O Homem é um ser social. É natural para a nossa espécie buscar sobreviver em sociedade. Porém, por vezes, as regras e condicionamentos dessa Vida em conjunto nos causam uma sensação de aprisionamento. Acho que todos nós já passamos por isso, em maior ou menor grau. Fomos educados a sermos bons cidadãos, a seguir as leis, a não desobedecer autoridades, a respeitar os mais velhos. E não me entendam mal, tudo isso é necessário e bom, mas, do outro lado da moeda, quantos sonhos nos foram desestimulados? Quantas emoções e sentimentos reprimidos, por não ser “bem visto” aos olhos dos outros? Será que, no fim das contas, viver em sociedade nos garante Felicidade, ou esta só pode ser possível em um “estado natural”, longe das amarras e contratos sociais que nos envolvem?
Esses questionamentos e angústias levaram Christopher McCandless a mudar toda sua vida e buscar viver longe da civilização, isolado de todos. Estamos falando de “Na Natureza Selvagem”, a nossa indicação de filme de hoje. Indicação essa que também cabe como indicação de livro, uma vez que, o filme de 2007 é baseado no livro homônimo de John Krakauer.
Mas do que se trata esse filme/livro? A obra vai tratar da história de Alexander, ou Alex Supertramp. Esse é o pseudônimo de Christopher McCandless, um jovem recém formado que decide experienciar uma Vida fora da sociedade. Ele então viaja durante dois anos por diversas regiões da América, tentando livrar-se de tudo que lhe prendia ao passado e dos condicionamentos que lhe foram ensinados. O filme conta com uma fotografia belíssima, além da trilha sonora feita por Eddie Vedder, especialmente voltada para o filme, o que torna as músicas ainda mais marcantes.
Porém, antes de explicarmos mais sobre as reflexões do filme, se faz necessário salientar que essa é uma história real, de uma pessoa real. Alex Supertramp foi um jovem que nos anos de 1990 saiu de casa e quis viver essa aventura, numa busca de encontrar-se. Esse fato nos coloca numa posição de respeitar o “personagem”, mesmo que não concordemos com algumas de suas atitudes e posicionamentos. Enquanto espectador, devemos isso a história e a Alex. Tanto o livro como o filme foram baseados nos diários de viagem de Alex, o que nos aproxima da sua realidade e dos seus posicionamentos. Nos sentimos íntimos dele, por percebermos seu ponto de vista, como ele estava pensando e o que queria encontrar com esse modo de viver.
Uma das principais reflexões do filme gira em torno do “estado natural” do homem. Será que, no fim, a forma que vivemos em sociedade nos permite sermos nós mesmos? Alex busca, incessantemente, esse estado natural, que na sua concepção, só é possível a partir de uma vivência profunda em contato com a Natureza, isolado, pois assim o meio social não irá influenciar em nossas decisões. Esse ideal que Alex busca viver é inspirado por autores do século XIX como Jack London, Leon Tolstói e Thoreau. Todos, em seus livros, buscaram relacionar essa temática que contrasta o natural e o social. A ideia é que a verdadeira Natureza Humana vai se perdendo dentro de uma sociedade que se torna cada dia mais desumanizada. A Liberdade, por fim, estaria ligada ao contato com nossa natureza, contato com quem realmente somos, e o empecilho para esse caminho seria as amarras que a sociedade impõe. Alex, tomado por essas ideias e não conseguindo encaixar-se no estilo de vida que seus pais desejavam, forma-se na universidade e entrega aos seus pais aquilo que eles tanto queriam, sendo esse seu “último ato civilizatório”. A partir desse momento ele decide viver por conta própria, seguir esse idealismo que aprendeu nos livros. Ele então “some do mapa”, e começa uma jornada para se encontrar dentro desta natureza selvagem, longe da sociedade.
É interessante, nesse ponto, perceber que as ideias que movimentam Alex partem de uma ótica individualista. A todo momento suas escolhas refletem apenas o interesse em si mesmo. Isolar-se de todos foi a saída encontrada para uma angústia dele, e essas percepções vão se refletir na sua síntese feita ao fim da jornada. Por vezes, pensamos de modo muito parecido: “a sociedade não presta”, “eu queria morar numa ilha”… Mas será que isolar-se e querer viver sozinho, mesmo que lhe traga Felicidade, vai resolver o problema Humano? Será que a sociedade, que tem problemas e dificuldades, não precisa de mais pessoas nela que queiram ajudar a melhorá-la? É interessante pensarmos sobre esse ponto que, muitas vezes, nos escapa. Gostamos do idealismo do Alex Supertramp, mas não podemos negar que a sua base se pauta no individualismo, na ideia egoísta de que “a sociedade não tem jeito, então melhor abandoná-la e seguir meu caminho só”.
Apesar disso, a escolha de Alex o leva a iniciar sua jornada. E como toda jornada, existem dificuldades, prazeres e momentos emocionantes. Talvez os momentos mais emocionantes do filme não sejam os atos de rebeldia do protagonista, em que ele reverbera os traumas sofridos em sua incessante busca de afastar-se do meio social e reafirmar sua posição individualista. A Verdadeira Beleza de sua caminhada está nas relações que ele cria ao longo desse caminho. Com as pessoas que encontra, com os locais que se relaciona e até com o seu destino final, o Alasca. A parte selvagem do Alasca, a última fronteira. Este é o caminho que ele percorre para encontrar sua Verdadeira Natureza, a busca por uma Felicidade genuína, desgarrada de qualquer bem material ou ideia pré-concebida pelos meios sociais. É ali, sozinho, isolado, que ele acredita encontrar-se.
O filme, portanto, vai nos inspirar devido a essa angústia real de Alex por respostas. Essas respostas que, no fundo, todos nós ansiamos por encontrar. Quem somos? Como ser Feliz? Qual o meu papel no meio disso tudo? Tais questões, acima de tudo, movimentam a jornada do nosso carismático Alex. No fundo, o radicalismo que encontramos no jovem Christopher habita em nosso âmago, essa necessidade existencial por encontrar-se no mundo. Por fazer parte do mundo. Ele tentou achar suas respostas vivendo essa jornada. Qual será o nosso caminho para responder a essas perguntas tão fundamentais para a nossa Alma, mas que a cada dia que passa, mais nos esquecemos?
Por isso indicamos “Na Natureza Selvagem” como filme a ser assistido. Não pela forma de Vida e posicionamentos tomados por Alex Supertramp, mas principalmente por movimentar-se para buscar respostas.