Se você abriu o TikTok hoje, provavelmente viu alguém falando de #Coquette ou postando looks “fofos e românticos” com maquiagem suave, acessórios delicados ou estilos inspirados em contos e bonecas. Mas o que exatamente é essa onda que parece estar em todo lugar nas redes sociais? Por que tantos jovens estão se apropriando dessa estética, dessa linguagem visual e assumindo a “vibe coquette”? Ao mesmo tempo, por que está tão em alta falar de feminilidade e aceitação de padrões que, até algumas décadas atrás, parecia algo destinado ao esquecimento?

É hora de entender o que está acontecendo, e para isso vamos mergulhar nesse movimento que está na moda. Precisamos entender como surgiu, o que significa “coquette” nos dias de hoje, o que isso tem a ver com feminilidade (e até mesmo repensar essa palavra) e como ideias e tendências navegam em ciclos até ressurgir em outros momentos. Também vamos olhar criticamente: o que há de encantador nessa estética, quais são os riscos e como evitar as modas sem deixar de ser você mesmo.
De onde vem a “febre” #Coquette?
Antes de tudo: vivemos na era em que tendências se formam e se desfazem em questão de dias. No TikTok, em especial, um estilo visual pode explodir com uma música, uma transição de vídeo ou uma trend de maquiagem, um desafio lançado por algum influencer que caia nas graças do povo. Todo dia temos uma moda nova, um movimento novo, uma trend a seguir. Cansamos só de pensar no quão difícil é acompanhar esse ritmo acelerado das redes.
Assim, se alguém posta um look “coquette-inspired”, alguém faz dueto ou remix, outras pessoas passam a replicar e pronto: uma nova macrotendência nasce. E com ela vem todo o combo que as redes sociais adoram: combinações visuais, hashtags, efeitos visuais e sons virais para serem repetidos por milhares em pouco tempo.
O Instagram, em especial os reels, e o Pinterest também ajudam a solidificar essa estética como “aspiracional”. Quando somos bombardeados por diferentes looks, moodboards, feeds inspiradores, ideias de composição de roupas, estilos de cabelo, paletas de cores, uma hora tudo isso acaba entrando em nosso imaginário coletivo. De tanto sermos expostos, absorvemos e introjetamos algumas dessas formas de pensar, sentir e agir. É assim que as modas – que no começo parecem algo inofensivo e até mesmo rechaçado por algumas pessoas – acabam sendo aceitas e adotadas com o tempo.
Sejamos sinceros: quem nunca chegou rolando o feed e pensou: “Nossa, que vibe linda, eu bem que poderia me vestir assim.” Nas comunidades de estética no TikTok e Instagram, cada pessoa adapta para si as tendências da moda. Troca-se a cor das roupas, investe-se em novos acessórios, delineado e efeito de luz e pronto: estamos dentro da mais nova tendência.
Além da forte massificação desse processo que nos leva, inconscientemente na maioria das vezes, a adotar tais trends, o algoritmo também dá uma grande força para nos manter atentos às novidades: se você curtiu, por exemplo, algumas postagens de looks delicados, maquiagem suave, vestidos românticos, o algoritmo vai te empurrar mais conteúdos parecidos. Assim, você se “afunda” nessa estética e ela vai ganhando espaço na sua visualidade.
Para muitos jovens, vestir-se, maquiar-se, criar um “mood visual” não é só uma escolha estética, mas uma forma de comunicação e identidade. É importante ressaltar que isso sempre foi assim. É só olhar para o passado e ver como cada geração teve sua própria tendência de moda; porém, como não existiam redes sociais, muitas vezes esses grupos ficavam restritos. Os mais velhos devem lembrar, por exemplo, do choque que foi a cultura emo nos anos 2000. Socialmente chocantes, eles ganharam seu espaço e influenciaram a juventude da época. A diferença é que ainda não era tão massificada a experiência das redes sociais, logo, sua influência era menor e restrita a um nicho.
Hoje, graças ao excesso de estímulos online e a conexão eterna na qual vivemos, há uma busca por algo que mostre ao mundo quem somos. Desejamos um visual que comunique claramente nossos valores e deixe isso evidente para quem quiser olhar. Assim, as diferentes modas estéticas, que nos dão opções de não apenas como se vestir, mas também de entender quais ideias passamos ao assumir aquele look, ganharam grande força no mundo atual e ditam o ritmo das trends nas redes. Além da coquette, por exemplo, podemos citar o estilo dark, academia, cottagecore, e-girl etc. Todos eles oferecem mapas visuais prontos, identidades compartilhadas para quem entra ali.
