Conta a lenda que o general romano Agátocles, muito destemido e determinado, empregava com suas tropas uma tática bastante distinta, quando aportava em cidades além mar para guerrear: queimava suas próprias embarcações, as Naus. Dessa forma, ele alertava seus homens que só havia dois destinos a partir dali: vencer ou morrer. Jamais recuar.
Esta tática, que inclusive foi utilizada também pelos Vikings, pode parecer kamikaze demais. No entanto, existia um motivo para isso. Roma não ficou conhecida na História por fracassar, tampouco por promover generais suicidas em suas campanhas. Pelo contrário, o Império costumava planejar suas investidas com equilíbrio, e quando decidia por uma invasão, previa a vitória com convicção. Em alguns casos, não era tão fácil convencer as tropas de que a vitória estava a seu favor, e, por isso, Agátocles usava desta figura simbólica para provar para seus homens que acreditava firmemente na vitória, e assim lhes transmitia mais confiança, que é um sentimento fundamental para quem pretende apostar a própria vida.
Atravessar o Mar Mediterrâneo e invadir Cartago não costuma fazer parte da rotina dos cidadãos do século XXI. Então, essa atitude tão drástica pode soar ultrapassada, incabível ou sem relação com a nossa vida atual. Porém, transportar nossa mente para o significado dessa história, nos ensina sobre algo muito mais próximo de nossa realidade: a importância de enfrentar nossos receios e medos.
Quando se pula de paraquedas ou de Bungee Jump pela primeira vez é muito comum sermos dominados pelo medo. Não é fácil se colocar numa situação de tamanha vulnerabilidade, sem resistir e sem enfrentar um conflito interno. Uma parte de nós confia nos equipamentos, nos instrutores e nas medidas de segurança, mas há um outro “eu” dentro de nós que diz que aquilo é loucura e pode significar a morte. No caso desses esportes radicais, o instrutor que acompanha o iniciante costuma anunciar que contará até três, mas após iniciar a contagem, interrompe-a no dois e empurra seu aluno, sem nunca chegar ao três. Isso acontece porque frequentemente as pessoas desistem quando a contagem termina. Nesse caso, são completamente dominadas pelo medo e pela ansiedade. Mas não é preciso uma injeção de adrenalina tão forte para aprender a utilizar essa tática, afinal de contas, fazer um esporte radical não é algo tão relevante assim para a nossa Alma ou para o Bem da Humanidade. Existe uma maneira mais positiva e menos arriscada de viver esta mesma ideia.
A Vida é feita de problemas, de provações, de batalhas de todos os tipos. Enfrentamos algo novo todos os dias. Avançar sobre tantos obstáculos pode ser cansativo para o corpo e para a mente, mas nunca para a Alma. Diante de tamanho desgaste, é natural sermos receosos com objetivos mais ousados, ou com desafios mais intimidadores. Seja pedir sua namorada de muitos anos em casamento, mudar de profissão, escolher o curso que vai estudar nos próximos quatro ou cinco anos etc. Nesses casos, geralmente só conseguimos contemplar um bom motivo para fazer isso: nossa Felicidade. Mas inúmeros contrapontos surgem em nossos pensamentos para fazer com que mudemos de ideia. O esforço exigido pelo desafio é muito grande, e a incerteza que ronda nossos pensamentos nos consome por dentro. É aí que devemos queimar nossas Naus.
Se quer mudar de profissão, é provável que seu plano seja iniciar uma, enquanto ainda tem segurança na atual. Só que isso costuma não dar muito certo. Ter que dividir sua consciência em vidas diferentes, pode não apenas atrapalhar o início de sua nova carreira, que exige atenção e continuidade, mas também compromete seu ofício atual, que agora não conta mais com toda a sua dedicação. Se está certo de que deve se lançar ao mar, isto é, se avaliou todos os quesitos e consequências, e agora está certo que não há melhor caminho do que a mudança, queime suas Naus e vá em frente.
Assim como isso é verdadeiro em relação às mudanças que queremos, mas não temos coragem de fazer, também vale para aquilo em que acreditamos, mas não temos coragem para praticar. Por exemplo, denunciar um caso de abuso de autoridade cometido contra si ou alguém que lhe é próximo parece natural e até óbvio de se fazer. Porém, quando esse abuso é cometido, ao invés de sofrido, por um grande amigo, é difícil acreditar que também encontraríamos a mesma convicção de enfrentar esta injustiça. Não devemos nos diminuir por isso. Somos Seres Humanos, e a maioria de nós é assim, mas também não precisamos nos apegar aos nossos defeitos. Podemos mudar nossos hábitos, pouco a pouco, e adotar comportamentos mais bem associados com aquilo que gostaríamos de ver na sociedade e no mundo. Se possuímos Princípios, Valores Éticos, devemos defendê-los, inclusive às custas de um emprego ou do relacionamento com um amigo.
Acabar com nosso “porto seguro” nos coloca num estado de Atenção e de Iniciativa incomparáveis. Que Bravura iríamos desencadear numa luta, sabendo que há a possibilidade de voltar atrás? É preciso se comprometer para mudar. Não se pode preparar omeletes sem quebrar os ovos. Como certa vez disse Gandhi, um pensador e ativista da paz indiano, nós devemos ser a mudança que queremos ver no mundo. Não existem grandes mudanças sem grandes sacrifícios.
O mundo em que vivemos hoje precisa muito de pessoas boas, que façam o Bem, que sejam o Bem, e que multipliquem o Bem. Quem, melhor do que nós mesmos, para assumir esse papel? Não espere que o mundo vá mudar sozinho só por causa das nossas “boas intenções”. Garanta que sua Boa Vontade possa fazer a diferença na Vida das pessoas. Sem recuar, sem duvidar e sem desistir, seja aquilo que o mundo precisa que você seja. Seja o Bem, seja o Futuro.