Queremos lhes convidar a conhecer uma pessoa. Mas antes de apresentar nossa convidada, gostaríamos que imaginassem o seguinte cenário: um reino destruído por quase um século de guerra, em que grande parte da população foi morta ou capturada pelo inimigo que, batalha após batalha, avança e conquista mais territórios. Imaginem um tempo em que o único destino que se poderia supor era o de trabalhar a terra, e que o ofício da guerra era destinado apenas aos homens. Imaginem, por fim, que além disso tudo, suas crenças pudessem levar você a morte, caso suas palavras soassem estranhas aos ouvidos de um juiz ou autoridade clerical. Esse, certamente, não parece ser o ambiente mais favorável para nascer uma Heroína, porém, da lama e das cinzas vividas no reino da França no século XV, surgiu nossa ilustre convidada.
Estamos falando de Joana d’Arc, uma mulher idealista que viveu e morreu pela terra e pelos Valores que acreditava. O cenário que descrevemos está inserido na Guerra dos Cem Anos, a guerra mais longa de toda a história da Europa. Ela foi travada entre ingleses e franceses durante os anos de 1337 e 1453. As armas e estratégias de combate foram decisivas no início da guerra, fazendo com que a Inglaterra conquistasse boa parte do território da França, que a cada dia perdia as esperanças de sair vitoriosa da disputa. Derrota após derrota, o território francês chegou, de fato, a estar no poder da coroa inglesa, entretanto, nem tudo estava perdido.
Exatamente nesse momento, em que o mais duro golpe sofrido pela França durante a guerra se consolidava, surge a figura de Joana d’Arc. Até então uma jovem camponesa, que vivia na região de Lorena e pouco conhecia sobre o mundo. Apesar de sua origem humilde, uma forte religiosidade caía sobre sua natureza, e graças a esse aspecto Joana entrou para a História. A jovem afirmava ouvir vozes que a mandavam para o campo de batalha. Essas vozes, que ela atribuiu ao Arcanjo Miguel, deram à camponesa a tenacidade necessária para desafiar todos os paradigmas da sociedade medieval. Afinal, o que uma mulher, ainda mais uma serva, poderia fazer frente ao poderoso exército inglês?
Ela, primeiramente, precisou ir até o herdeiro do Trono francês, o rei Carlos VII, e convencê-lo de que suas visões eram reais, passando então a liderar um batalhão do exército francês, comandando os soldados no campo de batalha. Esse feito, por si só, já deixaria Joana d’Arc com um lugar reservado na História, mas seus feitos não param por aí.
Suas conquistas militares aumentariam ainda mais a fama da jovem heroína. Na época, com apenas 16 anos, Joana d’Arc marchou com mais de 4 mil homens e derrotou os ingleses na Batalha de Orleans, em 1429. Até então, os franceses haviam, em todas as batalhas, sofrido apenas derrotas, algumas de maneira avassaladora, como nas batalhas de Poitiers (1356) e Azincourt (1415). A vitória em Orleans aumentou a esperança no front francês, que já aclamava Joana d’Arc como uma intermediária entre o Céu e a Terra.
Aos poucos os franceses foram revertendo a incômoda situação. Entretanto, Joana não viveria para ver o fim da guerra dos Cem Anos. Em uma tentativa de retomar Paris, que estava sob domínio inglês, Joana d’Arc foi ferida por uma flecha. O exército, vendo sua líder ferida, resolveu recuar e esse foi o primeiro revés na campanha liderada por nossa heroína. Em uma outra investida, agora na cidade de Compiègne, acabou sendo capturada. A partir desse momento, a nossa personagem começa a sair dos campos de batalha e passa a vigorar como um Mito.
Usamos a palavra “mito”, pois ela se tornou algo mais importante do que uma líder, se tornou um símbolo imortal, que, aliás, até os dias atuais, vigora na memória e identidade do povo francês. Mas estamos nos adiantando. Vamos aos fatos. Joana d’Arc, ao ser capturada, foi levada a julgamento, acusada de heresia e assassinato. A heresia seria afirmar que escutava vozes e comunicava-se diretamente com o Divino. Lembremos que eram tempos medievais, em que a mentalidade e controle da Igreja sobre a religião eram absolutos. Uma camponesa afirmar que poderia ouvir os Arcanjos e Santos era considerado uma blasfêmia. Joana resistiu ao julgamento, mas foi condenada pela inquisição por heresia. Sua morte ocorreu no dia 30 de maio de 1431, em uma fogueira na cidade de Rouen. Joana d’Arc tinha apenas 19 anos.
Nesse ponto, caro leitor, talvez você pense que esse foi o fim da nossa grande heroína. Engana-se. Sua morte serviu como símbolo para o exército francês, que agora lutava com muito mais afinco e determinação. O martírio de Joana d’Arc deu aos homens a força necessária para empurrar o exército inglês para fora do território da França. Após 22 anos da condenação de Joana d’Arc, a guerra dos Cem Anos chegava ao fim, com o exército francês reconquistando o último território que havia sido tomado. No fim, após 116 anos de batalhas e um saldo incalculável de perdas humanas, os dois reinos voltaram a manter suas fronteiras anteriores. Joana d’Arc, nesse ponto, foi aclamada como uma figura relevante à nação. Tanto que, em um julgamento simbólico, em 1456, ela fora absolvida dos crimes que lhe custaram a Vida.
Quase cinco séculos depois, em 1920, ela foi santificada. Seu milagre, entre outros tantos, fora de dar aos Homens novamente a Esperança e a Força necessárias para retomarem o que lhes era de direito. Talvez, e só talvez, pensemos que esses feitos, que parecem ter sido tirados de uma História de ficção, são próprios somente de grandes Seres Humanos. Mas, por detrás disso tudo, existiu um Ser Humano, tal como nós. Então, o que nos diferencia? Acreditamos que somente a Vontade, o Amor e a Inteligência para defender os Ideais que acreditamos, seja a resposta para a pergunta. E desenvolver isso não é tarefa fácil, certamente. Talvez envolva ir de encontro a padrões sociais, a esquemas pré-estabelecidos e, em alguns casos, envolve sacrificar a própria Vida.
E talvez vocês se perguntem: e vale a pena lutar e morrer por um Ideal? Os franceses do século XV, e os de hoje que o digam. Talvez não existisse uma França nos mapas atuais, se antes não tivesse existido uma Joana d’Arc. Então, nosso único desejo, caro leitor, após a leitura dessas linhas é que a História dessa grande mulher nos Inspire a perseguir Ideais de Beleza, Bondade e Justiça. Cada um à sua maneira, mas sempre lutando nas batalhas diárias que nos correspondem.