Vamos fazer uma reflexão sobre as provas que a vida nos dá através dessas três histórias a seguir:
O Mestre Sufi
Um mestre sufi viajava pelo deserto em seu camelo e assistiu um acidente: outro viajante caiu de seu camelo, despencou de um alto barranco, mas conseguiu se segurar no galho de um arbusto. Estava pendurado, a ponto de cair de uma enorme altura, correndo risco de perder a vida. Vendo aquilo, o Mestre começou a tentar todos os recursos disponíveis para resgatar o desafortunado homem. Tentou fazer uma corda com toda fibra que encontrou, mas nunca conseguia o tamanho suficiente. Após muita luta, surge o Anjo Gabriel, que comunica ao Mestre que ele pode deixar de lutar pois, por causa de sua vida plena de virtudes, ele já tinha alcançado a graça de entrar no Céu de Allah. As portas do Céu estavam abertas para recebê-lo naquele momento. O Mestre olhou para o anjo e respondeu: ” Não seria possível trocar o Céu de Allah por um bom pedaço de corda?”.
O Céu de Indra
No épico hindu Mahabharata, o personagem Iudistira dedica sua vida a buscar o Céu de Indra. Em sua busca, encontra um cãozinho que passa a acompanhá-lo por todo o percurso. Depois de longos anos, finalmente Iudistira encontra o portal do Céu de Indra. Obtém permissão para entrar, porém o cãozinho é barrado, não podendo entrar no Céu de Indra. Em vista disso, Iudistira abre mão do fruto da luta de toda a sua vida, e desiste de entrar no Céu para não abandonar aquele que tinha sido seu companheiro de jornada. Neste momento, o cãozinho muda de forma e se transforma no próprio deus Indra, que convida Iudistira a entrar no seu Céu.
O Monge e o Macaco
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Com este vídeo, podemos observar vários elementos em comum nas três histórias. Primeiro, para que alcancemos grandes feitos, devemos ter paciência. Seja entrar no céu de Allah, de Indra, ou virar um monge. Não se consegue esse tipo de conquista, interna e espiritual, do dia para a noite, é preciso paciência.
O segundo ponto para refletir é: o que vale mais, a linha de chegada ou o trajeto bem percorrido? Queremos alcançar a linha de chegada, e por conta disso, desconsideramos tudo o que foi útil para que chegássemos lá. Mas será que as vivências ao longo do trajeto não possuem seu próprio valor? Será que elas não atuam como provas para que possamos ver o que realmente queremos, e o que realmente importa? Na caminhada, é onde se encontram as verdadeiras provas da vida, que todos os filósofos de todos os tempos nos orientam a percebê-las. Elas aparecem como dificuldades, mas são nelas onde encontramos o Mistério e a Beleza da nossa existência. Por isso, devemos aprender a gostar dos desafios, pois são através deles que conseguimos nos tornar pessoas melhores, e crescemos em valores e virtudes. Assim, podemos dizer que a chave da Vida está no caminho, e não na chegada.
Tudo o que nos acontece tem uma finalidade, um motivo para o nosso crescimento. Muitas vezes não entendemos, mas depois de uma prova superada, ou de uma maturidade conquistada, conseguimos ver que aquilo foi essencial para nos tornarmos quem somos.
De que adiantaria eu levar a fruta de volta ao Mestre, com o peso na consciência de ter deixado o macaquinho cair no abismo? De que adiantaria entrar no Céu, por todas as minhas boas ações, se na minha última oportunidade eu recusasse fazer a boa ação de salvar uma vida? Ou na “hora H”, abandonar o companheiro que me ajudou a chegar até o final?
E a terceira semelhança das 3 histórias, é que além do personagem principal, existe um outro personagem presente em todo o momento: a figura do Mestre. Um Mestre é uma pessoa que tem mais experiência e visão sobre a vida do que nós, e por estar fora dos nossos próprios problemas, possui as melhores indicações de como nos ajudar a enfrentá-los. Sempre em nossas vidas aparece essa figura, no nosso trabalho, na nossa família, nos esportes que praticamos… Nós mesmos somos mestres em alguns momentos, quando podemos ajudar alguém com a nossa experiência. E também, sempre podemos aprender algo, independente de quem seja a pessoa. Seja um PhD, ou um analfabeto. Não é o nível intelectual que define a capacidade de ensinar de uma pessoa, mas sim o nível de reflexão e vida interior que possui.
Na história árabe, o mestre é representado pela imagem do anjo que acompanhava todas as boas ações do sufi. Na história hindu, o próprio Indra acompanhou Iudistira durante todo o percurso, para poder avaliar sua conduta final. E na história de Raggu, o macaco estava o tempo trabalhando pelo mestre. Quando buscamos nos aperfeiçoar como seres humanos, desenvolver virtudes e fazer ações corretas, a Vida, como uma grande mestra, nos coloca à prova para ver se realmente estamos dispostos a abrir mão de nossos desejos e confortos pelo que realmente importa. Essas provas servem de confirmação do nosso propósito, nos testando se agiríamos de forma nobre e correta, como fizeram nossos inspiradores personagens das três histórias.
Após essa leitura, que possamos ser inspirados por essas tradições, para nos tornarmos mestres de outros e aprendermos a ver “o mestre” em todas as pessoas.