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O Mito de Niké: A Vitória Sobre o Inimigo Interno

Todos desejamos vencer. Em uma sociedade competitiva como a atual, a Vitória é sinônimo de sucesso, fama e prosperidade. Essa frase é tão real que muitos de nós fomos criados sob o dogma de que é preciso “vencer na vida”, ou seja, se tornar alguém produtivo, ganhar dinheiro e ter um status social digno. Mas será que a Vitória, com “v” maiúsculo, está limitada apenas a isso? Quando nossa visão está voltada simplesmente para aspectos materiais, não é de se estranhar esta relação com a Vitória. Afinal, nesse “jogo” de busca desesperada pelo consumo e pela obtenção de recursos, quem mais acumula dinheiro e bens materiais é, de certo modo, vencedor. Como diria o imortal Machado de Assis em seu livro Quincas Borba, “ao vencedor, as batatas”, simbolizando a eterna disputa por recursos em nossa sociedade atual. Entretanto, do que se trata, em um aspecto mais profundo, a Vitória?

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Vamos começar nossa investigação com um antigo provérbio chinês que fala o seguinte: a maior conquista de um guerreiro é a vitória sobre si mesmo, afinal, somos o nosso pior e mais destrutivo inimigo. Sun Tzu, o lendário estrategista dos exércitos orientais, em sua “arte da guerra” deixa claro que para vencer um oponente não basta apenas conhecê-lo, saber seus pontos fortes e fracos. Aquele que não se conhece jamais será vencedor. Essas frases nos remetem a uma tradição antiga que nos fala sobre a batalha interna travada por todos os Seres Humanos. Podemos encontrar essas ideias na Tradição Hindu, no Cristianismo, na Grécia Antiga e até em alguns Filósofos modernos. Não é de hoje que travamos batalhas e que buscamos vencer a nós mesmos. A partir disso, podemos refletir sobre do que se trata a verdadeira Vitória. 

Como dito no começo do texto, todos desejamos vencer. A Vitória, em diferentes níveis, nos realiza, pois é a prova objetiva do nosso esforço. As Vitórias externas, comumente refletidas em um trabalho bem feito, em um emprego satisfatório ou em um casamento duradouro, são apenas formas de expressarmos o desejo de vencer um desafio interior. Esses desafios, certamente, envolvem elementos internos, que nos obrigam a olhar para nós mesmos, a fim de nos autoconhecermos e nos dominarmos. Vale ressaltar que essas conquistas que estamos chamando de “externas” são extremamente válidas e importantes na nossa conjuntura social atual; porém, o problema se expressa quando focamos apenas nelas, e não no que elas podem refletir internamente. 

Deixando mais claro a partir de exemplos, pense em uma pessoa que consegue uma promoção no trabalho, ocupando um excelente cargo. Podemos afirmar que essa promoção só foi conseguida a partir da dedicação, disciplina e refinamento do seu trabalho, lhe garantindo melhores resultados. Assim, a verdadeira vitória não está no novo status que essa pessoa adquiriu, mas na expressão de suas Virtudes que, consequentemente, lhe geraram essa promoção. A verdadeira Vitória, portanto, foi superar a preguiça, os dias ruins, a autossabotagem e todos os defeitos que possivelmente tentaram atrapalhar essa jornada. 

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Ao pensarmos sobre a Vitória nas culturas clássicas, veremos que na Grécia Antiga ela era representada por Niké, uma Deusa alada que estava sempre próxima de Atena, a Deusa da Guerra Estratégica e da Sabedoria. O fato das duas Deusas serem representadas juntas não é coincidência. A Vitória se relaciona com a Sabedoria porque esta exige um conhecimento preciso acerca da Vida. O Sábio, afinal, é aquele que sabe. Sabe, de forma pura e objetiva, a essência da Vida, das Leis e de si mesmo. É aquele que venceu seu inimigo interno e, por isso, conhece sua capacidade, finalidade e existência. Duvidamos, portanto, que a Sabedoria nos trará, indubitavelmente, a Vitória? Isso não significa dizer que ela será fácil. Ter a posse de si mesmo, sem dúvida, é fruto de uma árdua e longa batalha. Não por acaso a Deusa da Sabedoria também é a Deusa da Guerra, uma vez que representa esse combate interno e externo que temos que fazer diariamente em nossas vidas. 

