Parece muito contraditório no mundo atual uma pergunta como esta: “Você tem sido uma boa pessoa para si mesmo?’’. Num mundo onde é crescente e notório o individualismo e o egoísmo, somos carentes de solidariedade, de cuidado com o outro, mas também somos carentes de amor-próprio, de cuidado conosco mesmo. Então, como explicar esta aparente contradição?
Vivemos uma era em que cada um pensa somente em si, vive no seu quadrado, de casa pro trabalho, do trabalho pra casa e, no máximo, pensa no que seria melhor para sua família, parentes e amigos próximos. Estamos insatisfeitos com o rumo da sociedade, mas ao mesmo tempo nos sentimos incapazes de mudar algo, ou mesmo de abandonar nossos planos particulares para priorizar o bem de todos. Neste cenário, o mais óbvio seria dizer que a sociedade anda mal, mas que as pessoas estão bem já que pensam muito nelas mesmas. Mas infelizmente não é assim.
O número de casos de depressão, ansiedade, estresse, só têm crescido, de tal maneira que já se tornou algo comum, já aceitamos como o estado cotidiano das pessoas, e nem sabemos direito que é possível viver de outra maneira. A falta de um sentido de vida gera um grande vazio interior, nos tornando zumbis – parece que não estamos vivendo, somente sobrevivendo.
“Nem teus piores inimigos podem fazer tanto dano como teus próprios pensamentos.”
(Buda)
Será que sabemos mesmo o que é melhor pra nós? Será que estamos sendo boas pessoas para nós mesmos? Será que este pensar somente em si nos ajuda a ter uma vida realizada e plena?
“O que não for bom para a colmeia também não é bom para a abelha.”
(Barão de Montesquieu)
Costumamos nos imaginar como seres independentes e separados uns dos outros, mas todos estamos conectados como partes de um todo. Somos sujeitos às mesmas leis da vida que os animais, plantas e minerais. Sofremos também as consequências da irresponsabilidade com o meio ambiente e com os outros seres vivos. A professora voluntária e filósofa integrante da Organização Internacional Nova Acrópole, Lúcia Helena Galvão, comenta em muitas das suas vídeo-palestras no YouTube, que uma célula que só pensa em si e no que deseja, não contribuindo para o funcionamento de todo o corpo, acaba se tornando cancerígena. O que parecia bom para ela mesma, a princípio, torna-se seu próprio mal a longo prazo, pois o corpo todo sofrerá e, por consequência, a célula individualista também.
Se pensássemos que somos, cada um de nós, uma célula desse imenso corpo que é a humanidade, compreenderíamos que fazer o que é bom pra nós significa dizer que estamos fazendo o que é bom também para todos os seres humanos e para o mundo. O filósofo moderno Kant nos traz reflexões sobre esta ideia:
“Aja como se a máxima de tua ação devesse tornar-se, através da tua
vontade, uma lei universal.”
(Kant)
Ou seja, se isto o que eu penso, sinto e faço, todas as pessoas da humanidade também pensassem, sentissem e fizessem, o mundo seria um lugar melhor ou pior? Kant nos dá um bom parâmetro para escolhermos com sabedoria quem nós queremos ser.
É impossível pensar no que é bom pra mim sem pensar no que é bom para o outro, e para o todo. Cuidar de nós mesmos é cuidar de toda a humanidade. Se o mundo está indo mal e se nós, de algum maneira, não conseguimos contribuir para torná-lo novo e melhor, não nos sentiremos realizados. Definharemos em nossa solidão.
Não percebemos inclusive que todas as dificuldades do mundo atual são resultado da falta de fraternidade, solidariedade, generosidade e de tantos outros valores humanos. Somos atualmente as consequências de todo nosso egoísmo como civilização. O que plantamos nos último séculos, estamos colhendo agora.
“A felicidade é o fim que a natureza humana visa e só resulta do cultivo da virtude.”
(Aristóteles)
Nossa realização como indivíduos, nossa felicidade, nossa plenitude, está relacionada com a capacidade de viver as virtudes humanas, segundo o filósofo Aristóteles. Sermos generosos, bondosos, justos, primarmos pelo que é belo, pelo que nos torna melhores, nos ajuda a espalhar sementes de felicidade pelo solo da vida, para que outras pessoas também possam colhê-las.
“A melhor maneira de ser feliz é contribuir para a felicidade dos outros.”
(Confúcio)
Quando percebemos o real valor de cada um de nós, começamos a nos amar e amar o outro, a nos cuidar e a cuidar do outro. Percebemos que o nosso caminho rumo a realização humana, a felicidade, não é um caminho diferente do de toda a humanidade. Nossos sonhos, são os sonhos que contribuem para um mundo mais justo, bom e belo, e por isso, são necessários e precisam ser realizados. A vida passa a ter um sentido mais profundo e transcendente.
“Amarás ao teu próximo como a ti mesmo.”
(Jesus)
Todos nós somos um grão de areia no deserto, uma célula do corpo do universo, uma gota no oceano da vida, uma centelha de Luz que pode ajudar a iluminar o mundo. Por isso somos todos importantes e necessários.
“Homem, conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo.”
(Oráculo de Delfos)
Nos amar, nos cuidar é cada vez mais adentrar no mistério que é nossa real identidade, aprender a entender e respeitar nosso ritmo, ter força de vontade para realizar nossos sonhos, desenvolver cada vez mais disciplina e coragem para buscar oportunidades e quando elas surgirem, não sabotá-las por medo do crescimento ou do desconhecido. É importante termos afinidade com a nossa Alma, conhecer nossas potencialidades e debilidades, superar nossos limites, saber o que nos motiva e o que nos leva além, para conscientemente construirmos a nós mesmos e, por consequência, construir um mundo novo e melhor.
“A mais importante de todas as obras é o exemplo da própria vida.”
(Helena P. Blavatsky)