Para os mais velhos, que viveram em um mundo que não existia redes sociais, esse pode parecer um fenômeno estranho. Porém, para os que já cresceram imersos na cultura dos memes, convivendo diariamente com tendências passageiras, mashups, e loucos para assistir o próximo vídeo viral, a fluidez estética se torna natural e, de certo modo, até esperado. Num mundo em que tudo muda todos os dias, por que prender-se a um único estilo quando, na verdade, pode-se ter todos? Assim, você entra em um mood, testa por uns meses, depois muda.
Nada é fixo. Muitas jovens experimentam o #Coquette, por exemplo, como um canal de expressão, através do qual podem se sentir bonitas, delicadas, ou simplesmente diferentes do que estavam fazendo antes.

Influencers e usuários comuns com bons vídeos são os motores dessas tendências. Uma criadora coloca uma tendência de maquiagem suave, laços de cabelo e música doce, por exemplo, e pode atingir milhões de pessoas com um único vídeo, viralizando. Outras pessoas começam a fazer os reacts do vídeo, criam remix e, ao seu modo, outros imitam o vídeo para também ganhar esse alcance. Assim, em diferentes vertentes e direções essa tendência acaba ganhando território e adentrando as diferentes bolhas sociais.
Com esse grau de visibilidade, as marcas aproveitam o momento e lançam propagandas e produtos que remetem a essa tendência. Isso é reforçado tanto nas redes sociais como também no mundo da moda, por exemplo. Assim, o look montado dentro das redes sociais chega a aparecer em desfiles e se torna uma fast fashion, com seus acessórios sendo produzidos em massa.
Para tornar ainda mais popular tais produtos, os criadores, que até então só faziam vídeos, passam a monetizar esse conteúdo vendendo produtos, fazendo propaganda e dando consultoria. Assim é o ciclo econômico das modas, que fazem girar um mercado milionário bem na frente dos nossos olhos. Esse ciclo de nascimentos e renovações é algo que vamos explorar mais adiante.
O que é coquette?
Agora que já entendemos como as tendências funcionam nas redes sociais, vamos refletir sobre uma em específico, que tinha colocado em pauta um aspecto polêmico até algum tempo atrás. Estamos falando da moda coquette, mas o que isso significa? Vamos começar pelo básico: a palavra “coquette” vem do francês “coquet/coquette”, que significa “algo elegante, gracioso, galante, vinculado ao charme leve”. Historicamente, “coquete” evocava a ideia de sedução sutil, flerte, ou seja, alguém capaz de atrair olhares com gentileza, que é delicado(a) e conquista os demais de forma sutil, sem grandes impactos ou apelos na sua aparência. Ao longo do tempo, o termo teve tons de “muito vaidoso” ou “superficial”, mas também de elegância delicada.

No contexto atual, o termo “coquette” foi reapropriado como um tipo de estética visual e simbólica, que não está necessariamente centrada no “seduzir”, mas no “ser bonita de um jeito suave, doce, delicado”, muitas vezes por si mesma. É, a rigor, um grande contraste com o pensamento do mundo feminino, que, por vezes, cai no apelo sexual e nas roupas provocantes. Nesse aspecto, o “coquette” nada mais seria do que um retorno a um estilo mais sóbrio, mas não por subserviência ou obrigatoriedade, mas por uma decisão da própria mulher.
Portanto, o coquette que vemos no TikTok e no Instagram não é a cópia exata da definição clássica; mas ele mistura referências de vários momentos, mas com a ideia de criar um look meigo e, dentro de um padrão clássico, feminino. Assim usam-se bonecas, roupas vitorianas leves, laços, babados, rendas suaves, paleta de cores claras – como o rosa apagado, o creme e diferentes tons pastéis –, acessórios delicados como tiaras, fitas e pérolas e maquiagem seguindo essa mesma lógica. Curiosamente, apesar do estilo clássico, não se deixa faltar um toque de modernidade ao usar filtros de luz rosada, edições leves, transições de vídeo suaves, músicas doces que servem de trilha sonora para os looks.
