Ilustração autor Escher
Você já teve aquele pressentimento de que algo que está vivenciando no momento presente já ocorreu antes? Que a pessoa que te apresentaram, você já conhecia há muito tempo? Que já esteve naquele lugar? Que já assistiu aquele filme? Ou leu aquele livro? Até mesmo já viu o gato fazer o mesmo miado anteriormente? Tudo isto acompanhado de um sentimento de estranheza e dúvida? Esta sensação é tradicionalmente chamada de Déjà Vu, “já visto” em francês. Mas por que isto ocorre? E será mesmo que já vivenciamos aquela situação? Esta é uma dúvida que muitas pessoas já se debruçaram em busca de respostas.
Várias são as teorias acerca do assunto, dependendo muito da visão de mundo do buscador que a está propondo. Aqui, apresentaremos algumas delas, de maneira que todos nós possamos investigar nas nossas próprias vidas aquilo que nos faz mais sentido.
Do ponto de vista científico, de acordo com o estudo publicado no periódico The Quarterly Journal of Experimental Psychology, o Déjà vu é uma reação do nosso cérebro que checa a memória que acabou de criar. Os pesquisadores chegaram a esta conclusão tentando provocar a sensação de replay da vida em um laboratório, já que, na realidade, a dificuldade em estudar um fenômeno como este é a falta de previsão de quando ele irá acontecer.
A pesquisa consistiu em repetir uma lista de palavras associadas ao sono, por exemplo, e depois eles passaram a perguntar aos 21 voluntários se eles já tinha ouvido estas referidas palavra. Os participantes associavam o contexto e afirmavam a dúvida de tê-la ouvido ou não. Analisando as atividades cerebrais durante todo o experimento, esta possível sensação de Dėjà vu recriada em laboratório ativa a área responsável pelas tomadas de decisões no cérebro humano.
O que levou os cientistas a concluírem que, é quase como se a função deste pressentimento de já ter vivido algo, fosse uma checagem da nossa memória para não nos esquecermos ou confundirmos algo no cotidiano. Outros cientistas chegam a afirmar que se trata de uma falha na memória de curto prazo, pois os fatos passariam direto para uma memória de longo prazo sem passar pela memória imediata, nos deixando com a sensação daquilo já ter ocorrido, mais ou menos como se um arquivo fosse salvo hoje no seu HD, mas, por algum erro, a data apareceria como sendo de 10 anos atrás.
Como explicar a certeza íntima de conhecer aquela pessoa ou aquele lugar com tanta profundidade a ponto de sentir uma certa intimidade com algo que aparentemente acabou de lhe acontecer? Como inclusive explicar não só a sensação daquilo já ter acontecido como prever o que virá depois? Podemos até compreender que a estranheza e a sensação de replay se justifique pela falha de memória, mas e o sentimento de intimidade e premonição do que acontecerá em seguida? Como explicar se somente pensarmos nos fatores biológicos?
De certo que a profundidade do assunto fez com que não só a ciência moderna apresentasse teorias sobre isso, mas também nomes como Freud, que explicava o fenômeno como a expressão de desejos inconscientes ou fantasias do passado, Jung e a investigação da sincronicidade dos fatos da vida, o Espiritismo e a relação das experiências do que eles chamam de espírito fora do corpo durante o sono, e tantos outros.
Se voltarmos um pouco no passado, no século XVIII, quando a expressão Déjà Vu foi criada pelo filósofo francês Émile Boirac, percebemos que estas sensações de já ter experimentado uma situação, já havia sido estudada na antiguidade clássica, demonstrando a importância de entender o Déjà Vu não só por um ponto de vista, mas como algo mais profundo ligado aos mistérios da vida e da arte de viver.
Platão já nos ensinava sobre a memória da alma, a reminiscência. Segundo ele, a alma humana é muito velha e encarna no corpo material para adquirir experiências, mas depois da vida, precisa se purificar do mundo material, ou seja, retirar tudo aquilo que ela não é. Em alguns diálogos, Platão conta-nos também que educar, diferente do que achamos hoje em dia, não é encher um copo vazio, mas sim eduzir, ou seja, fazer com que o indivíduo expresse aquilo que já existe em sua alma. Seria como trazer para fora sua própria reminiscência, seu verdadeiro “Ser”, seu “gênio” (A República).
Seguindo as ideias de Platão, e de tantas outras tradições da história da humanidade que nos ensinam sobre os ciclos da vida, de nascimento e morte, das necessidades de experiências da alma, da imortalidade do nosso Ser, percebemos que o Déjà Vu então pode ser uma recordação de algum lugar, de alguém ou de alguma situação que nossa alma já teve contato em outras encarnações e que a marcou profundamente. Isto nos explicaria o estranhamento, e ao mesmo tempo, a sensação de intimidade. Isto nos traduz como Mozart, por exemplo, aos 5 anos de idade já era um gênio da música, e também porque alguns de nós nascem tão sábios e experientes em relação a determinados aspectos da vida.
Ilustração do artists Escher
Mais do que uma máquina biológica, entender o Ser Humano de forma integral, um ser com alma Imortal, com memória, necessidade de experiências, sujeito às leis da vida, com valores, virtudes e sabedoria, nos dá uma chance maior de vermo-nos como parte da vida e não à parte dela. Nos faz enxergar a possibilidade inclusive de atuarmos de maneira a somar com todo o plano da natureza. Então, que possamos refletir sobre essa memória de quem nós realmente somos, não somente como corpos, mas sim como uma essência atemporal que tem uma missão a cumprir, nesse caso, temporariamente em um corpo de carne e osso. Por isso, devemos fazer o exercício de sempre estar em contato com a Bondade, com a Justiça, com a Beleza, com a Generosidade, com o Amor… Porque depois que o tempo deste corpo passar, essas serão as memórias que carregaremos em nossas almas para toda a eternidade.
Ilustração do artista Gonçalves