Qual o peso das nossas memórias? Diante de um fato doloroso, ou de uma perda inesperada, ou mesmo diante do término de um relacionamento, como nossas lembranças ficam impactadas? O filme, “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças”, lançado em 2004 e dirigido por Michel Gondry, narra o drama de um casal que, após terminar o relacionamento, recorre à uma técnica inovadora para apagar completamente todas as lembranças um do outro, na esperança de superar a dor da separação. O longa-metragem de romance e ficção científica virou um clássico na primeira década dos anos 2000, com a atuação dos atores Jim Carrey e Kate Winslet, que dão vida aos principais personagens Joel Barish e Clementine Kruczynski, o filme confere ao telespectador um alto grau de realismo e aproximação com os problemas encarados por um casal na superação e esquecimento das lembranças do passado.
O “Eternal Sunshine of the Spotless Mind”, título no original, é daqueles filmes que nos fazem pensar sobre as dificuldades que temos para lidar com as nossas questões emocionais, principalmente quando se trata de uma frustração amorosa ou uma paixão não correspondida, a velha famosa “dor de cotovelo”. O filme segue uma estrutura não linear, mas na sua maior parte, se dá a partir de memórias e monólogos interiores do personagem principal, Joel. A estrutura narrativa da obra nos mostra cenas de momentos do passado, do presente e do futuro de Joe e da sua ex-namorada. As cenas entrecortadas como flashbacks lembram, por vezes, o próprio funcionamento da nossa memória ao tentarmos lembrar dos fatos.
Clementine e Joel formavam um casal que tinham poucas coisas em comum, e desde o início da relação, eles percebiam que essas diferenças poderiam colocar em risco o namoro. Joel é um homem reservado, introspectivo e melancólico. Clementine é uma mulher decidida, espontânea e fala o que pensa. Eles tinham uma relação um tanto quanto conturbada, até que em um certo dia, após uma das brigas rotineiras, Clementine decide esquecer Joel e apagá-lo completamente de sua memória. Assim, ela se submete a um experimento clínico que promete apagar da memória todas as lembranças relacionadas a alguém, fazendo com que, ao final do procedimento, Clementine nem reconheça mais Joel ao encontrar com ele. Ao descobrir o ocorrido, Joel sofre muito e também decide se submeter ao tratamento. Aí é que começa a trama principal da obra, pois durante o procedimento, enquanto estava sedado, Joel revive mentalmente todas as memórias que viveu com Clementine e percebe que elas estão desaparecendo uma a uma. É então que ele desiste de esquecer e começa a lutar mentalmente contra o procedimento, para tentar manter a imagem de sua amada viva dentro de si.
Um dos pontos mais importantes que esse filme aborda é a nossa incapacidade em lidar com as nossas dores emocionais, fazendo com que busquemos respostas rápidas para a resolução dos problemas. Tudo na Vida acontece através de processos, seguindo Leis. Por exemplo, se um jarro cai na minha cabeça, todo este fenômeno físico pode ser explicado pelas leis da mecânica; o galo que vai crescer em minha cabeça e todo o processo de cura da lesão seguem leis biológicas. Quando falamos do campo emocional, as coisas não são tão diferentes. Algumas coisas que acontecem em nossas Vidas causam feridas internas, e isso é natural. Mas precisamos entender que existe um processo, e alguns cuidados que devemos tomar, para que esta ferida também cicatrize.
Já imaginou se realmente existisse a possibilidade de nos livrarmos de uma “dor de cotovelo”, de uma saudade ou de lembranças dolorosas, a partir de alguma máquina ou medicamento? Considerando a sociedade em que vivemos, sem dúvidas isso faria muito sucesso, porém, isso roubaria de nós a nossa capacidade Humana e a autonomia de nossas decisões, nos transformando em algo semelhante às máquinas.
A desistência de Joel do experimento e a sua luta em manter ainda viva a imagem de sua amada dentro de suas memórias, nos ensina que, mesmo sendo alegres ou tristes, dolorosas ou prazerosas, as nossas memórias fazem parte da nossa Identidade. Por isso não devemos abrir mão delas, muito pelo contrário, deveríamos saber usá-las da mesma forma que utilizamos os nossos membros físicos. Se algumas nos trazem alegrias, façamos uso delas quando estivermos um pouco tristes. Mas o que fazer com aquelas que nos trazem dor? Cuidemos delas, até que a ferida sare. Quando isso acontecer, perceberemos que ela irá nos trazer muitos ensinamentos.