Ter esperança, ou se desesperar? Essa tem sido a luta de muitos de nós hoje em dia. Dentro de cada um, parece que lutam duas forças incessantemente. Uma que puxa para baixo, que nos tira o sentido de viver, que nos faz perder o gosto pela vida. Outra que nos puxa para cima, que nos mostra a Beleza possível em todos os acontecimentos, a surpresa escondida em cada encontro. Essa luta só aumenta com o passar dos tempos e com a proximidade daquela a quem o poeta Manuel Bandeira chamou de “ a indesejada das gentes”, a morte.
Para Henry Cole (Patrick Stewart) ela vai se aproximando violentamente, com a partida de sua esposa, em condições terríveis. Ele é um pianista consagrado no seu trabalho, a que dedicou toda a sua vida. A jornalista Helen Morrison (Katie Holmes), amante da música clássica, se aproxima dele em busca de uma entrevista exclusiva. Com muita sensibilidade e ternura, ela consegue captar e entender os sentimentos de um homem maduro e solitário, que sofre por ter perdido a sua esposa e tenta verdadeiramente ajudá-lo. Eles ainda contam com Paul (Giordano Esposito) que além de agente de Henry é também um fiel amigo e tenta ajudá-lo com Honestidade e Presteza. O filme é uma produção canadense do diretor Claude Lalonde e além de contar a emocionante história de Henry, também nos oferece uma belíssima fotografia e uma trilha sonora espetacular.
Mesmo com toda a sua experiência como músico, a fama e o reconhecimento internacional da sua Arte, o sentimento de perda e a solidão fazem com que ele sofra com constantes crises de ansiedade que afetam diretamente as suas performances profissionais, em sua tentativa de voltar aos palcos, após alguns anos de afastamento. Sem falar no sofrimento que internamente o destrói aos poucos.
Henry Cole como muitos de nós, se encontra em um momento de muitas dúvidas e questionamentos. A proximidade com a morte, o leva a reflexões profundas em paisagens belíssimas e referências insinuadas como a que foi feita a Nietzsche, na Pedra de Zaratustra, na Suíça. Os três atos do filme nos remetem à fragilidade da vida e ao sentido do tempo que passamos nessa existência. Nos levam também a uma profunda reflexão, talvez melhor expressa nas palavras do filósofo romano Sêneca: “Solidão não é estar só, é estar vazio”.
Em pouco tempo a vida do músico vai se esvaziando e é o encontro inesperado com Helen, que lhe preenche novamente. Ele reencontra na música o apoio emocional para se manter vivo, apesar das dificuldades que tem tido com ela e descobre que nunca perdeu a capacidade de Amar.
Coda, é o título original do filme e se refere ao movimento final de uma obra musical clássica. Nesse movimento, alguns compositores retomam temas da obra para o fim. É o que faz o personagem do filme que indicamos aqui. Ele volta aos acontecimentos de sua vida para a sua última nota. Que possamos todos fazer uma reflexão sobre o que é o envelhecer e entendermos que com o tempo, as coisas que precisamos vão naturalmente se tornando cada vez menores e mais simples. Pequenas atitudes de carinho e atenção valem muito mais do que a aclamação com a qual Henry esteve acostumado por toda a sua vida, e elas podem realmente nos fortalecer e nos ajudar a nos sentirmos vivos e amados.
A velhice vista assim é uma espécie de liberdade. Já não nos aprisiona a necessidade de reconhecimento alheio, ou o desejo de possuir um belo corpo, ou mesmo a correria desenfreada por conquistar os bens materiais que nos “garantirão” uma velhice tranquila. Estamos livres para experimentar o momento presente, sem preocupações exageradas com o futuro. Para aproveitar a delícia da companhia de um ouvinte atento e generoso. Para sentir o prazer de uma pequena gentileza. Para perceber a Beleza simples do vento acariciando a relva no campo. Talvez isso nos ajude a entender o que Sêneca quis dizer na expressão:
“Quando a velhice chegar, aceita-a, ama-a. Ela é abundante em prazeres se souberes amá-la. Os anos que vão gradualmente declinando estão entre os mais doces da vida de um homem. Mesmo quando tenhas alcançado o limite extremo dos anos, estes ainda reservam prazeres.”
E se esse filme pode nos levar a reflexões como estas, por que não podemos ser livres agora mesmo? Por que esperar o tempo chegar perto do fim de sua carreira sobre nossos corpos para aproveitarmos esses momentos? Vamos estar presentes com o melhor de nós mesmos aqui e agora. É necessário agir, tomar as rédeas desse cavalo chamado tempo e conduzi-lo até o alto das montanhas. Isso quer dizer, buscar o mais elevado dentro de nós, pois desse ponto temos uma visão mais clara da vida, assim como do alto dos montes, se vê melhor a planície.
E como fazer isto? Cada um precisa encontrar o seu jeito. Tocando piano, cozinhando, transportando trabalhadores, construindo lares. Não existe uma fórmula única para uma Humanidade tão diversa. Mas, tem algo que nos une: não importa como, tudo que é feito com Generosidade, Dedicação e Amor ao próximo traz Felicidade a quem oferta e a quem recebe.
A vida assim pode ser como executar uma música de Chopin, Beethoven, Schumann: experimentaremos um pouco da inspiração e da paz daquele que a compôs.
Bom filme e boas reflexões para todos.