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A Misteriosa Deusa Maat e o Destino das Civilizações

Imagine uma civilização que emerge de um sistema religioso e moral em que os principais mandamentos são: ser tranquilo; entender que toda forma de vida é Sagrada; falar sempre com sinceridade; tratar todos os animais com muita reverência e honra; amar e reverenciar a Terra; falar dos outros sempre de forma positiva; permanecer em equilíbrio com suas emoções; ser alegre e espalhar alegria; perdoar sempre; ser sempre gentil e abraçar todos. Esse era o sistema do Egito, que há 4.500 anos tinha como fundamento e epicentro simbólico a grande Deusa Maat.

Por que conhecemos tão pouco dessa Deusa e dos seus símbolos, que sustentavam uma das mais potentes civilizações que já existiu? O que podemos aprender com esse sistema que se construiu em torno dessa Deusa? O que Maat comunica à nossa realidade hoje?

Não sabemos quase nada sobre o Egito, mas temos a mania de ler duas linhas a respeito e já concluirmos que sabemos de tudo. O nome “Egito” não é exatamente o nome original daquela civilização, essa era a forma como os gregos se referiam àquele lugar. Em grego, “Egito” quer dizer “o oculto” ou “o escondido”, pois os gregos, que também construíram uma das civilizações mais avançadas em sabedoria que já conhecemos, olhavam para aquela região e diziam: há algo oculto, misterioso naquele lugar, e de tanto falarem isso, o lugar ficou sendo conhecido dessa forma.

O pouco que sabemos hoje sobre o Egito deve-se muito à ambição de Napoleão Bonaparte, que em 1798 liderou uma guerra de conquista daquela região, e enquanto lutava na linha de frente com um exército de 35 mil soldados, enviava em paralelo uma expedição de 167 cientistas e artistas para pesquisar, explorar e se apropriar da cultura, da história e dos achados arqueológicos daquele lugar. Como fruto dessas explorações, surgiu a enciclopédia Description de l’Égypte, contendo uma detalhada descrição do Antigo Egito. Foi assim, dessa forma violenta, que a civilização ocidental conseguiu ter acesso a muita informação daquela cultura. Mas muitos aspectos dos sistemas religioso e moral da civilização egípcia também nos chegam por uma via não consciente. Como assim? Os nossos símbolos religiosos estão impregnados de aspectos da civilização egípcia, mas não sabemos conscientemente disso.

Quando os homens de Napoleão exploravam os escombros dos templos egípcios, e violavam os túmulos das múmias faraônicas, em 1798, depararam-se com uns rolos de papiro, os quais passaram a ser chamados de “O Livro dos Mortos”, mas essa designação está muito aquém do que de fato são esses escritos. Os egípcios chamavam-nos originalmente de Prt m hru, ou “A Manifestação da Luz”. É das linhas desse papiro que emerge diante dos cegos olhos da nossa civilização ocidental uma deusa representada por uma mulher muito bela, de cabelos negros, envoltos numa espécie de tiara feminina, prendendo uma pena de avestruz. Sentada sobre os seus calcanhares, com os braços abertos e trazendo sob eles lindas asas de águia, dispostas em semicírculo. Eis a deusa Maat, esplêndida, magnífica, majestosa e monumental.

Essa imagem percorreu mais de 4.500 anos e chegou até nós. Mas a preciosidade deste achado não se resume aos contornos gráficos da imagem, a profundidade está no que ela representa. O que está por trás de Maat? Quais mensagens estão ali encriptadas?

Os egípcios tinham uma forma muito curiosa de dialogar com a natureza, com a vida, com o caos e com o cosmos. Enquanto hoje desenvolvemos satélites, telescópios, microscópios e avançamos tecnologicamente em busca de explorar, descobrir e dominar tudo o que existe, os egípcios faziam diferente, costumavam olhar para isso tudo e representá-los por meio de símbolos religiosos que se concatenavam em um verdadeiro idioma sagrado. Através dessa “linguagem”, eles encontravam dentro de si mesmos um contato profundo com esses Deuses, e dessa forma, traduziam esta realidade interna numa forma de viver.

Imagina o quanto há de Ordem, de Constância e de Segurança em nosso sistema solar, considerando a forma como o nosso planeta gira em torno do seu próprio eixo e ao mesmo tempo percorre em uma trajetória elíptica o entorno do Sol, gerando os dias e as noites, os meses e as estações do ano. Isso tudo é fruto de um equilíbrio de forças, tão milimetricamente ordenadas quanto uma orquestra executando uma sinfonia de Bach. E se essa Ordem Cósmica, essa Justiça, esse Equilíbrio fosse uma manifestação de um Ente, um Ser Misterioso? E se eu pudesse me relacionar com esse Ser e encontrar expressões dele em mim?

É assim que surge no imaginário daquela cultura a deusa Maat. Surge como a personificação da ordem cósmica, da grande Justiça que rege o Cosmos e os Universos manifestados. Esse exercício psíquico de centralizar todas essas percepções do Universo em um único símbolo, é uma forma de organização interior, daquilo que já sabemos intuitivamente. Se eu consigo concentrá-las em um único ponto, eu consigo fazer todas as facetas da minha vida girarem em torno deste ponto. Esse é o grande salto da civilização egípcia. Eles pegavam as intuições difusas na vida, na natureza, nas estrelas e concentravam em um símbolo. Dessa forma, este símbolo e toda a sua mensagem, serviam como um referencial para a vida moral de todo Indivíduo. Talvez isto possa parecer confuso, pois nossa cultura não é acostumada com a linguagem subjetiva dos símbolos, mas isso ficará mais claro à seguir.

