De onde viemos? Os diferentes caminhos que explicam a origem Humana

Há uma frase dita num filme de comédia dos anos 2000 que fala o seguinte: não podemos saber para onde vamos sem antes conhecer de onde viemos. Apesar do seu contexto, a sentença por si só nos revela uma ideia interessante sobre o nosso passado e o seu papel para construirmos um futuro. 

Partindo disso, será que já paramos para pensar qual a nossa origem? Possivelmente alguns poderiam responder que a nossa origem está nos nossos pais, afinal, eles que nos conceberam. Já outros iriam além e diriam que a nossa origem está, na verdade, em nossa concepção enquanto nação, ou seja, parte de uma coletividade. Porém, podemos desconfiar de uma origem ainda mais ampla e significativa, que possa englobar todos: afinal, de onde o Ser Humano veio? Como surgimos?

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Primeiramente, devemos esclarecer que não pretendemos afirmar uma origem precisa do Ser Humano. Afinal, desde que existimos, procuramos essa resposta e não queremos limitar nossa visão acerca desse assunto, nos fechando em apenas uma explicação. Dito isso, é inegável que hoje consideramos a teoria da evolução como a explicação que sustenta-se com mais evidências. Porém, como será que as antigas civilizações respondiam à essa questão existencial?

Para sabermos sobre isso devemos retornar aos mitos de criação, que representam uma percepção de como o Universo e o Ser Humano foram criados. Como o nome já diz, os mitos de criação não estão pautados em uma explicação racional, eles buscam apresentar ideias e percepções acerca do que compõe a nossa espécie. Contudo, nosso objetivo é apenas apresentar esses mitos, pois uma análise profunda deles não seria possível em poucas linhas. Visto isso, devemos dar atenção em observá-los sob a ótica simbólica, reconhecendo que ali estão expressas alegorias e não a história propriamente dita, no sentido literal da palavra. Além disso, uma análise mais profunda dessas histórias nos ajudam a compreender o contexto histórico e cultural em que esses homens e mulheres do passado estavam vivendo, suas angústias e sínteses sobre a Vida.

Dito isso, comecemos pelo Mito de Criação Cristão. Conta-se que Deus, após criar todo o Universo, decidiu fazer um ser à sua imagem e semelhança. Para isso, o moldou a partir do barro, porém, apesar de fisicamente perfeito, o molde não passava de uma casca vazia, sem Vida. A Divindade então teria soprado seu ar no boneco de barro, que assim ganharia Vida e tornaria-se o primeiro Ser Humano: Adão. Logo em seguida, Deus teria feito as plantas e animais, estes com o objetivo de servirem para a sobrevivência da sua recente criação.

Já nas antigas culturas pré-colombianas, mais precisamente a civilização Maia, os Deuses tentaram criar os Humanos diversas vezes. Na primeira tentativa o fizeram de lama, e por isso seu corpo não ficava em pé, se desfazendo rapidamente. Em seguida o construíram com madeira, e mesmo ficando em pé ele não tinha Alma, logo, era um objeto inanimado. Por fim, o fizeram de milho, e assim ele obteve Vida e passou a cultuar os Deuses.

Outro mito bastante conhecido acerca da origem do Ser Humano é o da Mitologia Grega. Na visão dos gregos, após Zeus derrotar Cronos e passar a reinar sobre o Universo, ele pediu ajuda a outras Divindades para terminar a criação do mundo. Para isso, o Deus dos Deuses pediu aos titãs Prometeu e Epimeteu que distribuíssem talentos e habilidades únicas para todas as espécies da Terra. Entretanto, ao fazerem de maneira desordenada essa partilha, o Ser Humano foi a única espécie que não ficou com nenhuma característica que o distinguisse dos demais. Se apiedando do Ser Humano, Prometeu vai até o Monte Olimpo, a morada dos Deuses, rouba o Fogo Sagrado e o leva para entregar aos Homens. Zeus, ao descobrir o furto realizado pelo titã, condena-o a ficar eternamente preso a uma rocha e a ter uma águia comendo seu fígado. Apesar do castigo, graças a Prometeu o Homem conseguiu o Fogo, que simboliza sua mente e, desse modo, constitui uma ligação com o Divino.

Há diversos aspectos em comum nesses três Mitos de Criação. Um deles, por exemplo, é o fato do Ser Humano ser uma criação de Deus (ou Deuses), mostrando a profunda conexão que essas civilizações buscavam ter com o Divino. Ao ligar a origem do Ser Humano a algo maior e Universal, passamos a compreender-nos como partícipes da Natureza, que contém em si uma parte Divina e que, desse ponto de vista, está para além de uma espécie que vive baseada apenas em seleção natural. Nesses mitos o Ser Humano não é apenas uma outra espécie, mas sim uma fabricação dos Deuses. 

