Quando nos debruçamos sobre uma civilização diferente da nossa, é importante termos um olhar desprendido de preconceitos. Devemos buscar a essência da mensagem que é transmitida nos seus símbolos para realmente compreendermos sua visão de mundo. Exposto isso, o Deus Hindu da Sabedoria, Ganesha, nos ensina muito sobre como aquele povo viveu essa busca por respostas à trajetória Humana.
Ganesha, ou mesmo a figura do elefante, aparecem em vários mitos importantes do povo que originou a atual Índia. No nascimento de Buda, por exemplo, é Ganesha que anuncia a reencarnação de um ser com grande consciência. Já no clássico Bhagavad Gita, os kuravas e os pandavas lutam para conquistar a cidade dos elefantes, Hastinapura. Em diversas histórias Hindus conta-se também sobre sábios que, ao morrerem, reencarnaram em elefantes. Todos estes exemplos denotam a importância desse símbolo para os Hindus.
Dizem que os sábios são capazes de aprender tudo somente contemplando a Natureza, porque, como diz Jung, toda ela é simbólica. A Natureza nos diz algo profundo, nos ensina sobre a Arte de Viver. Então, nos faz importante entender o simbolismo do elefante para por fim aprender com esse povo que deixou uma pegada enorme na história da Humanidade.
O elefante é um animal gigante, porém manso com os membros de seu bando e impetuoso com aqueles que, porventura, tentarem trazer o mal. Essa característica de ser Bondoso e, ao mesmo tempo, firme, mostra uma capacidade de discernimento própria dos Sábios. O elefante também possui uma boca muito pequena, que demonstra prudência com o que diz aos demais; olhos pequenos que convocam o olhar mais para dentro de si do que para fora e orelhas enormes para estar atento ao que acontece no mundo. Dessa forma, o elefante nos demonstra a postura do Sábio, com muita Vida Interior, mas nunca alheio às circunstâncias externas.
Dentro da mitologia Hindu, Ganesha, junto com Vishnu, Shiva e Brahma são alguns dos Deuses mais importantes daquele povo. Ganesha, segundo os mitos, é filho do Deus Shiva e da Deusa Parvati. Em uma das versões do mito, a cabeça de elefante lhe foi dada por sua mãe, depois que Shiva, numa disputa com o filho, cortou a sua cabeça de nascença. De forma simbólica, percebemos, então, que Ganesha simboliza a Sabedoria, relacionada à capacidade de discernir e mover-se conforme a necessidade. O elefante, como já apontamos, tem duas grandes orelhas e olhos pequeno. Dessa maneira, escuta mais do que vê e assim define sua ação, não conectando-se pelo externo, representado pela visão, mas pelo discernimento do ouvir. Além disso, sua barriga é um símbolo de que o Deus engoliu todos os conhecimentos do Universo e digeriu-os. Um sábio, da mesma maneira, deve integrar em si o conhecimento e discerni-lo, ou seja, fazer sua digestão, ficando com os conhecimentos que lhe são úteis.
Suas presas, para além do marfim dos elefantes, representam a dualidade, os opostos que se expressam no mundo. É comum em nossos aprendizados compreendermos a vida por um jogo de opostos: bem e mal, claro e escuro, alto e baixo, esquerda e direita. Essas dualidades nos ajudam a discernir, em síntese, o caminho que devemos trilhar. De igual modo, o sábio tem como atributo saber escolher os melhores caminhos a seguir. Ainda sobre o simbolismo das presas, uma delas está quebrada, enquanto a outra mantém-se intacta. Esse é o símbolo do sacrifício, do que precisamos ofertar para conhecermos a Sabedoria. Num primeiro momento, esse símbolo pode nos parecer incomum, mas, ao analisarmos outros Deuses que ligam-se à ideia da Sabedoria, podemos notar que esses também fizeram sacrifícios como condição para conhecer os Mistérios.
Osíris, um dos Deuses do panteão egípcio, por exemplo, sacrificou uma perna para poder continuar sua jornada de Sabedoria. Odin, o principal Deus da mitologia Nórdica, ofertou um dos seus olhos para obter o conhecimento de todo o Universo. Portanto, podemos compreender que a Sabedoria exige, acima de tudo, um esforço e, muitas vezes, um sacrifício de algo nosso para chegar a esse estado. Não precisamos, entretanto, cortar nossas pernas ou ficarmos cegos, mas sim sacrificar nosso egoísmo, nossas vaidades e orgulhos. Desse modo, para trilharmos com Humildade e Discernimento o caminho que nos leva ao verdadeiro Conhecimento, é essencial desprender-nos das correntes que nos ligam à ignorância.
Ganesha também possui diversos outros elementos simbólicos como, por exemplo, os 4 braços que carregam algum elemento que simboliza a personalidade em Harmonia com o seu Ser – corpo físico, energia, emoções e pensamentos. Além disso, ele está sentado em cima de um rato, que representa a mente dispersa. Se imaginarmos um rato e sua forma de movimentar-se, ligeira e aparentemente desordenada, lembraremos dos nossos pensamentos em alguns momentos do dia, rápidos e, algumas vezes, desconectados da realidade. A mente é um atributo poderoso que o Ser Humano possui e que, muitas vezes, não a usa corretamente. Por isso que Ganesha, a Sabedoria, está sobre essa mente dispersa, para poder conduzi-la da melhor maneira. Visto isso, podemos entender que, em outra chave simbólica, o Deus da Sabedoria guarda uma forte relação com o Ser Humano que, através da adversidade, alcançou a Sabedoria, passou a ter a cabeça de elefante, porém mantendo o seu corpo de Humano.
Portanto, ao olharmos para esse Deus Hindu, que, para a grande maioria de nós não tem o menor sentido, é importante refletirmos que seus atributos e símbolos não são fruto de uma imaginação, mas sintetizam ideias atemporais. Quando nos colocamos diante desses símbolos tão profundos e buscamos compreendê-los em sua plenitude, podemos, com consciência, adentrar nos seus Mistérios e assim vivenciá-los em nosso cotidiano. Ganesha nos ensina sobre um caminho que todos nós devemos trilhar. Através da adversidade somos capazes de conquistar a nós mesmos, encontrar respostas para a Vida e alcançar o nível de realização Humana que todos nós tanto almejamos.