Outro aspecto importante quando refletimos sobre o simbolismo de Niké estar nas mãos de Atena: é de que a Sabedoria sempre será vitoriosa, mesmo nos momentos em que não nos sintamos assim. Há quem diga, por exemplo, que a Sabedoria nos traz tristezas, pois, agora que sabemos, precisaremos atuar. Nesse sentido, se vê a ignorância como uma “benção”, já que como não sabemos, não precisamos nos corrigir. Pensem, porém, em uma vida de completa ignorância: será que seríamos felizes ou realizados? É evidente que não. Mesmo nas experiências mais duras, repletas de dor e sofrimento, podemos absorver a síntese desses momentos e retirar valiosas lições de vida. A sabedoria, portanto, sempre vencerá, pois estará sempre atuando ao lado da Evolução Humana.

Visto isso, Niké busca pousar naqueles dispostos a vencer a si mesmos, sacrificando, muitas vezes, a própria existência. Ao olharmos para a própria história da Grécia Antiga, podemos encontrar exemplos dessa natureza. Poderíamos falar de Leônidas e seus 300 espartanos, de Sócrates e seu julgamento; mas pensemos em um exemplo que envolve a própria Niké: a famosa Batalha de Maratona e o grego Fidípides. 

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Fidípides foi um soldado grego que lutou na Primeira Guerra Médica. Além de soldado, ele cumpria a função de entregar mensagens quando necessário. Certa vez, por exemplo, ele cumpriu o feito de percorrer, a pé, mais de 200 km em pouco mais de um dia. Porém, esse não foi o maior de seus feitos. 

Durante a primeira Guerra Médica, Dario I, o Rei do Império Persa, invadiu reinos ao norte da Grécia, como a Macedônia e a Trácia, e em seguida buscou atacar Atenas. Ele desembarcou na região de Maratona, que ficava cerca de 42 km da principal Cidade-Estado grega. Visto a extensão do exército Persa e as chances reais de derrota da falange grega, foi ordenado à população ateniense que, caso não recebessem notícias sobre o resultado da batalha, a cidade deveria ser incendiada e seus habitantes cometeriam suicídio, para evitar um destino pior na mão do inimigo. A batalha, porém, que entraria para a História como a “Batalha de Maratona”, foi favorável aos gregos, graças à estratégia do General Miltíades. Porém, apesar do sucesso militar, ainda seria necessário avisar, o mais rápido possível, sobre a Vitória.

É nesse momento que Fidípides entra em ação. Mesmo cansado e ferido, o mensageiro é incumbido de levar a notícia até Atenas e evitar o trágico destino da cidade. Dando tudo de si, Fidípides percorreu os 42 km de distância e, exausto, chegou até Atenas. Proferiu então sua última palavra: “NIKÉ! Vencemos!”. Em seguida morreu devido aos ferimentos e ao esforço feito. 

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Talvez você esteja pensando, caro leitor, que o sacrifício de Fidípides não é uma Vitória, afinal, ele morreu. Porém, procuramos pensar que esse grego conseguiu, em seu esforço e cumprimento do dever, algo que nos dias atuais nos falta bastante: a capacidade de sacrificar a nós mesmos pelos demais. Certamente, o esforço dele não foi em vão, visto que Atenas não foi incendiada e sua população continuou viva. Além disso, o ato de não se permitir descansar, e nem mesmo morrer antes de ter feito o que lhe cabia, é, sem dúvida, admirável e honroso não apenas por ter salvo a cidade, mas também por ter vencido o medo da morte, as dúvidas e qualquer outra emoção que tenha tentado possuí-lo. Percebemos aí o espírito da Deusa Niké, a Vitória que temos ao vencermos nossos medos e inseguranças, estes que, certamente, não somem com golpes de espada ou adquirindo fama e sucesso. A verdadeira Vitória se dá ao calar os nossos sons internos que gritam e nos paralisam. Se dá no silêncio obtido após o cessar dessas vozes. Nesse momento, podemos, se prestarmos bem atenção, sentir Niké pousando com suas asas na palma de nossas mãos e nos elevando, por alguns instantes, ao pleno saber da Vitória. 

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