Enquanto muitos de nós reclamam das vidas pacatas e dos problemas do cotidiano – o engarrafamento, as contas no fim do mês, o chefe chato, o vizinho fofoqueiro – enquanto mergulhamos sufocados nos nossos problemas particulares, em todo nosso egoísmo, existem pessoas no mundo, poucas, é verdade, que são heróicas, altruístas o suficiente para pensar não somente em si mesmas, mas nos problemas de toda a humanidade. Uma delas chama-se Malala.
Malala Yousafzai é uma jovem paquistanesa, atualmente com 22 anos de idade, conhecida no mundo inteiro como a pessoa mais nova a ser laureada com um prêmio Nobel da Paz, feito ocorrido em 2014. E o motivo que a fez merecedora deste prêmio deve ser, realmente, exaltado, pois serve de inspiração para todos nós.
A jovem paquistanesa dedica sua vida a atuar em defesa da educação para todas as crianças do mundo, usando sua imagem pública para denunciar injustiças, sejam cometidas por governos autoritários, sejam atos de grupos extremistas, e conseguir assim recursos para sua causa.
“O Talibã podia tomar nossas canetas e nossos livros, mas não podia impedir nossas mentes de pensar.”
Por volta dos 12, 13 anos de idade, Malala, ainda residente no Vale Swat, Paquistão, escrevia para um blog da BBC, rede de televisão inglesa, usando-se de um pseudônimo, Gul Makai, que garantia seu anonimato diante dos riscos de se opor ao grupo islâmico extremista que dominava a região através de manipulação, autoritarismo, violência e atentado aos direitos humanos, o Talibã.
“Eles acham que Deus é um pequeno ser conservador que mandaria garotas para o inferno porque elas vão à escola. Os terroristas estão deturpando o nome do Islã e da sociedade paquistanesa para satisfazer seus próprios interesses.”
Pelo próprio relato de Malala, que podemos conferir no documentário “He Named me Malala”, o seu pai, Ziauddin Yousafzai, também conhecido pelos discursos se opondo ao Talibã, não acreditava que realmente haveria uma reação agressiva às denúncias da então criança Malala. Mas depois de tentarem fechar forçadamente algumas Escolas, depois de proibirem que as meninas tivessem acesso a qualquer tipo de educação, em 9 de outubro de 2012, como uma outra tentativa de calar as denúncias contra suas posturas totalitárias, três balas foram disparadas pelos terroristas contra Malala. Uma a atingiu na cabeça, as outras duas feriram duas estudantes que estavam sentadas próximas a ela na van escolar.
‘Queridos irmãos e irmãs, nós percebemos a importância da luz quando vemos a escuridão. Percebemos a importância da nossa voz quando somos silenciados.”
A criança, então com 15 anos de idade, ficou em estado crítico e primeiramente foi levada para um hospital da região e assim que apresentou alguma melhora, foi transferida para a Inglaterra. O ataque ganhou repercussão mundial e vários líderes internacionais demonstraram apoio a sua causa e revolta contra o atentado. Então, após 3 meses de internação, no dia 04 de janeiro de 2013, Malala deixou o hospital, recuperada e ainda com mais certeza sobre que sentido daria a sua vida. Aquilo que parecia ter chegado ao fim anunciava, na verdade, um grande começo.
“Deus me deu uma nova vida, uma segunda vida. E eu vou aproveitá-la. Vou servir aos outros. Quero que todas as meninas, todas as crianças, recebam educação.”
Desde então, em inúmeros discursos ao redor do mundo, nas Nações Unidas, no Parlamento Europeu, em viagens para lugares onde as mulheres a as crianças ainda são exploradas, sofrem injustiças, não tem acesso a educação, ficam às margens da sociedade, tem seus direitos como seres humanos negligenciados, Malala tem agido com muita coragem. Ela utiliza-se de sua imagem pública para chamar atenção da imprensa e dos governantes locais, clamando por soluções através da educação e de oportunidades iguais para todos, ajudando inclusive a levantar fundos para diversas iniciativas.
“Quando o mundo inteiro está em silêncio, até mesmo uma só voz se torna poderosa.”
Em outubro de 2014, “pela sua luta contra a supressão das crianças e jovens e pelo direito de todos à educação”, juntamente com o ativista indiano Kailash Satyarthi, Malala recebeu o Prêmio Nobel da Paz, premiação esta que tradicionalmente é entregue a pessoas que notavelmente contribuíram para a paz mundial.
“Tenho percebido que as pessoas me descrevem de várias maneiras. Algumas se referem a mim como a garota que foi baleada pelo Talibã. Outras, como a menina que lutou pelos seus direitos. Outros, como a ganhadora do Prêmio Nobel, agora. Apesar de meus irmãos mais novos ainda me chamarem de irmã chata e mandona, o que eu penso sobre mim mesma, sou uma pessoa comprometida, e até teimosa, em ver todas as crianças recebendo educação de qualidade, uma pessoa que quer ver as mulheres com direitos iguais e que quer ver paz em todos os cantos do mundo.”
