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O que pode estar por trás de nosso fascínio por fotos?

Uma foto pode revelar mais do que simples figuras e formas de um momento agradável. Revela sentimentos, emoções, desejos, expectativas e anseios. Dizem alguns poetas que se um texto pode carregar consigo os maiores segredos, a imagem, ao contrário, revela tudo, expõe as verdades mais secretas diante do bom observador. Ao olharmos uma foto nosso cérebro provoca os pensamentos e estimula a imaginação e, com o uso cada vez mais frequente da internet e o acesso às redes sociais, a imagem nunca foi tão importante para os padrões comportamentais de nossa sociedade. Talvez, em 1826, o inventor de uma das primeiras fotografias, o francês Joseph Nicéphore Niépce, não imaginasse o poder da sua obra sobre o comportamento das pessoas séculos após a sua invenção.

Com a popularização do uso de máquinas fotográficas, a chegada da tecnologia digital e o uso de câmeras no celular, houve uma verdadeira explosão de imagens em nosso cotidiano. Por que nos encanta tanto o registro de imagens? Uma chave para essa pergunta pode estar relacionada a nossa busca pelo o eterno. Até certo ponto a fotografia tem esse papel, uma vez que ela cristaliza o tempo e através dela podemos voltar e rever aquela pessoa querida, relembrar o cheiro e o sabor de uma comida, ouvir o som, reviver as emoções, o paladar e todas as sensações cabíveis quando olhamos a imagem.

O problema é que dentro de uma sociedade composta por valores cada vez mais superficiais, se prioriza os aspectos mais aparentes em detrimento da essência de cada coisa. Quando passamos a banalizar palavras e esvaziar seus sentidos, perdemos o contato com seu real significado. Atualmente, por exemplo, é comum utilizarmos a palavra “amor” em diferentes contextos. Passamos a amar nossos familiares, animais de estimação, celulares, carros e casas. Certamente temos apreço pelos nossos bens materiais, mas ao falarmos que amamos estas coisas acabamos, por fim, a banalizar o amor. Logo, acabamos por nos perder na superficialidade. Do mesmo modo, o valor da arte de fotografar perde o seu sentido original, que é de guardar, de sacralizar um momento importante que desejamos recordar no futuro, quando passamos a dar a mesma importância a fotos comuns, de momentos corriqueiros e de momentos especiais. Pensemos nesse exemplo: o valor que damos a uma foto de uma xícara de café que acabamos de postar em nossa rede social é o mesmo que o de nossa formatura, ou daquele momento importante de uma viagem, ou com a família.

Acabamos por privilegiar a quantidade dos registros e não sua qualidade. Por vezes passamos horas tirando fotos de momentos comuns, muitas vezes de qualquer maneira e postamos em nossas redes sociais sem nenhum critério. Isso ocorre, em parte, devido a nossa falta de bom senso, mas também por adotarmos um estilo de vida baseado em falsas ideias que, apesar de altamente racionais, acabam por nos esvaziar de todo o sentido Humano. Hoje já podemos observar que, por exemplo, em uma viagem, em encontros sociais ou nas festas familiares estamos mais preocupados com o ângulo e como vamos publicar as fotos em nossos feed, do que propriamente em viver inteiramente o presente. Deixamos de conviver e abrimos um sorriso para o momento da foto quando, internamente, estamos tristes, frustrados ou em estados de ânimo que não correspondem com a pose para a fotografia. Registramos, portanto, um momento cronológico, mas que não consegue transmitir a essência daquele instante.

Registramos os momentos, mas não nos reconhecemos mais. Como não estávamos presentes não poderemos rememorar porque na imagem registrada algo nos diz que não estávamos lá, que aquela pessoa não nos representa, porque aquele sorriso não era nosso, aquele olhar também não. Todo o registro, logo, pertence a um falso eu, um personagem bem conhecido e produzido para atender as necessidades sociais e não as nossas necessidades internas. O mais interessante é que ignoramos o quanto isso nos é prejudicial, como nos condiciona a uma vida de padrões de imagens cada vez mais questionáveis.

Como na Vida nada tem um lado só, o uso frenético de nossas câmeras pode ser também um instrumento importantíssimo para a nossa cidadania. Através dele podemos fazer denúncias sociais e registros úteis para resolução de problemas. Quantos casos não foram solucionados graças a um click? Quantos crimes não já foram elucidados, pessoas inocentadas e responsáveis punidos por conta de registros de suas imagens? Assim, ao contrário do que alguns pensam, não é a banalidade do uso de câmeras e o acesso aos meios tecnológicos que deformam o nosso comportamento individual, mas a falta de bom senso do uso desses instrumentos e veículos. Em última instância, o que mais nos deforma é a falta de contato conosco mesmo, ou seja, com a nossa essência. Como temos a necessidade de nos encontrarmos, nos conhecermos cada vez mais e não sabemos como, acabamos por lançar esse anseio para o mundo aqui fora e canalizamos todos os nossos sentidos e instintos nessa busca.

Por fim, vale ressaltar que a Arte de fotografar, tal qual como toda Arte, exige mais que a técnica. Para além da teoria, é fundamental uma sensibilidade profunda, pois, antes das capturas realizadas pelas lentes da máquina vem a captura do olhar por trás da câmera. Não adianta, por exemplo, ter o ângulo certo dentro de um contexto inapropriado gerando assim, deformação à imagem. Numa exposição fotográfica, um dos maiores cuidados é com a escolha das imagens a serem expostas e se a sequência delas será fiel ao roteiro estabelecido pelo curador ou produtor da mostra, disso vai depender a relação e a comunicação das fotografias com o público. Acreditam, os mais experientes na área, que a composição harmônica desses elementos (olhar do artista, cena capturada e sequência das imagens) conduzem para o sucesso ou o fracasso do evento.

Uma imagem pode falar mais do que mil palavras se estiver dentro do contexto adequado para a leitura e a interpretação necessárias. Quanto mais profundo for o olhar do artista por trás das lentes, mais bem sucedida será a captura das imagens sob uma ótica profunda e, por conseguinte, as cenas poderão ser não apenas eternizadas, mas recordadas na sua inteira totalidade. A sequência das cenas irá compor um texto traduzível e interpretável.

Por fim, devemos entender que a Arte imita a Vida, e tem uma coisa que a Vida não permite, que é o banal. Por isso, devemos sacralizar cada momento de nossa Vida, não pelo outro ou por conveniência dos padrões sociais, mas por nós mesmos, pelo dever moral de viver tudo o que nos cabe. Só assim poderemos trabalhar de maneira bem canalizada o nosso fascínio por registrar imagens externas, e, certamente, iremos colecionar belíssimas cenas de nossas Vidas numa sequência que revele a nossa verdadeira caminhada.

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