas. A maior parte desse conhecimento à época estava perdida ou guardada no Oriente, uma vez que a Igreja Católica destruiu diversos manuscritos por não estarem de acordo com a doutrina cristã. Assim, graças aos esforços de pessoas como Helena Blavatsky, que dedicou sua vida para resgatar esses conhecimentos ao Ocidente, o esoterismo passou a ser praticado no lado Oeste do meridiano de Greenwich.
Nesse cenário, muitas pessoas passaram a interessar-se por esses conhecimentos, porém, com motivos distintos. Haviam aqueles que objetivavam apenas um sucesso individual, aprendendo a controlar aspectos sutis de suas personalidades e desenvolverem uma “mágica” capaz de torná-los bem sucedidos. Já outros buscaram aprender sobre esses conhecimentos para ajudar toda a humanidade na sua evolução. Dessa forma, ainda no incipiente movimento esotérico do século XIX, duas formas de encarar esses aprendizados se deu: os que tinham objetivos individualistas seguiram para o “caminho da mão esquerda”, enquanto os que dedicavam-se à evolução de toda a humanidade formavam o “caminho da mão direita.”
Ao falarmos em “magia” estamos nos referindo à capacidade de influenciar o meio à sua volta, mudando suas circunstâncias. Geralmente associamos esse termo a algo sobrenatural, quase ligado a um ser divino, quando a verdadeira magia está em conseguir vencer as circunstâncias colocadas à sua frente. Nesse sentido, por exemplo, chegarmos em um ambiente que esteja triste ou melancólico e torná-lo alegre é uma maneira de fazer magia. O mago, portanto, não é um senhor de barba branca com chapéu pontudo, mas alguém capaz de transformar o meio em que se encontra de maneira sutil e, por consequência, não se deixa ser afetado pelo meio à sua volta. Em última análise, a magia está em ser autêntico e influenciar o meio.
Desse modo, ao nos referimos à magia, falamos de uma habilidade e essa, por sua vez, pode ser utilizada de diferentes formas. Assim como um objeto pode servir como arma ou instrumento de beleza, a magia pode ser canalizada para fins egoístas ou altruístas. Imaginemos, por exemplo, uma pessoa com capacidade e carisma suficientes para chamar atenção e conduzir uma massa de indivíduos com suas ideias e convicções. A depender de quais sejam essas ideias, pode ser que ela se torne um feroz tirano e subjugue toda a sociedade, ou pode provocar a união dos povos a partir de um ideal de fraternidade. Portanto, a magia em si não é boa ou má, altruísta ou egoísta, mas sim a pessoa que a utiliza.
Deixado claro esse conceito, vamos entender a razão pela qual esses dois caminhos são chamados de direita e esquerda. Como bem sabemos, esses dois termos são usados em diversos aspectos da nossa sociedade hoje, como na política, porém a razão pela qual eles são definidos assim é uma herança medieval. Durante a Idade Média, as pessoas canhotas, ou seja, as que utilizavam a mão e a perna esquerda como dominantes, eram vistas como diabólicas. O lado esquerdo era tido como uma “marca do demônio” e diversos defeitos estavam associados a utilizar de forma predominante o lado esquerdo do corpo. Assim, ao definirem os dois caminhos, aqueles que optam por um caminho individual, que não pensam nos demais, foram também vistos como pessoas sem virtudes, logo, mais próximas do “mal”. Nos dias atuais, discute-se muito esses termos, assim como a utilização, nesse mesmo contexto, da ideia de magia “negra” e “branca” por poder caracterizar como racismo. Assim, a linguagem atual é favorável a utilizar termos como “positivo” e “negativo”, que denotam um caráter mais adequado ao nosso contexto.
No fim, a escolha determinante não chega a ser entre bem ou mal, positivo ou negativo. O fato é a maneira como desejamos nos posicionar frente ao mundo: queremos agir de forma colaborativa ou competitiva? Estimulamos a ajuda mútua ou é “cada um por si”? Os dois caminhos são tratados dentro do contexto esotérico, mas todos os dias estamos optando por essas duas vias de acesso frente à vida. Portanto, não precisamos ser versados em rituais mágicos ou mesmo nos associar a grupos de estudo para sabermos qual dos caminhos vamos escolher.
É fundamental compreendermos isso. Comumente podemos olhar o mundo ao nosso redor e definir se queremos ajudar os demais ou somente a nós mesmos. Tomamos essa decisão a todo instante, com nossos familiares, amigos e colegas de trabalho. A verdadeira escolha, portanto, nunca será entre o individualismo ou o coletivo, pois podemos fazer um mal coletivo, assim como podemos ajudar a humanidade praticando o bem em nossas ações individuais. No fundo e acima dessas escolhas está o ímpeto de querermos viver em um mundo mais harmônico e virtuoso. Para isso, comecemos nós a mudar a forma que enxergamos o mundo e, invariavelmente, nossos caminhos, sejam eles quais forem, irão nos conduzir ao bom, ao belo e ao justo.