Além disso, o coquette se cruza com outras estéticas, como o “cottagecore”, que segue a mesma tendência, porém, usando como grande referência o clima romântico campestre, o “soft girl”, que usa cores claras e em geral tem como tônica um visual mais suave, o “fairy kei”, que é inspirado na cultura oriental e tem como base o uso do colorido e a postura alegre. Além disso, há outros diversos estilos que também dialogam com o coquette, mas que ressaltam uma mesma ideia: a busca pelo aspecto suave e delicado, sem precisar demonstrar força e autossuficiência.
Para demarcar bem esse estilo, é comum ver vídeos de “look transitions”, que simplesmente mostram a transição do estilo comum, ou seja, das roupas do dia a dia que todos nós usamos, para a mudança do estilo. Tudo isso acompanhado de uma trilha sonora suave que demarca sonoramente a diferença entre uma estética comum e o coquette. Outra forma de apresentar esses vídeos são os “diários estéticos”, que mostram o “mood” (humor, em inglês) do dia com música, imagens e frases sentimentais. Esse combo – composto por visualidade, áudio e gesto – reforça o estilo e tem influenciado profundamente os jovens.
Feminilidade no século XXI: repensando o conceito
Frente a essa tendência, a de (re)criar um tipo de feminilidade específica, muito voltada ao clássico e em contraste com uma tendência até então mundial para as mulheres, é importante refletir sobre o que é de fato esse conceito e como ele vem se modificando ao longo do tempo, adaptando-se a cada geração. Tradicionalmente,a ideia de “feminilidade” foi moldada por códigos extremamente rígidos: mulher era quem cuidava do lar, era recatada, delicada, submissa etc. Enquanto ao homem cabia o papel de “provedor” e detentor dos grandes espaços, principalmente públicos, as mulheres eram as donas dos pequenos espaços, que deveriam cuidar da família e educar os filhos.
Essa diferenciação, apesar de parecer estar em um passado distante, não está tão longe assim. Por exemplo, basta lembrar que até 1930, no Brasil, nenhuma mulher podia exercer o direito ao voto, sendo assim, politicamente falando, uma cidadã de segunda classe quando comparada aos homens. O que mudou essa perspectiva foram os diferentes movimentos feministas que, ao longo do século XX, ajudaram a construir direitos para as mulheres.

Assim, elas conseguiram sair do lar e ganharam o mercado de trabalho, abriram espaço na política, reivindicaram seus corpos, direitos e vozes. A feminilidade, nesse sentido, deixou de ser um molde fixo e passou a coexistir com outras ideias sobre a mulher. Se antes a “mulher ideal” era submissa e detentora do lar, agora o grande ideal feminino era a autonomia, a força e a capacidade de escolher o que deseja ser.
No século XXI, como reflexo dessa abertura, a feminilidade se torna algo plural: nem só “ser delicada”, nem só “ser forte”, agora as pessoas passam a costurar suas próprias noções, mesclar traços “tradicionais” com rebeldes e criam, de diferentes maneiras, um caleidoscópio de visões sobre o que é ser feminina. Hoje, alguém pode gostar de uma estética suave (como o coquette) e ser uma ativista, líder, ou ter uma atitude que foge do convencional.
Dito isso, é fundamental entendermos que não existe uma única feminilidade, pois não existe apenas uma maneira de se expressar enquanto mulher. Há tantas maneiras de ser feminina quantas são as pessoas. Mulheres podem escolher usar roupas mais fortes, maquiagem pesada, cabelos curtos, roupas esportivas e ainda assim serem “femininas”. Em síntese, as normas sociais não podem ditar algo tão amplo e íntimo, pois, apesar das diferentes formas, busca-se expressar uma ideia de feminilidade.
Portanto, aderir ao coquette não é “ter que ser” feminina no sentido tradicional, mas sim adotar um visual, uma identidade estética que comunica ideias que, se isso fizer sentido pra você, então não há o porquê de não serem feitas. Se não fizer, está tudo bem também. A beleza da vida está em poder escolher.
É importante deixarmos isso claro, pois, no mundo atual, ainda há quem olhe para “feminilidade” com uma certa “suspeita”, enxergando-a como um tipo de forma imposta ou mesmo uma construção para retorno do domínio patriarcal como nos moldes anteriores. O que se observa, a bem da verdade, é o verdadeiro empoderamento feminino, no qual pode escolher o que, de fato, deseja, sem cair para nenhum dos lados, que, ao seu modo, criam suas tendências. Ao escolher vestir-se de forma “feminina”, segundo seus próprios critérios, sem coagir-se à perfeição, você reivindica sua estética. A feminilidade, nesse aspecto, pode ser um canal de poder interno: sentir-se bem com seu corpo, sua expressão visual, escolher e descartar elementos conforme sua vontade.