A devoção à Maat implicava na devoção à Ordem. Ora, se eu amo a Ordem, vou querer plasmá-la em todos os aspectos da minha vida, porque a Ordem é a Deusa. Assim, desde os aspectos domésticos, até os aspectos macro sociais como o governo, Estado, política, relações com a natureza e entre os indivíduos, tudo torna-se Sagrado quando a presença Divina de Maat, ou seja, a Ordem, é trazida para a experiência.

Uma seção do Livro dos mortos escrita em papiro e mostrando a “Pesagem do coração” em um tuat e usando a pena de Maat como peso na balança.

Como essa grande força que mantém a Ordem, desde as coisas pequenas até os planetas e as estrelas, claro que Maat também estaria relacionada com a crença egípcia sobre o julgamento de uma alma após a morte. Essa ideia de julgamento, ou de juízo final, é muito familiar para a nossa cultura, pois ela está presente em praticamente todas as religiões Abraâmicas. As religiões Abraâmicas são aquelas que tem origem no personagem bíblico Abraão, do livro de Gênesis. São as religiões mais numerosas hoje no mundo, alcançando todas elas juntas mais da metade de toda a população mundial, quase quatro bilhões de adeptos, são elas o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo. Todas reproduzem a mesma ideia mítica presente em Maat, muito embora todas tenham surgido em épocas posteriores, ou seja, são versões atualizadas, com alterações, do sistema egípcio.

Perceba que ao descermos até a origem, à gênese desse sistema, descobrimos o sentido original de se falar em julgamento pós morte. O sentido é que ao longo da nossa existência, somos regidos por leis invisíveis, mas tão implacáveis quanto às leis que regem a natureza física, como a lei da gravidade, por exemplo. E os desvios a essas leis nos levará a consequências inevitáveis também.

O filósofo Immanuel Kant dizia “O céu estrelado acima de mim e a lei moral dentro de mim enchem minha mente de admiração e assombro sempre novos e crescentes, quanto mais e mais constantemente reflito sobre eles.” Estamos falando dessas leis morais, invisíveis que regem a nossa existência com o objetivo de manifestar em nossa conduta a mesma ordem cósmica e universal que vemos na trajetória de um planeta, no nascimento de uma galáxia ou no deslocamento de um cometa no espaço.

Os egípcios compreendiam isso com muita clareza, pois a vivência do mito de Maat permitia um ambiente psicológico útil e necessário a essa compreensão. Durante o julgamento, Maat pesava o coração do morto em uma balança, comparando-o com o peso de uma pena de avestruz na outra bandeja. Não é para menos que o símbolo da Justiça hoje é uma mulher e uma balança. Veja como Maat está tão presente em nossa cultura, mas de forma muito deslocada do sentido original. O objetivo de se comparar o peso do coração com uma pena, você já deve ter deduzido. É que em nossa vida, nosso coração precisa se manter sempre leve como uma pena, tanto é que os mandamentos das mais diversas religiões falam em acolher a todos, ser alegre, perdoar, ser gentil, não guardar rancor etc. Isso não são meros mandamentos religiosos, são leis invisíveis que nos conduzem a essa postura diante da vida, da mesma forma que a gravidade puxa o nosso corpo para o solo.

Esses detalhes, que muitas vezes consideramos como pequenos, são fundamentais na sobrevivência de toda uma civilização. A época histórica em que o sistema moral em torno da deusa Maat vigorou no Egito coincide com o apogeu daquela civilização, assim como a sua decadência civilizatória coincide com a destruição gradativa do sistema religioso e moral de Maat. Alguns podem até questionar se esses mitos não seriam formas criadas pelos poderosos para controlar a população, mas isso não faz o menor sentido dentro do contexto histórico a que estamos nos referindo. Nessa época, a todo cidadão egípcio era cobrada a obediência à Lei de Maat, e até mesmo se o faraó a descumprisse, esta seria a única falha sem perdão, pois isso prejudicaria todo o Egito.

A história nos mostra que o crescimento de um povo está diretamente associado ao funcionamento de seus sistemas morais, religiosos e jurídicos, pois sem isso não há civilização. O que sustenta uma nação ou uma sociedade não é a economia, não é a saúde e não é o conforto . Sem sombra de dúvida é a Moral o fator que mantém uma nação de pé. Uma civilização não sobrevive sem que consiga dominar suas animalidades, suas selvagerias. Uma civilização exploradora, genocida, agressora da Terra e da Natureza, que macula seus templos e mistura fé com dinheiro e interesses mesquinhos não se mantém por muito tempo.

Mas é importante enfatizar uma coisa, não estamos nos referindo a uma Moral no sentido de moralismos, ou de convenções sociais superficiais. O que realmente tem valor é a Moral no sentido de conexão profunda com as Leis Universais, com esse mistério interior que Kant já assinalava. É o que a filosofia antiga costumava chamar de Moral Transcendental, ou uma moral que está para além de nossas razões físicas e materiais.

A grande mensagem que podemos encontrar na reflexão sobre a Deusa Maat, para a atual civilização em que estamos é: precisamos urgente refazer nosso caminho civilizatório, pois o egoísmo, a avareza e os padrões predatórios com que lidamos com os recursos naturais apontam para desvios gravíssimos das Leis Universais. Mas não adianta reclamar do “mundo”, é necessário que cada um de nós assuma a sua responsabilidade e transforme essas Leis de Maat em atitudes cotidianas.

Quer saber mais sobre esse assunto? Então confere o nosso Vídeo do YouTube que preparamos especialmente para Você.

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