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Do mesmo modo, em ambos os mitos percebemos que ao ser criado, o Ser Humano não havia, inicialmente, nada que o destacasse. Porém, graças aos esforços das Divindades, seja soprando ar e dando-lhe vida,  ou construindo diversos tipos de Humanidades ou ainda sacrificando sua própria liberdade, o Ser Humano ganha um aspecto Divino. Esse empenho dos Deuses para com a Humanidade simboliza o fato de que estamos ligados ao que chamamos de Deus. Ele habita em nós, pois seu sopro continua a nos movimentar. Do mesmo modo, podemos perceber a presença constante do sacrifício de Prometeu. Sempre que usamos nossa mente, estamos, em algum grau, expressando o Fogo que o titã nos concedeu.

Partindo disso, há ainda um outro aspecto muito similar em cada um desses mitos. Neles, o Ser Humano sempre é composto de um aspecto físico, material, e outro aspecto Espiritual. No cristianismo, por exemplo, o barro representa a matéria, é ela que molda a nossa forma, mas quando Deus sopra para que o ar entre no barro ele adiciona um novo elemento, nesse caso um elemento Espiritual, e assim nasce o primeiro Ser Humano. Logo, podemos dizer que o Ser Humano tem uma parte Espiritual e outra material.

Igualmente vemos essa dualidade presente na história de Prometeu, pois o Fogo que é dado à Humanidade é de caráter Divino. Se não fosse isso seríamos similares aos animais, segundo o relato grego. Isso nos faz pensar que, talvez, essas antigas civilizações tenham compreendido que a Natureza Humana é, em si, dividida entre os instintos e o Espírito. Transitamos por entre esses dois mundo e, em geral, nos acomodamos no mundo material, objetivo. Mas talvez a nossa missão seja, cada vez mais, trilhar um caminho de volta para os Deuses.

Sobre isso, um grande intelectual renascentista, de nome Pico della Mirandola, escreveu um belo texto chamado “Discurso da dignidade do homem”. Nos seus escritos ele aponta, de forma precisa e clara, acerca dessa Natureza dupla do Ser Humano. Diz o poeta que graças a essa parte Divina e terrena foi dado ao Ser Humano a opção de definir, por sua própria vontade como pretende viver, o chamado livre arbítrio. Desse modo, poderia escolher se viveria tal qual um animal, agindo apenas por instintos, ou se chegaria ao patamar Divino agindo baseado nas suas Virtudes. 

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Por fim, podemos entender que desde a nossa origem até os dias atuais, estamos nessa eterna luta para decidir quem somos verdadeiramente. Todos os dias, em nossas ações mais banais, podemos escolher entre agir de modo Virtuoso e Benéfico ou simplesmente reagir com base em nossos instintos de sobrevivência. Parece-nos que, ao buscarmos as similaridades desses Mitos de Criação do Ser Humano, podemos perceber que essas ideias são as mais presentes em cada um deles. Cada civilização traduziu essas mesmas ideias em formas diferentes, contando seus mitos, porém, o fato de estarem retratando a mesma ideia é um indício de que seus mitos se conectaram com um conhecimento profundo sobre nossa origem.

Hoje em dia não acreditamos que o Ser Humano tenha vindo do barro, ou mesmo que tenha nascido a partir do milho. A ciência nos mostra que a origem do Homem está há milhares de anos, num processo de evolução que resultou, até o momento, na forma que conhecemos hoje. Talvez, essa seja apenas uma outra forma para nos revelar uma Verdade mais intrínseca acerca do nosso papel no mundo: evoluir. Em todos os mitos de origem da Humanidade o Homem tem um papel a cumprir, que é chegar aos Deuses. Isso, em síntese, pode ser chamado de evolução, uma vez que chegaríamos a um outro patamar dentro da existência. Portanto, no fim, Ciência e Religião seguem em uma mesma direção, usando apenas caminhos distintos.

Não podemos precisar a origem do Ser Humano, nem muito menos invalidar o conhecimento dessas antigas civilizações. O que nos cabe, enfim, é perceber que não importa tanto a forma, desde que sejamos capazes de enxergar o Valor dessas ideias. Se conseguirmos fazer isso e movimentarmos nossas vidas em busca de melhorarmos, então podemos dizer que demos um passo rumo à nossa evolução, seja enquanto espécie ou a nível Espiritual. E que possamos, no final das contas, seguir evoluindo.

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