Você já ouviu falar sobre o mito de Pégaso, o cavalo alado? Ele já foi muito retratado em pinturas, esculturas e até em desenhos animados. Mas para além dessa imagem, o que será que este personagem da cultura grega significa?
Segundo o mito, Pégaso é filho do Deus Poseidon com a Medusa, mas seu nascimento foi um tanto “incomum”. Isso porque o cavalo nasceu quando algumas gotas de sangue da Medusa, morta pelo herói Perseu, caíram no mar. Dessa união (sangue da Medusa com o mar de Poseidon) nasceu Pégaso, já com suas asas e todo seu esplendor. Esse nascimento incomum se assemelha, de certo modo, ao próprio nascimento dos semideuses gregos, que eram sempre a junção de uma Divindade com um mortal. Devemos lembrar que a Medusa, antes de ser considerada um monstro, era uma mulher.
A diferença que podemos apontar no caso de Pégaso é que em seu nascimento uma pequena parte (algumas gotas somente) é composta do aspecto Humano, sendo a sua maior parte de origem Divina. E por isso, somente os Seres Humanos de coração nobre podiam tomar suas rédeas e usá-lo como montaria. Foi o caso de Perseu, que cavalgou com ele em retorno para casa após matar Medusa e resgatar Andrômeda, e também Belerofonte, um outro herói grego fundamental para entendermos os símbolos de Pégaso.
Belerofonte era um semideus, filho de uma mulher mortal com Poseidon. Ao cometer um crime, o herói precisou fugir de sua cidade natal e se refugiou na corte do Rei Preto, em Tirinto. Tudo corria bem até que a esposa do Rei, chamada Antéia, passou a tentar seduzi-lo. Temendo a ira do rei, Belerofonte a recusou diversas vezes, porém, a rainha, não aceitando ser rejeitada, manipula os fatos e diz ao seu esposo que o herói estava fazendo insinuações vulgares para ela. Ao escutar a acusação da rainha, o rei Preto o expulsa da cidade e manda-o para a Lídia, cidade que era governada por Lobates, o pai de Antéia.
Ao entrar na cidade, Belerofonte recebe uma missão impossível de se realizar: matar a Quimera. A Quimera, na mitologia grega, era um monstro formado a partir de diversas partes de outros animais e que se alimentava de carne Humana. A missão dada por Lobates para Belerofonte era uma garantia de que o herói pagaria caro por ter tentado seduzir a rainha. Porém, vendo a injustiça que se estabelecia para com o herói, Atena resolve ajudá-lo. A Deusa da Sabedoria oferece Pégaso como montaria de Belerofonte, que aceita de bom grado e consegue montá-lo, sem nenhuma dificuldade.
A história segue e Belerofonte vence a Quimera. O problema de verdade começa nesse momento do mito: Belerofonte sente-se digno e merecedor de honras, então resolve voar com Pégaso até o Monte Olimpo, para morar junto com os Deuses. Ele começa então sua viagem até aos céus, mas Zeus não permite que esse ato se concretize. O Deus dos Deuses manda então uma abelha picar Pégaso, o que deixa o cavalo incomodado ao ponto de mexer-se, derrubando assim Belerofonte de suas costas. Nesse momento o herói e sua montaria se separam, um caindo na Terra e o outro seguindo até aos céus. Para salvar Belerofonte da morte, Atena transforma a Terra em uma substância mole, que amortece a queda do herói. Já Pégaso segue sua viagem para o céu e torna-se uma constelação. O mito de Belerofonte termina com o herói tornando-se um mendigo que vaga pela Terra à procura de Pégaso, seu cavalo alado que poderá levá-lo até o reino dos Deuses.
Agora que já conhecemos o mito, será que podemos fazer relações com a nossa vida? Afinal, o que uma história mitológica, escrita há mais de 2600 anos pode revelar sobre o Ser Humano e a sua vida cotidiana? Para responder a essas questões precisamos observar os símbolos que existem no mito e na representação de Pégaso.
