Vamos começar esse texto com o aviso que você mais quer ouvir: faremos todo o esforço possível para não compartilhar spoilers. Leia tranquilo… 😉.
Mulher-Maravilha 1984 é o segundo filme da icônica personagem da DC Comics. Lançado em 2020, o filme mostra a nova aventura da amazona, filha da rainha Hipólita e de Zeus, Rei dos Deuses do Olimpo. Criada na lendária cidade de Themyscira, a heroína passou a viver entre os homens. Nesse longa-metragem ela enfrentará dois novos vilões: a Mulher Leopardo e Max Lord.
O filme volta à maravilhosa década de 1980, em Nova York. Diana, a princesa amazona, vivia sua vida como uma super-heroína qualquer. Uma vida monótona e solitária de um lado e do outro, a prática de ações espetaculares na defesa da vida das pessoas. Em seu coração habitava a saudade do seu grande e único Amor, o piloto de aviões Steve Trevor. Pode ser que você (e talvez quase todo mundo) não lembre dele, que foi morto durante a segunda guerra mundial, enquanto a Diana salvava o mundo. Apesar de praticamente desconhecido por nós, ele continua a desempenhar um papel fundamental no coração da nossa princesa.
Diana é uma princesa que nos leva a reflexões: se por um lado sua personagem reforça o estereótipo hipersexualizado e bem sucedido, o que afasta as meninas normais do reconhecimento de suas próprias qualidades, por outro, a mulher-maravilha foge da velha história da mocinha abandonada resgatada por um homem poderoso. Outro ponto de destaque é que esse é o primeiro filme de super personagens protagonizado por uma mulher desde (vejam que ironia) Supergirl em 1984. Um filme protagonizado por uma mulher (Gal Gadot), dirigido e escrito por uma mulher (Patty Jenkins) e tendo como vilã principal uma mulher (Kristen Wiig).
De tantas lições que podemos ver no filme, há uma que queremos destacar. No longa, todos os personagens são obrigados a fazer escolhas. Escolhas difíceis, vale ressaltar. Aliás, escolher é muitas vezes difícil, não é? Porque envolve abandonar algo para ter outra coisa. Quem nunca sofreu a ansiedade de ter que decidir por um caminho? Quem nunca passou horas com azia no estômago só na angústia de não saber se fez a melhor escolha?
Isso nos leva a questionar sobre o que torna nossas escolhas tão difíceis? Será que é a incerteza? O fato de não sabermos o que acontece no próximo capítulo? Muita gente irá concordar com isso, mas vamos observar mais um pouco? Imagine que você tenha que escolher entre uvas e maçãs no café da manhã. Para a maioria das pessoas, essa não será uma escolha muito difícil. Se você não detestar nenhuma das opções, provavelmente responderá com “tanto faz”. E se a escolha fosse entre seu filho e o filho de um desconhecido? Mesmo que seja um pouco constrangedor para alguns, a maioria deve optar pelo seu próprio filho. E se te pedissem para escolher um entre dois de seus filhos? Pronto! Está inaugurada a temporada de angústia. Por que a dificuldade de escolha foi aumentando? O que mudou entre uma e outra? Será que a dificuldade vem das opções entre as quais você tem que escolher?
Sim, um filho é muito diferente de uma fruta, entretanto, a verdadeira mudança está no grau de apego que você tem por cada uma das opções. Em condições normais você amará mais seu filho do que uma maçã. Aqui temos uma bela lição, que o Buda Sidharta Gautama nos ensinou: o sofrimento é filho do apego.
No filme da Mulher-Maravilha, os personagens que mais sofrem são os que estão mais apegados. Mas, é realmente possível viver sem apego? E o apego, afinal, é uma fragilidade Humana? Essa é uma discussão de uma vida inteira. Se você perguntar ao Buda da Compaixão ele te ensinaria que sim. Só alcança o Nirvana, a iluminação, aquele que se livra totalmente do apego. Mas, talvez para nós seja muito difícil nesse momento desapegar totalmente. Assim, o filme parece querer nos mostrar um ponto de partida, já que nesse momento o Ser Humano não consegue se livrar do apego a algo. Um ponto que pode usar o apego como um obstáculo ou como um trampolim para voos mais altos, dependendo do que você se apega. Alguns apegos podem nos levar a comportamentos egoístas, e outros podem nos impulsionar para sermos melhores. Uma pessoa muito apegada a seu carro, por exemplo, pode se tornar excessivamente protetora e negar uma carona a uma mulher em trabalho de parto, só para não sujá-lo. Por outro lado, alguns “apegos” podem nos impulsionar a nos comportarmos com mais Humanidade. Você deve conhecer exemplos de mães, que foram capazes de realizar coisas incríveis por Amor a seus filhos. E isso nos leva de volta ao filme. Ok, não é exatamente a liberdade plena, livre de apegos, com a qual podemos sonhar desde que Sidarta Gautama venceu suas provas nessa Terra, porque isso ainda está muito distante de nós. Mas, pode ser um bom começo. Se tivermos que nos apegar, que seja aos grandes Ideais! Aqueles pelos quais poderemos vencer nossos interesses pessoais e egoístas e agir com a melhor versão de nós mesmos.
Ao ver o filme preste atenção num ponto: a que os personagens estão apegados e como isso os leva a se comportarem? Você verá que aqueles que estão apegados às coisas da vida material se comportam como vilões, causando desequilíbrio, violência e sofrimento. Do mesmo modo, os personagens que se apegam à fama, aceitação social, bajulação, dinheiro, poder e todas as coisas que fazem do mundo um lugar pior são os que mais sofrem para fazer escolhas, principalmente as escolhas que realmente são importantes. Porque todos nós queremos um lugar melhor, mas ainda não entendemos que isso só se conquista com algum grau de sacrifício dos desejos pessoais. E isso o filme nos ensina claramente.
O nosso mundo não será salvo pela força da Mulher-Maravilha. Enquanto nossos desejos forem egoístas e nossas vidas forem guiadas por esses desejos, pularemos de guerra em guerra. Até quando vamos viver assim? Temos que aprender com os verdadeiros Heróis. Aqueles que são capazes de abrir mão de suas vontades por um Bem Maior. Esses sim salvarão o mundo! Isso não quer dizer que a escolha seja fácil, pois se fosse qualquer um poderia fazer. Mas, quando escolhemos o caminho da Nobreza, algo dentro de nós sente aquela paz que excede a todo entendimento. Ainda que nos faça sentir dor, encaramos esse sofrimento de cabeça erguida, em plena redenção. Essa talvez seja a principal escolha da Humanidade. A escolha que poderá nos deixar, como diz a canção, a dois passos do paraíso.