Malala é uma heroína contemporânea, pois mesmo em meio a circunstâncias adversas, onde sua própria sobrevivência era colocada em risco, ela resolveu lutar não só por sua vida, mas pelos direitos de todas as mulheres e crianças à educação. Quantos de nós podem dizer que agem em prol do outro e não somente em benefício próprio?! A pergunta do entrevistador David Letterman, em “O próximo convidado dispensa apresentação” que podemos assistir na Netflix, ressoa na cabeça da maioria de nós: “Por que não fugir daquela situação e pensar em si e nos seus familiares? Por que, ao invés disso, você escolheu discursar, questionar, criticar e denunciar ao mundo as barbáries sofridas pela população, mesmo colocando em risco sua própria vida?”
O que seria de nós, humanidade, se não houvessem de tempos em tempos seres humanos que não pensassem somente em si próprios? Se não houvesse um Gandhi, um Martin Luther King, uma Madre Teresa de Calcutá, tantos outros que nos lembram do que realmente é Ser Humano – ser justo, bondoso, fraterno. Como a própria Malala comenta em um dos seus discursos, somos todos iguais. Devemos agir não só em prol de nós mesmos, mas de toda a humanidade.
‘Pensaram que as balas nos silenciariam, mas falharam. E desse silêncio surgiram milhares de vozes. Os terroristas pensaram que mudariam minhas metas e deteriam minhas ambições. Mas somente isto mudou na minha vida: A fraqueza, o medo, a desesperança morreram. A força, o poder, a coragem nasceram.’
Atualmente, residindo na Inglaterra, pois ainda vem sendo ameaçada de morte, cursando Filosofia, Economia e Política em Oxford, Malala continua atuando em prol de uma educação para todos e indo a lugares que ainda hoje impera a injustiça, o autoritarismo e a negligência com a vida de outros seres humanos. Mas ela faz tudo isso sem esquecer de suas raízes. Quando perguntada sobre quem ela seria se fosse uma garota comum no Vale Swat, no Paquistão, ela respondeu que continua sendo uma garota comum, mas se tivesse tido um pai comum, uma mãe comum, uma família comum, então ela seria só mais uma garota sem educação, casada e com dois filhos.
Vinda de uma família de professores, seu pai, um grande orador e professor local, a nomeou Malala em homenagem a heroína Malalai de Maywand, conhecida como a Joana D’Arc afegã, que na guerra entre o Afeganistão e a Inglaterra, em 1880, incentivou os soldados a serem bravos e lutarem por seu povo, os levando a vitória. Quase uma premonição e um incentivo ao heroísmo que a filha precisaria ter!
“Queridos irmãos e irmãs, não sou contra ninguém e nem estou aqui para falar sobre uma vingança pessoal contra o Talibã ou qualquer outro grupo terrorista. Estou aqui para falar pelo direito de cada criança à educação. Quero educação para os filhos e filhas dos talibãs e para todos os terroristas e extremistas.
Também não odeio o talibã que atirou em mim. Mesmo que eu tivesse uma arma na mão e ele estivesse na minha frente, não atiraria nele. Esta é a compaixão que aprendi com Maomé, profeta da misericórdia, Jesus Cristo e Senhor Buda; esta é a herança de mudança que recebi de Martin Luther King, Nelson Mandela e Mohammed Ali Jinnah. Esta é a filosofia de não violência que eu aprendi com Gandhi, Badshah Khan e Madre Teresa. E este é o perdão que eu aprendi com meu pai e minha mãe. Isto é o que a minha alma está me dizendo: estar em paz e amar a todos.
A história desta paquistanesa inspiradora merece ser conhecida e por isso vamos listar abaixo alguns livros, documentários, entrevistas e discursos onde podemos nos aprofundar mais em sua história e em sua jornada a favor da educação.
LIVROS PUBLICADOS
Eu sou Malala – A história da garota que defendeu o direito à educação e foi baleada pelo Talibã – 2013.
Malala e Seu Lápis Mágico – 2017, livro voltado para o público infantil.
Longe de casa: Minha jornada e histórias de refugiadas pelo mundo – 2019.
DOCUMENTÁRIO
He named me Malala. 2015, Documentário de Davis Guggenheim contando sua história, infância e repercussão atual.
DISCURSOS
2013, ONU – primeira aparição pública depois que se recuperou do atentado que sofreu.
2014, NOBEL DA PAZ – discurso ao ser laureada com o Prêmio Nobel
ENTREVISTAS
O próximo convidado dispensa apresentação, David Letterman – NETFLIX, 2019.
PRÊMIOS RECEBIDOS
- Prémio Nacional da Paz da Juventude (2011)
- Sitara-e-Shujaat, Prêmio coragem civil terceira maior do Paquistão
- Revista Foreign Policy, top 100 pensador global(2012)
- Time, lista de pessoas influentes (2012)
- Madre Teresa Memorial, prêmio para a Justiça Social (2012)
- Prêmio Romano pela Paz e Ação Humanitária (2012)
- Top Name 2012, Pesquisa Anual da Global English (2013)
- Prêmio Simone de Beauvoir (2013)
- Prêmio Fred e Anne Jarvis, da União Nacional de Professores do Reino Unido (2013)
- Prêmio Anual de Desenvolvimento do Fundo de OPEP para o Desenvolvimento Internacional (OFID) (2013)
- Prêmio Internacional Catalunya (2013)
- Prêmio Anna Politkovskaya (2013)
- Prêmio internacional da Criança (2013)
- Prémio Sakharov (2013)
- Prémio Nobel da Paz (2014)