Um primeiro símbolo que podemos destacar é o fato de Pégaso ser comandado por Atena. Como já apontamos, Atena é a Deusa da Sabedoria e ela, ao apiedar-se de Belerofonte, ofereceu uma montaria para ajudá-lo em sua prova. Podemos relacionar essa passagem diretamente com o fato de como a Sabedoria pode ser usada em nossa vida para ajudar-nos a combater as dificuldades que surgem à nossa frente. O Sábio é aquele que conhece a Arte de Viver, que compreende a Vida, logo, a Sabedoria é uma ferramenta fundamental para quem busca chegar à Verdade.
Partindo disso, Pégaso é quem leva Belerofonte para enfrentar a Quimera, um monstro horrível que se alimenta dos Homens. A potência do cavalo nos apresenta, mais uma vez, como a Sabedoria nos leva a combater os defeitos que habitam em nós. A luta externa de Belerofonte é contra um monstro, mas internamente ele luta contra ele mesmo, e do mesmo modo acontece conosco. Se nos observarmos por alguns momentos perceberemos que não somos perfeitos. Longe disso, estamos rodeados de falhas e defeitos que acabam por nos limitar. O verdadeiro combate, portanto, é superar aquilo que não somos capazes de aceitar, tanto nas pessoas como em nós. Pégaso, como um atributo do saber, é encarregado de nos ajudar nesse confronto.
Entretanto, talvez o símbolo mais marcante dentro do mito esteja no momento em que Belerofonte vence a batalha. Ele se envaidece por achar que tinha completado sua missão. Pior ainda, o herói acredita ser merecedor de viver ao lado dos Deuses, o que mostra sua arrogância e vaidade. Talvez conosco aconteça algo parecido: quando, por exemplo, nos sentimos bons no que fazemos ao bater uma meta ou conseguir um títlulo. Se nos destacamos em algum esporte também tendemos a nos considerarmos melhores e, naquele instante, superiores aos demais. A vaidade que se mostra após alguma conquista é um sinal de que, provavelmente, ainda não derrotamos por completo o inimigo.
Mesmo assim, Belerofonte se lançou aos céus em busca do seu prêmio e acabou sendo separado de seu companheiro. Enquanto Pégaso alcançou o céu e se tornou uma constelação, Belerofonte foi destinado a vagar pelo mundo. Essa passagem é marcante pois tem um forte simbolismo com o Ser Humano e seu caminho de evolução, pois representa o Homem que perdeu sua parte Divina e tenta reconectar-se com ela.
Se observarmos a imagem de um Homem montado em um cavalo poderemos vê-lo como uma coisa só. Desse modo, quando fala-se que Belerofonte caiu das costas de Pégaso, é como se essa União perfeita tivesse sido desfeita, e agora uma parte ficou acima e a outra foi para baixo. Simbolicamente, Pégaso estaria representando nossa melhor parte, a que encontra-se conectada com os Deuses e que, em nossa cultura, chamamos de Alma.
A Alma guia o nosso destino, e nós, na condição de Seres Humanos, desejamos fortemente encontrá-la. A chamamos por diversos nomes: Eu Superior; Essência; Natureza Humana. No fim, ela é o que temos de mais Profundo e Real, o que nos define enquanto partícipes do Universo. Por isso que Belerofonte passa a procurar por Pégaso, pois, do mesmo modo fazemos em nossa vida. Há quem viva uma existência completa e nunca consiga mergulhar fundo o suficiente dentro de si para achar-se. Porém, não por acaso, Pégaso se torna uma constelação e aponta para o caminho que devemos trilhar: os céus.
Talvez essas sejam ideias muito profundas, mas seria bom imaginarmos em uma jornada que tivesse como fim alcançar a nossa Alma. Poder reencontrar-se e continuar almejando chegar até o patamar Divino. Parece sonho irreal e quase ilusório, porém, essa pode ser uma opção melhor do que vagar eternamente pelo mundo sem nunca conhecermos a nós mesmos, sem direção ou sentido. Por fim, que possamos ser guiados por Pégaso, e assim, possamos alçar, mais uma vez, longos voos em direção ao melhor de nós.