A Cultura e a Arte de um povo revelam muito sobre suas características e seu momento histórico. Não poderia ser diferente com a música da década de 70, a era da Discoteca, de Travolta, do nascimento do Punk de Patti Smith e Sex Pistols e da experimentação de elementos da música erudita no Rock Progressivo de Pink Floyd. Já aqui no Brasil, era o auge da Tropicália, dos Doces Bárbaros e Novos Baianos, todos buscando a liberdade de expressão e a quebra de tabus que eram impostos pelo momento político de muita repressão, crises econômicas e conflitos armados que aconteciam em todo o globo.
No mundo, estava ocorrendo a crise do petróleo que levou vários países, como EUA e Reino Unido, à uma grande recessão, enquanto que outras economias, como Japão, Alemanha e União Soviética, começaram a prosperar. A Guerra Fria, o fim da Guerra do Vietnã, o início da guerra da União Soviética contra o Afeganistão, o “milagre brasileiro” no auge da ditadura militar no Brasil e o surgimento de diversas ditaduras inspiradas nesse modelo em toda a América Latina, montavam um cenário de excesso de segurança, conservadorismo e pouca liberdade mundo afora. A arte da época, portanto, especialmente a música, motivo deste artigo, era vista como uma válvula de escape para dizer e viver aquilo que lhes era negado – a liberdade, a quebra de tabus e a experimentação do novo.
O início da década então, viu o surgimento de muitos estilos musicais. No pop, no rock, nas experimentações como o jazz, o folk, o blues e rock psicodélico incluindo artistas como The Carpenters, James Taylor, Stevie Wonder, The Temptations. A incorporação de instrumentos de música erudita ao rock clássico, que já havia se iniciado dos anos 60, se consolidou no início dos anos 70, no que ficou conhecido como rock progressivo, onde os grandes destaques são Pink Floyd, John Lennon, Genesis, Yes.
Surgiu também o glam rock, movimento onde o chique e o glamour faziam parte do visual dos artistas através de grandes óculos, androginia, calças bocas de sino e botas plataforma. Artistas como David Bowie, Queen e principalmente Elton John foram os grandes expoentes desse estilo.
A aceleração e distorção do blues, deu origem ao hard rock, que também havia se iniciado nos anos 60, mas na década de 70, através de bandas como Led Zeppelin, Black Sabbath, Deep Purple, Kiss, Aerosmith e Rolling Stones, foi que se tornou bastante popular.
Na segunda metade da década de 70, um movimento nostálgico trouxe à tona um revival do estilo rockabilly dos anos 50. A série de TV Happy Days e o filme Grease, também simbolizam essa tendência cujo seu principal representante, de grande fama e repercussão mundial, Elvis Presley, morreu em 1977, no auge da carreira.
Foi a época também da disco music, onde tudo acabava nas pistas de dança e o verbo “travoltear” tornou-se internacionalmente conjugado, trazido pelo filme “Os Embalos de Sábado à Noite”, estrelado por John Travolta. Este fenômeno trouxe um novo balanço para a música pop, assim como gênios da música eletrônica, cujo maior expoente da época, a “rainha das discotecas”, foi Donna Summer.
O punk rock também foi um movimento de grande potência nesta década, que buscava revoltar-se contra o sistema, pregando a anarquia. Este reuniu artistas como Patti Smith,Television, New York Dolls, Sex Pistols, The Clash e The Ramones, principalmente na Inglaterra e nos Estados Unidos, voltando o rock à sua forma primitiva, vindo das garagens e dos porões.
Entre a disco music e o punk rock, surgiu o movimento new wave. Contrário ao punk, a nova onda celebrava o brilho do início da década. Algumas vezes a new wave chegou até a flertar com a disco music através da banda Blondie que trouxe o hit disco “Heart of Glass”.
Na música pop imperava o ritmo em detrimento das letras, importava mais o balanço, o que propiciou a aparição de dezenas de grupos e estrelas de sucesso fulminante, porém com um rápido desaparecimento. O efêmero e o descartável foram campeões em todas as paradas de sucesso, ganhando notoriedade somente nos seus 15 minutos de fama.
No pop, Michael Jackson lançou seus primeiros quatro álbuns em carreira solo e os Beatles, depois de 7 anos, se separaram, iniciando suas carreiras solos bem sucedidas.
No Brasil, estávamos vivendo a censura do regime militar e portanto, os movimentos musicais refletiram bastante este momento histórico. Destaque para os trabalhos de: O Terço, Rita Lee & Tutti Frutti e a banda baiana Doces bárbaros, idealizada por Maria Bethânia, Gilberto Gil, Gal Costa e Caetano Veloso. Não esquecendo do movimento dos Novos Baianos que marcou o movimento da contracultura.
Explorando outros universos da música brasileira, surgia uma nova geração influenciada pelos consagrados músicos dos festivais da década de 60, como Belchior, Gonzaguinha, Djavan e Ivan Lins.
A discoteca e o pop dançante, nas terras tupiniquins, serviram de base para uma geração de ídolos populares tidos como exuberantes e por vezes, até pornográficos, como Sidney Magal, Gretchen, entre outros. Já a música sertaneja e o samba viviam momentos de desgaste, sendo executados somente nas áreas rurais e nos subúrbios das grandes cidades.
Um grande sábio chinês, Confúcio, dizia que conhecemos um País pela música que lhes toca. Ele dizia: “A Música surge do coração humano. Quando são tocadas as emoções, estas se expressam em sons, e quando os sons tomam formas definidas, temos a Música. Desta maneira, a música de um país pacífico e próspero é tranquila e alegre, e o governo, ordenado; a música de um país agitado revela descontentamento e cólera; e a música de um país em decadência revela pena e nostalgia do passado, e o povo está angustiado. Assim, pois, vemos que a Música e o Governo estão diretamente vinculados entre si”.
Se Confúcio estava certo, o que podemos dizer sobre o Mundo da década de 70? E sobre o Brasil? De grande efervescência cultural, sem dúvida, tanto que suas expressões musicais até hoje são ovacionadas, executadas, tidas como de grande riqueza musical. Falavam em serem livres, da quebra daquilo que para eles não fazia sentido, da busca por algo novo que fosse melhor. Foi um período de guerras, conflitos armados, governos autoritários e censura. Assim como um faminto fala de comida, um pobre fala sobre abundância e um preso fala sobre liberdade, nessa década a juventude cantava em suas músicas a crítica aos governos, a “Paz e Amor”, o “Sexo, Drogas e Rock’n Roll”, o rompimento com os valores religiosos e tradicionais… E faziam isso acreditando que conseguiriam construir um mundo melhor.
E agora, quase 50 anos depois, será que nossa sociedade alcançou o que tanto cantava em suas canções? Conseguimos vencer os desafios daquela época? E a sociedade que aqueles jovens construíram, se tornou melhor do que a que eles criticavam?
As respostas para essas questões podem ser diferentes dependendo do ponto de vista de cada um, porém, esta é uma reflexão que serve para todos nós e para todas as gerações.