Então, a estética coquette pode ser vista como uma ferramenta e não uma prisão. Como tendência, se soubermos observar seu aspecto positivo, poderemos aproveitar e reavivar um lado nosso que talvez esteja adormecido ou mesmo silenciado. Assim, se cultivar esse estilo te fortalece, te diverte, te incentiva a cuidar de você (fora de padrões impossíveis), ótimo. Entretanto, se você sente-se obrigada a seguir tal tendência apenas pelo fato de estar na moda, então recomendamos a reflexão sobre o que de fato te faz sentir autêntica.
O apelo do #Coquette para adolescentes e jovens
Frente a essa perspectiva, podemos refletir sobre como esse novo estilo, que no fundo reavivou algo quase “esquecido”, influencia as novas gerações. Para muitos jovens, a “fofura” deixou de ser algo infantil, que durante nossa infância era cultivada como uma grande virtude e que, até então, era substituída pela seriedade da vida adulta.
Por que não podemos continuar dessa maneira ao longo da vida, visto ser uma virtude e qualidade tão estimada? Assim, esse aspecto delicado, que para muitos era inconcebível na maturidade, passou a ser uma forma de se vestir e portar. Quando você usa a hashtag #Coquette e posta algo com essa estética, outras pessoas podem ver, comentar “que lindo, achei parecido com o que penso”, “já vi algo parecido”, “me inspiro em você”. Essa rede de feedback gera o sentimento de pertencimento e assim nasce uma nova “tribo” social, que nada mais é do que uma forma de reunir pessoas que compartilham de gostos e perspectivas de vida similares.

Essa sensação de comunidade é importante em todas as fases de nossa vida, porém, na juventude, ela se reflete quase como uma necessidade de sobrevivência. É o momento em que buscamos nos afirmar e demarcar nosso espaço no mundo. Assim, viver um estilo de vida é primordial e, para isso, estar com pessoas que “entendem” seus gostos é válido, não somente para pertencer, mas também para criar vínculos. Nesse aspecto, o coquette se diferencia por essa ênfase na delicadeza, romantismo suave, mas muitas pessoas transitam entre essas estéticas, pegam um elemento daqui, outro dali.
Entretanto, como qualquer estética visual que viraliza, existe sempre o risco de reforçar padrões: “ser coquette perfeito” pode virar ideal inatingível, uma vez que para isso seria preciso a pele impecável, o rosto simétrico, corpo magro, visual sempre bonitinho. Infelizmente, como vivemos em um mundo de aparências, cair na busca por um modelo ideal, ao qual jamais chegaremos, pode gerar inseguranças e a percepção de que nunca somos suficientes, o que naturalmente nos leva a frustrações. Portanto, é importante lembrar que editor de imagem, filtros e edições fazem milagres, e nem sempre aquilo que você vê é natural. A beleza real é diversa, com marcas, variações, imperfeições.
Por fim, é importante ressaltar que, para alguns, coquette pode ser apenas mais um “modismo visual”, ou seja, algo superficial, sem conteúdo, vazio. Entretanto, isso não é necessariamente algo real. Apesar de muitas vezes encararmos as modas e as novas tendências como apenas desejos superficiais, também é fato que há aqueles que usam a estética para transmitir ideias e, nesse caso, muitas vezes a mensagem por trás do coquette é apresentar uma forma de feminilidade que existe e pode ser valorizada sem cair no medo ou preconceito dos tempos passados.
Portanto, a ascensão da estética #Coquette entre jovens é mais do que uma moda visual: é um sintoma de como as novas gerações imaginam a sua identidade, a feminilidade e buscam expressá-los das maneiras mais diversas possíveis. A moda coquette nos lembra que é possível ser delicado, suave e romântico, sem se anular, e que a estética pode ser ferramenta de autoafirmação.
Que você possa se permitir experimentar esse e demais estilos sem culpa e sem rigidez, pois é através dessa busca de encontrar a si mesmo que podemos (re)descobrir o que é real ou ilusório. A isso chamamos autenticidade, e só poderemos alcançá-la se realmente tentarmos, para além das modas, enxergar o valor humano em cada um desses aspectos.
Quer continuar refletindo sobre padrões e identidade? Leia também: Beleza natural: o que nos torna únicos — um convite para enxergar a beleza que existe na autenticidade.




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